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Uma editora desistiu de publicar a biografia do cineasta Woody Allen após protestos da equipe

"Imagine que fosse com sua irmã", diz Ronan Farrow (E), que acusa o cineasta (D) de abuso contra filha adotiva. (Foto: Reprodução)

A editora Hachette Book Group, uma das maiores dos Estados Unidos, anunciou na sexta-feira (6) em um comunicado à imprensa americana que não publicará o livro de memórias de Woody Allen, “Apropos of Nothing” (a propósito de nada).

“Nos últimos dias, a chefia da HBG teve extensas conversas com nossa equipe e outras pessoas. Depois de ouvi-las, chegamos à conclusão de que avançar com a publicação não seria viável para a HBG”, afirma o comunicado.

Com isso, os direitos do livro retornarão ao cineasta, que é acusado de molestar a filha Dylan Farrow, quase três décadas atrás — acusações que ele nega, mas que gerou uma série de protestos e a pressão para que a editora e outras casas editoriais desistissem de lançar a obra de memórias.

A HBG havia revelado que publicaria o livro. Na quinta (5), porém, dezenas de funcionários do conglomerado editorial deixaram a sede da empresa em Nova York, em protesto contra a publicação do título.

O jornalista Ronan Farrow, autor do best-seller “Operação Abafa” e filho de Allen, disse na terça (3) que romperia sua relação com a editora caso a autobiografia de Woody Allen chegasse às livrarias.

Farrow, sua mãe (a atriz Mia Farrow) e a irmã adotiva, Dylan Farrow encampam a acusação de assédio contra Allen.
Em uma troca de emails a que o jornal The New York Times teve acesso, Ronan Farrow, que é jornalista e cujas reportagens sobre as acusações de assédio contra Harvey Weinstein ajudaram a impulsionar o movimento #MeToo, criticava a editora Hachette severamente, classificando a decisão de publicar o livro de memórias como uma traição.

“Sua política de independência editorial entre as diferentes unidades do grupo não o isenta de suas obrigações morais e profissionais como editor de ‘Operação Abafa’ [livro de Farrow sobre Weinstein, lançado recentemente no Brasil e que saiu nos EUA pela HBG], e como líder de uma companhia que está sendo solicitada a auxiliar nos esforços de homens abusivos para legitimar seus crimes”, escreveu em um email a Michael Pietsch, presidente-executivo da Hachette.

“Enquanto você e eu trabalhávamos em ‘Operação Abafa’, que em parte trata dos danos causados por Woody Allen à minha família, você estava secretamente planejando publicar um livro da pessoa que cometeu aqueles atos de abuso sexual”, acrescentou.

“Minha consciência não permite que eu continue a trabalhar com vocês”, arrematou. “Imagine que isso tivesse acontecido com a sua irmã.”

A Grand Central, selo editorial da Hachette, publicaria o livro de memórias de Allen, “Apropos of Nothing”, no dia 7 de abril nos Estados Unidos.

Um comunicado à imprensa definia o livro como “um relato abrangente de sua vida, tanto pessoal quanto profissional”, que cobriria “seu relacionamento com familiares, amigos e os amores de sua vida”.

Em entrevista por telefone ao New York Times, Pietsch se recusou a oferecer detalhes adicionais sobre o livro, como a tiragem inicial ou o adiantamento pago pela Grand Central ao cineasta. Ele também se recusou a dizer qualquer outra coisa sobre o conteúdo da obra, limitando-se a afirmar que se tratava da “história completa de sua vida, do começo ao presente”.

Pietsch disse que ligou para Farrow depois de ser informado pelo agente do escritor de que ele estava insatisfeito.
“Cada livro tem sua missão”, disse. “Nosso trabalho como editores é ajudar o autor a realizar aquilo que se dispôs a fazer ao criar seu livro”, completou. Questionado pelo jornal americano sobre os objetivos do livro de Allen, ele afirmou que a editora credita fortemente que existe um grande público que deseja ouvir a história de Woody Allen contada por ele próprio.

Farrow se recusou a comentar com a imprensa sobre a conversa com Pietsch ou sobre a publicação do livro.

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