O perito criminal Eduardo Tagliaferro, que foi chefe da assessoria de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), acusou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de adulterar relatório técnico para justificar uma operação da Polícia Federal. Em depoimento por videoconferência na Comissão de Segurança do Senado, presidida pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Tagliaferro disse ainda que o ministro do STF montou uma força-tarefa informal no TSE e no Supremo para monitorar pessoas e emitir certidões sem provas materiais.
Segundo Tagliaferro, houve uma “maracutaia judicial” de Moraes com direcionamento de “cunho político” para atentar com as eleições presidenciais de 2022. O ministro Moraes diz que todos os procedimentos foram regulares. Moraes é o relator do processo contra os acusados de participação no golpe de 8 de Janeiro.
“Foi pedido para que se confeccionasse um parecer, relatório, com data retroativa, e eu assinando pelo Supremo Tribunal Federal, ao qual eu não era nomeado”, disse Tagliaferro.
O relatório em questão foi elaborado em agosto de 2022 e se refere a uma matéria publicada pela coluna de Guilherme Amado, no Metrópoles, em que empresários pediram golpe de Estado em mensagens do WhatsApp. Uma operação da PF foi feita naquele mesmo mês contra os empresários.
“Trata-se de manipulação e criação de uma investigação que nunca existiu e colocada a data da busca e apreensão justamente para justificar que essa busca e apreensão não se deu somente com base numa matéria jornalística e sim, fraudulentamente, com base numa investigação que nunca existiu”, disse Tagliaferro. E acrescentou: “Ele (Moraes) manipula. Ele faz daquele gabinete um grande jogo de xadrez, jogando com as pessoas dando xeque mate nas pessoas como uma pecinha de xadrez”.
Segundo ele, o relatório sobre as conversas de empresários foi feito após a publicação da reportagem e após a realização de busca e apreensão, mas teve sua data adulterada para sustentar que a apuração técnica fora feita antes de o ministro determinar a ação da PF.
O perito criminal também fala de um “direcionamento político” por Moraes durante o trabalho no TSE.
“Havia, sim, de fato, um direcionamento de cunho político feito por ele e por sua equipe, por seus colaboradores mais próximos, com o objetivo de, naquele momento, denegrir a imagem de um polo político e exaltar a imagem de outro polo político. Isso é gravíssimo e atentou contra as eleições”, disse Tagliaferro.
Em resposta, os parlamentares da comissão decidiram encaminhar documentos fornecidos por Tagliaferro, entre outros, ao STF e ao governo americano para denunciar, segundo eles, “fraude processual” cometida pelo ministro Alexandre de Moraes e atuação fora do processo do procurador-geral da República, Paulo Gonet.
A comissão também encaminhou ao governo italiano um pedido de proteção a Tagliaferro e ao ministério da Justiça para proteger os familiares do perito. Esses requerimentos foram pautados pelo presidente do colegiado, senador Flávio Bolsonaro, filho do ex-presidente.
Na audiência, Tagliaferro disse que os trabalhos da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do TSE foram lastreados com uma decisão proferida pelo STF no dia 9 de janeiro de 2023, um dia depois dos ataques golpistas na Praça dos Três Poderes.
Tagliaferro também disse que recebeu ordens de juízes auxiliares de Moraes para “construir uma história” para compor material comprobatório contra Bolsonaro.
A sessão de terça foi comandada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e foi realizada ao mesmo tempo do primeiro dia do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da trama golpista durante o governo Bolsonaro. Flávio afirmou que vai enviar toda a documentação ao presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, e que vai pedir que ele suspenda o julgamento.
Senadores pediram a prisão de Moraes durante a sessão. “O que estamos presenciando aqui é uma grande violação de direitos humanos. Pessoas foram acusadas, buscas e apreensões foram feitas e pessoas foram presas com provas falsas, provas forjadas por um magistrado. Esse magistrado tem que ser preso hoje”, disse a senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
Como mostrou o Estadão, Tagliaferro tem se manifestado nas redes sociais, com o apoio de bolsonaristas, e ameaça expor bastidores do funcionamento do gabinete de Moraes.
Em nota divulgada por sua assessoria, o ministro Alexandre de Moraes disse que todos os procedimentos de investigação foram realizados de forma regular. Sustenta ainda que a assessoria do TSE foi acionada para recolher dados e que estes foram repassados as autoridades competentes.
Veja a íntegra da resposta do ministro: “O gabinete do Ministro Alexandre de Moraes esclarece que, no curso das investigações dos Inq 4781 (Fake News) e Inq 4878 (milícias digitais), nos termos regimentais, diversas determinações, requisições e solicitações foram feitas a inúmeros órgãos, inclusive ao Tribunal Superior Eleitoral, que, no exercício do poder de polícia, tem competência para a realização de relatórios sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e atentado à Democracia e às Instituições. Os relatórios simplesmente descreviam as postagens ilícitas realizadas nas redes sociais, de maneira objetiva, em virtude de estarem diretamente ligadas as investigações de milícias digitais. Vários desses relatórios foram juntados nessas investigações e em outras conexas e enviadas à Polícia Federal para a continuidade das diligências necessárias, sempre com ciência à Procuradoria-Geral da República. Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República. Na PET 10.543, o procedimento foi absolutamente idêntico. Após a decisão do Ministro relator, em 19 de agosto, foi solicitado relatório para o TSE, que foi juntado aos autos no dia 29 de agosto, tendo sido dada vista imediata às partes. O recurso da PGR não foi conhecido pelo STF, em 9 de setembro. Tudo regular e oficialmente nos autos.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.