Segunda-feira, 22 de dezembro de 2025
Por Redação O Sul | 19 de novembro de 2022
O continente europeu pode viver uma epidemia de câncer na próxima década, alerta uma nova publicação da Comissão de Oncologia da revista científica The Lancet. Publicado na última semana, o relatório foi elaborado por cientistas de toda a Europa, que analisaram dados da doença e das pesquisas sobre o tema, identificando lacunas que podem permitir o avanço dos diagnósticos nos próximos 10 anos.
Para reverter esse cenário, e atingir a meta de 70% de sobrevivência para todos os pacientes com câncer até 2035, eles recomendam medidas como aumentar o orçamento de estudos e focar no impacto da pandemia na epidemiologia da doença.
Inicialmente, os pesquisadores destacam que a pandemia da covid teve – e ainda tem – um papel central em expor deficiências em pesquisas sobre o câncer e nos sistemas de saúde europeus. Eles alertam que a emergência sanitária também atrasou diagnósticos de pessoas com a doença, o que leva ao início tardio do tratamento, comprometendo o potencial das terapias disponíveis.
“Estimamos que aproximadamente um milhão de diagnósticos de câncer foram perdidos em toda a Europa durante a pandemia. Estamos em uma corrida contra o tempo para encontrar esses cânceres ausentes. Além disso, vimos um efeito assustador na pesquisa do câncer com laboratórios fechados e ensaios clínicos adiados ou cancelados na primeira onda da pandemia”, alerta o professor Mark Lawler, da Queen’s University, em Belfast, Reino Unido, presidente e principal autor da comissão da Lancet, em comunicado.
“Estamos preocupados com o fato de a Europa estar caminhando para uma epidemia de câncer na próxima década se os sistemas de saúde e a pesquisa sobre o câncer não forem priorizados com urgência”, complementa o especialista.
Mais precisamente, o relatório afirma que os médicos relataram 1,5 milhão a menos de pacientes com câncer no primeiro ano da pandemia, com uma a cada duas pessoas não recebendo a cirurgia ou a quimioterapia no momento oportuno. Também chama a atenção que 100 milhões de testes de rastreamento da doença foram perdidos, o que corrobora a estimativa de até 1 milhão de pessoas sem o diagnóstico.
Por isso, uma das principais recomendações dos cientistas é a aceleração de pesquisas sobre o impacto da covid na epidemiologia do câncer na Europa, tornando a doença um tema central nos esforços científicos daqui para frente.
Guerra e Brexit
Embora os cientistas demandem maior foco na pesquisa clínica, eles temem que a Guerra na Ucrânia seja um grande empecilho para esse avanço. No documento, eles ressaltam que Rússia e Ucrânia são dois países que investem de forma significativa nos estudos sobre o câncer, financiamento que pode ser afetado pela crise na região.
Além disso, avaliam que ensaios em andamento podem ser interrompidos devido à instabilidade tanto nas duas nações, como nas que fazem fronteira com elas.
“Esperamos que nosso relatório ajude a direcionar a atenção necessária para a preocupação e o impacto significativo que o conflito terá na pesquisa sobre o câncer, incluindo, entre outros, ensaios clínicos na Europa. Já existe uma crescente divisão leste-oeste na pesquisa europeia sobre o câncer e é crucial que a guerra Rússia-Ucrânia não aumente essa lacuna” afirma Andreas Charalambous, Presidente da Organização Europeia do Câncer, em comunicado.
Além disso, a comissão acredita que a saída do Reino Unido da União Europeia, movimento chamado de Brexit, já afeta o andamento de estudos sobre o câncer no continente, impacto que deve continuar.
Eles compararam dados de pesquisa de antes e depois do Reino Unido deixar o bloco, e identificaram uma lacuna nos esforços científicos direcionados à doença com a saída das nações britânicas. Por isso, os pesquisadores pedem que a comunidade europeia busque mitigar esse impacto.
“A pesquisa do câncer no Reino Unido no mundo pós-Brexit está em uma encruzilhada, onde as decisões estratégicas determinarão se continuaremos a prosperar e fazer parcerias internacionais ou se o isolacionismo reduzirá nossa posição mundial”, afirma o professor Richard Sullivan, co-líder da comissão e professor de Câncer e Saúde Global no Instituto de Políticas do Câncer, da King’s College de Londres, no Reino Unido.
“Se o Reino Unido não estiver envolvido na pesquisa colaborativa sobre o câncer na UE e não fizer parte da comunidade de pesquisa, isso terá um efeito extremamente prejudicial na atividade europeia de pesquisa sobre o câncer”, acrescenta.