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Sem as reformas, a dívida pública do Brasil ultrapassará 130% do Produto Interno Bruto

Cortes e ajustes são fundamentais para a recuperação. (Foto: Marcos Santos/USP Imagens)

As projeções do Banco mundial indicam que, se nenhuma reforma for feita, a dívida pública ultrapassará 130% do PIB (Produto Interno Bruto) na próxima década. As famílias brasileiras têm administrado com prudência suas finanças, feito escolhas difíceis e sacrifícios. O governo federal, ao contrário, continua a tomar empréstimos crescentes, dívida que acaba tendo de ser paga pelos brasileiros. A reflexão é de Antonio Nucifora, economista-chefe do Banco Mundial para o Brasil, para o jornal Folha de S. Paulo.

Há anos que o governo federal gasta bem mais do que arrecada e toma empréstimos vultosos para financiar esta diferença. Como resultado, entre 2013 e 2017 a dívida pública subiu de 51,5% para 74% do PIB. Essa elevação corresponde a um aumento da dívida de R$ 10 mil por cada brasileiro em 2013 para R$ 23 mil em 2017. Em outras palavras, para pagar a dívida do Estado, cada brasileiro teria que trabalhar 280 dias sem remuneração.

Com uma elevação tão rápida, é alto o risco de que os credores deixem de acreditar que o governo brasileiro poderá pagar a sua dívida e, portanto, parem de emprestar dinheiro novo ao Brasil. Caso isso aconteça, o Brasil enfrentará taxas de juros mais altas e o Real se depreciará. Como consequência, a inflação irá subir e o poder aquisitivo dos brasileiros será reduzido, especialmente para os pobres, forçando o ajuste que os políticos não terão tido a coragem de fazer. Foi isso o que aconteceu durante as crises financeiras da década de 1980 e início da de 1990.

Alguns podem argumentar que, se o crescimento acelerar significativamente, o tamanho do ajuste necessário será menor. Embora isso esteja correto, na realidade crescimento mais rápido não ajudaria muito, porque no Brasil uma grande parcela dos gastos públicos é automaticamente indexada ao nível de crescimento econômico. Isso acontece tanto de forma direta, com muitas receitas vinculadas a gastos, quanto indiretamente, uma vez que grande parte dos gastos sociais é indexada ao salário mínimo, que aumenta com o crescimento do PIB. Dessa forma, é possível calcular que o crescimento do PIB teria que permanecer acima de 5% por uma década para estabilizar o nível da dívida pública.

Além disso, esperar que o crescimento econômico aumente muito sem primeiro resolver o desequilíbrio fiscal equivale um pouco a esperar que dinheiro dê em árvores

A única maneira de evitar uma crise é deter o aumento constante da dívida pública, seja reduzindo o gasto, seja aumentando a receita, ou ambos. Diminuir o gasto significa que o montante destinado ao pagamento de servidores públicos, serviços públicos, benefícios sociais e aposentadorias, e subsídios ao setor privado terá de ser reduzido.

O Banco Mundial calculou que o tamanho da correção necessária para tapar o buraco fiscal e estabilizar o nível da dívida pública é de aproximadamente 5,5% do PIB, ou seja, cerca de R$ 350 bilhões.

O desafio é grande, mas não é impossível. Na verdade, grandes ajustes fiscais são relativamente comuns. O trabalho publicado pelo FMI em 2006 documenta mais de 300 desses ajustes realizados nas três décadas anteriores.

A União Europeia também já passou por diversos grandes ajustes, doze dos quais nos anos 1980-2000, como documentado em 2010 num estudo de Daniel Gros e Cinzia Alcidi. Vários deles foram muito maiores do que o necessário no Brasil e efetuaram ajustes de cerca de 10% do PIB relativos ao saldo primário (por meio de um mix de cortes nos gastos e obtenção de receitas adicionais).

No entanto, o tamanho do ajuste necessário às finanças públicas para evitar uma crise exige decisões muito impopulares. Os salários dos servidores públicos deveriam ser diminuídos? O montante gasto em educação, saúde ou segurança deveria ser reduzido? Ou o BPC (Benefício de Prestação Continuada) ou outros programas de assistência social deveriam ser reduzidos? O Abono Salarial deveria ser suspenso? Ou os subsídios ao crédito para firmas e outros programas de apoio a empresas deveriam ser eliminados? Isenções fiscais, tais como o Simples ou a Zona Franca de Manaus, ou a “desoneração da folha”, deveriam ser abolidas? Essas são algumas das escolhas que precisarão ser estudadas.

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