Mundo Repórter reclama por ter sido beijada pelo presidente eleito do México
Por Redação O Sul | 27 de setembro de 2018
Um beijo dado pelo presidente eleito do México, Andrés Manuel López Obrador, em uma repórter, abriu um debate no país sobre o como o político de esquerda trata as mulheres e os jornalistas. López Obrador visitava o Estado da Baixa Califórnia quando Lorena García, do jornal “Mexicano”, de Tijuana, se aproximou e perguntou se era do seu interesse que seu partido, o Movimento de Regeneração Nacional (Morena), vencesse a eleição para o governo do Estado no próximo ano. O presidente eleito parou, sorriu e beijou a bochecha da repórter. Em seguida, seguiu para o seu carro, sem responder à pergunta. Para Lorena, o beijo foi uma falta de respeito. Ela esperava respostas e não um beijo, ao contrário de algumas eleitoras que o cercam em suas visitas.
“Sou uma profissional com 19 anos de carreira e jamais havia passado por isso. Se as (outras) mulheres queriam um beijo, é problema delas”, disse a jornalista à Rádio Fórmula.
Esse é o segundo incidente do presidente eleito com jornalistas mulheres. Dias atrás, ele chamou várias repórteres de “coraçãozinho”, causando mal-estar. A jornalista mexicana Verónica Calderón escreveu no Twitter: “O mais grave é que não responde às perguntas, desqualifica a imprensa”.
“São atitudes que demonstram, por um lado, que ele não trata com seriedade os jornalistas e, por outro, um comportamento típico de ‘vou calar as mulheres com elogios e beijos’. São gestos que não têm com jornalistas homens. Obrador atua com os modos típicos do macho”, diz Tegina Tamés, diretora do Grupo de Informação em Escolha Reprodutiva (Gire, na sigla original).
No início do mês, o presidente eleito, que toma posse em 1º de dezembro, foi perguntado por outras repórteres sobre uma de suas medidas mais polêmicas, o apoio do Morena no Estado de Chiapas ao Partido Verde, aliado tradicional do PRI (Partido Revolucionário Institucional, que governou o México por grande parte do século passado). “Não vou falar disso, coraçãozinho”, respondeu Obrador na ocasião, evitando a pergunta.
Para Marta Lamas, acadêmica e uma das figuras mais destacadas do feminismo mexicano, estes comportamentos devem ser interpretados dentro de um contexto. “López Obrador é um homem mexicano de mais de 60 anos que vem de toda uma tradição que internalizou costumes galanteadores que hoje estão sendo questionados. Considero que é um descuido da sua parte não ser consciente disso. Agora ele é o presidente e já não pode se comportar como um candidato indisciplinado”, disse Lamas.
Durante a campanha eleitoral para as eleições de 1º de julho último, o comportamento de Obrador surpreendeu os analistas, já que ele abandonou a agressividade retórica de suas duas campanhas presidenciais anteriores. Sua equipe se esforçou para suavizar o candidato, criando o slogan AMLOve. O próprio presidente eleito diz que pratica o princípio do “amor ao próximo”, e que deve tratar os opositores “com carinho”.
A pouco mais de dois meses para sua posse, a chegada de López Obrador à Presidência tem sido recebida com um moderado otimismo por parte das militantes feministas. Sua promessa de promover a legalização de aborto em todo o país — hoje o aborto é legal apenas na Cidade do México, o Distrito Federal —, a formação de um gabinete igualitário e a designação de figuras como Olga Sánchez Cordero para o Gabinete são pontos a favor. Contra ele pesa sua polêmica aliança eleitoral com o partido ultraconservador Encontro Social, que preside a Comissão de Saúde do Congresso.
A diretora do Gire considera em todo caso que Obrador deve se portar melhor: “Em uma figura pública são importantes os gestos, os detalhes. Não são banais nem superficiais, porque estão mostrando uma posição sobre temas importantes. Obrador está dando um péssimo exemplo, no momento em que tem a grande oportunidade de mostrar uma relação diferente com as mulheres”.
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