Domingo, 18 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 22 de março de 2023
O presidente da França, Emmanuel Macron, rompeu o silêncio sobre a manobra constitucional da qual lançou mão para aprovar sua controversa reforma da Previdência, afirmando que “não há outra solução” e que espera implementá-la “até o fim do ano”. O pronunciamento foi amplamente criticado por manifestantes, após o chefe do Eliseu comparar os enormes protestos dos quais é alvo há meses aos ataques extremistas em Brasília, em 8 de janeiro, e no Capitólio americano, em 2021.
Macron estava há dias sob pressão para se pronunciar após adotar, na quinta passada, a prerrogativa constitucional que lhe permite aprovar leis sem o aval dos parlamentares, e seu governo sobreviver a duas moções de desconfiança na segunda-feira. Afirmando “não ter arrependimentos”, optou por fazê-lo durante uma entrevista de mais de meia hora aos jornalistas Marie-Sophie Lacarrau, do canal TF1, e Julian Bugier, da rede France 2, as duas maiores emissoras do país.
“Não estou feliz de fazer esta reforma, preferia não ter de fazê-la. Poderia ter feito como muitos outros antes de mim e não me importar. Lamento que não soubemos explicar a necessidade desta reforma”, disse ele sobre a iniciativa, cujo ponto-chave é aumentar progressivamente a idade mínima da aposentadoria dos 62 para os 64 anos a partir de 2030. “Quando comecei a trabalhar aqui, havia 10 milhões de aposentados. Hoje há 17 milhões, em breve haverá 20 milhões.”
Desde que o projeto foi lançado em janeiro, os protestos são recorrentes pelo país – eram majoritariamente pacíficos, até a primeira-ministra Élisabeth Borne anunciar que o Palácio do Eliseu recorreria ao Artigo 49.3 da Constituição para atuar por decreto. Desde então, há vários registros de embates entre manifestantes e policiais, com uso de gás lacrimogêneo, canhões d’água e balas de borracha para fazer frente às barricadas, carros e lixos incendiados.
Na terça-feira, segundo a imprensa francesa, o presidente havia dito a integrantes do seu Gabinete e aliados que a “multidão” nas ruas “não tinha legitimidade”, afirmando que os parlamentares eleitos eram os representantes do povo. Questionado se achava as manifestações ilegítimas, ele respondeu que sua declaração foi mal compreendida.
“Há legitimidade para os sindicatos quando protestam contra a reforma, e eu os respeito. Estão defendendo seu ponto de vista, e é algo garantido pela Constituição”, afirmou. “Mas, no momento que nossa democracia está vivendo, quando grupos recorrem à violência extrema para atacar representantes populares (…) e sem qualquer ordem porque estão infelizes, não é mais uma República.”
O presidente referia-se a atos como saques a escritórios públicos, quebra de janelas, pichações e e-mails com ameaças à vida, relatados por alguns parlamentares. Indagado por Lacarrau se o tom de suas palavras acalmaria os ânimos no país, ele respondeu que seu discurso é “esclarecedor”:
“Quando os Estados Unidos lidavam com o que aconteceu no Capitólio, quando houve o que houve no Brasil, quando houve violência extrema na Alemanha ou na Holanda no passado, eu dizia ‘nós respeitamos, ouvimos, tentamos seguir em frente pelo país (…)’, mas não podemos aceitar facções ou desordem.”
Diferentemente das cenas vistas em Brasília e Washington, os manifestantes não invadiram prédios dos Três Poderes insuflados por líderes derrotados nas urnas. De acordo com pesquisas da semana passada, dois em cada três franceses são contra a reforma da Previdência, que também antecipa para 2027 a exigência de contribuição por 43 anos – e não 42, como atualmente – para que o trabalhador tenha direito à pensão integral.
A Anistia Internacional alertou contra o “uso excessivo de força de forma generalizada” e contra as “detenções arbitrárias” no país. O número exato de pessoas que permanecem detidas é desconhecido, mas a maioria das centenas de manifestantes presos diariamente recebe apenas advertências, sinalizando que as prisões em massa são usadas como prática de controle de multidões. As informações são do jornal O Globo.