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Vivendo bem mais que os homens, mulheres aposentadas desafiam as contas do INSS

O número de mulheres na folha do Regime Geral de Previdência Social cresce mais rápido que o de homens. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

O número de mulheres na folha do Regime Geral de Previdência Social – incluindo idosas de baixa renda que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC), de um salário mínimo – cresce mais rápido que o de homens. Desde 2018, elas são mais da metade dos beneficiários, refletindo a maior inserção feminina no mercado de trabalho formal e o fato de se aposentarem mais cedo.

Como as mulheres vivem mais, a tendência é que fiquem com fatia cada vez maior da Previdência, ampliando o desafio de reequilibrar financeiramente o sistema. É o que mostra um estudo do especialista Rogério Nagamine, baseado no Anuário Estatístico da Previdência.

Em 2001, elas eram 4,5 milhões de aposentadas e titulares de BPC, 44% do total de beneficiários. Como a taxa de formalização sempre foi maior entre os homens, a Previdência também era predominantemente masculina. Isso mudou a partir de 2018.

Em 2023, último ano com dados consolidados disponíveis, o número de mulheres quase triplicou, chegou a 11,8 milhões, 51,2% do total. A parcela masculina cresceu em ritmo menor: de 5,7 milhões para 11,2 milhões.

Segundo Nagamine, além da aposentadoria, benefícios como pensão por morte e salário maternidade consolidam a maioria feminina no sistema previdenciário. De um gasto de R$ 64,1 bilhões do regime geral em dezembro de 2023, R$ 34 bilhões (53%) foram para mulheres. Eles ficaram com R$ 30,1 bilhões (47%).

Na previdência dos servidores da União, a diferença é ainda maior em favor das mulheres, exceto no Legislativo. Nos estados e municípios, a maioria feminina é mais antiga por causa do grande número de professoras, que param de trabalhar ainda mais cedo que mulheres de outras profissões.

A Reforma de Previdência de 2019, que introduziu a idade mínima com regras de transição até 2031, estabeleceu 62 anos para mulheres e 65 para homens, com 30 anos de contribuição mínima para elas e 35 para eles, mantendo a distinção da regra anterior, por tempo de serviço. Para professoras, a idade mínima é 57 anos e o tempo de contribuição, 25. Para homens docentes, são 60 e 30 anos.

Diante do agravamento do quadro deficitário da Previdência no país, o estudo de Nagamine sugere um debate sobre o fim dessas diferenças.

“Diante das tendências demográficas e do mercado de trabalho, a predominância de mulheres entre os aposentados deve continuar e não pode deixar de ser levada em consideração na formulação de políticas públicas previdenciárias de médio e longo prazos”, defende o pesquisador.

No debate da reforma, foi cogitado igualar as regras para homens e mulheres, mas houve resistências no Congresso por tocar em conquistas das mulheres diante de desvantagens estruturais que permanecem. A regra distinta serve para compensar a dupla jornada da mulher, sobre quem culturalmente ainda recai a maior parte do trabalho doméstico e de cuidados com filhos e idosos.

Uma pesquisa do IBGE em 2022 estimou que, em média, uma brasileira gasta 21 dias a mais que um homem com afazeres domésticos no ano. Esse desequilíbrio é familiar para a ex-professora Joscilene Souza, de 57 anos, que se aposentou aos 51.

Moradora de Volta Redonda (RJ), ela e as duas irmãs formam a primeira geração de mulheres da família a trabalhar fora de casa e a alcançar a aposentadoria. Quando se casou e teve duas filhas, contou com o apoio da mãe, dona de casa, e de uma empregada, mas ainda assim sentiu o peso das tarefas domésticas.

“Meu marido na época trabalhava em São Paulo, só vinha para casa nas folgas, então ficava tudo sob a minha responsabilidade”, diz Joscilene, que vê na aposentadoria especial para docentes uma forma de compensar o trabalho em vários turnos e fora de sala, na preparação de aulas e correção de avaliações.

Mesmo tendo se aposentado cedo, ela não estimula o interesse de uma das filhas pelo magistério. “Quando um filho quer seguir a profissão da mãe, geralmente é motivo de orgulho. No meu caso, é diferente: não desejo isso porque sei bem como é. O ambiente de trabalho do professor é muito desgastante, precisa ter algum benefício.” As informações são do jornal O Globo.

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