As seis capitais brasileiras que concentram 45% das mais de 34 mil mortes causadas pelo novo coronavírus iniciaram planos de flexibilização da quarentena nesta semana. Especialistas, no entanto, apontam negligência nessa iniciativa. Observam que, embora prefeituras e governos estaduais usem como argumento a queda das taxas de ocupação em UTIs, as curvas de casos e de óbitos estão ascendentes.
Na última quinta-feira (4), o Brasil bateu novo recorde com a confirmação de 1.471 mortes em 24 horas, segundo dados levantados pelo portal G1 com as secretarias de saúde dos Estados.
A última capital a iniciar a flexibilização foi São Paulo, onde concessionárias e escritórios reabriram com atendimento limitado a 4 horas por dia na sexta-feira (5).
Na última segunda-feira (1°), Belém, Fortaleza, Manaus e Recife começaram a aplicar seus planos de abertura gradual.
E, na terça-feira (2), o Rio tomou as primeiras medidas para sair da quarentena. Entre as medidas de afrouxamento do isolamento social na cidade estão atividades esportivos nos calçadões e no mar, além do funcionamento de lojas de móveis e decoração e de concessionárias de automóveis.
Nessas seis cidades já foram confirmadas mais de mil mortes pela Covid-19, e todas elas ainda apresentam curvas ascendentes de casos e mortes, mas as prefeituras argumentam que o número de mortes diárias está desacelerando e que a lotação dos leitos de UTI está estável ou baixando. Tais fatores justificariam o início de uma “abertura gradual”.
Há ainda outro agravante: Rio, Fortaleza e Recife estão na época de maior incidência de casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG), segundo séries históricas do InfoGripe, sistema de monitoramento da Fiocruz.
A síndrome está associada à circulação dos vírus respiratórios, que costuma ser maior exatamente nesta época na maior parte do País.
Pesquisadores, infectologistas e outros profissionais de saúde que acompanham a pandemia do coronavírus desde o início defendem manter as regras de isolamento social por mais tempo para tentar segurar a curva de crescimento dos casos e mortes.
São Paulo
“Apesar de estar ainda subindo, a evolução do vírus está ocorrendo muito lentamente. Os novos casos e mortes estão respeitando essa teoria de não ser um pico e, sim, um platô. Sobre a questão de liberar a reabertura, precisaria de pelo menos mais uma semana de estabilidade para analisar”, avalia o professor de física da USP, José Fernando Diniz Chubaci, acompanha os dados do Estado de São Paulo desde o início da pandemia.
Rio de Janeiro
“Tinha que ter três condições para flexibilizar: diminuir a mortalidade – e eu não vi isso. (…) O número de leitos de CTI (…) Mas não é só zerar a fila, também tem que ter vaga nos CTIs. É preciso ter no mínimo 10% ou 15% de leitos de CTI vagos. E a estabilização da curva. Ela tava tendo uma tendência a parar de subir, mas eu não vi essa estabilização”, afirmou a infectologista Tânia Vergara, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia no Rio de Janeiro.
Fortaleza
“É preciso avaliar a adesão da população ao distanciamento e a outras medidas de segurança durante a liberação dos serviços, diz infectologista do Hospital São José (HSJ), Keny Colares. Caso contrário, pode haver uma “segunda onda” ainda mais agressiva.
Manaus
“No cenário mais brando, sendo mais conservador e menos pessimista possível, nós teremos, sem dúvida, duas vezes mais mortes do que tivemos no primeiro colapso de saúde. Teremos um novo colapso, isso é muito certo”, alertou o pesquisador Lucas Ferrante, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Para ele, o governo foi negligente em relaxar as medidas de isolamento.
Recife
“Estamos, sim, numa estabilização, mas não estamos em uma situação de conforto. Poderíamos esperar mais uma semana para flexibilizar as atividades, porque pode haver um ruído de baixa”, explicou o cientista Jones Albuquerque, do Instituto para Redução de Riscos e Desastres da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).