No auge da Lava Jato eram como Batman e Robin. Sergio Moro, o juiz, e Deltan Dallagnol, o procurador, davam as cartas na operação que chacoalhou a política e o negócio das grandes empreiteiras. Conquistada a glória, trocaram as barras dos tribunais pelas urnas e, agora, experimentam, por dentro, como o jogo de fato é jogado. Deltan já foi defenestrado, enquanto Moro tenta evitar ser o próximo alvo.
Deltan Dallagnol, que passou a Era Lava Jato cultivando o dom da pregação pelo combate à corrupção, achou que estava pronto para a nova empreitada. Acabou cassado. Uma olhada na sua prestação de contas à Câmara antes de entregar as chaves do gabinete parlamentar mostra que o ex-procurador correu para cuidar da imagem na reta final. Em maio, gastou R$ 5.500 da sua conta como deputado para contratação de empresa especializada na produção de banners, cards e vídeos. Outros R$ 8 mil tiveram o mesmo destino, mas a nota emitida no mesmo maio diz que a despesa se referia a fevereiro.
Redes sociais
Mirou nas redes sociais de onde acreditou que viria uma onda de proteção suficiente para impedir a cassação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ou ainda forçar a Câmara a não aceitar cumprir a decisão. Planejou até a criação de um site batizado de movimento345.com.br. Registrou a marca em seu nome por R$ 40 e pediu reembolso da despesa à Câmara.
O que acabou acontecendo é história que todos conhecem. O apoio se limitou ao núcleo bolsonarista que esperneou no vazio. Hoje, Deltan Dallagnol está de volta a seu reduto paranaense. E as redes sociais viraram sua trincheira. Dali atira para todos os lados. Principalmente para onde acredita ver seus algozes. Tem fixação por criticar e compartilhar textos que expõem o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que não quis aliviar sua condição de cassado.
O ex-deputado também aponta para jornalistas, para o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, e não poupa nem os tuítes que a Corte eleitoral produz. Esta semana gastou seu tempo para falar de um vídeo em que uma mulher interpreta o papel de Barbie e é avisada de que se não tiver título de eleitor não pode tirar outros documentos.
Deltan Dallagnol também anda se consumindo para defender o legado da Lava Jato. Ele aproveitou para reclamar que os petistas sempre condenaram as delações lavajatistas e agora o instrumento serviu para contribuir na investigação da morte de Marielle Franco.
Autopreservação
Moro segue com a mesma missão, mas sua prioridade tem sido outra: salvar o próprio mandato. Como juiz que mandou para prisão integrantes de várias siglas partidárias e até mesmo o atual presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva – mais tarde o petista teve os processos anulados pelo Supremo Tribunal Federal – Moro tenta não virar um párea no Senado. Está difícil.
Ao se aproximar do ex-presidente Jair Bolsonaro, a quem acusou de interferir na Polícia Federal, o ex-juiz moveu-se para ganhar aliados, mas pode ter perdidos alguns fãs que o tinham como um super-herói de toga. Nas redes sociais, o senador pelo Paraná apresenta-se como o homem da oposição ao governo Lula. Critica os decretos e discursos presidenciais.
Mas ele mesmo vê-se em mar turbulento. Numa inusitada aliança, o processo que pede a cassação de seu mandato de senador é assinado pelo PL de Bolsonaro. O PT também apoia a punição.
Esta semana, para jurar que segue firme no Parlamento escreveu um artigo em que, citando Mark Twain, zomba de quem o vê como senador de mandato morto. “Não acredito honestamente que meu mandato já tenha sido cassado, mas prometo fazer uma investigação rigorosa e comunicar de imediato ao público se me descobrir morto”, escreveu.
Com Deltan cassado ainda a vociferar pelas redes e Moro tentando se livrar da degola, a figura de ambos parece não aceitar ouvir um réquiem para a Lava Jato, a operação que minguou por conta de seus próprios méritos e também deméritos.