Terça-feira, 17 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 23 de março de 2025
O discurso formal de Jair Bolsonaro (PL) e de aliados sobre a anistia do 8 de Janeiro tem se concentrado nos militantes presos. Mas o projeto de lei articulado na Câmara que propõe perdoar os crimes referentes àquele episódio têm brechas para beneficiar diretamente o ex-presidente.
Apesar de o projeto original, proposto pelo deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), ter sido protocolado em 24 de novembro de 2022, mais de um mês antes dos ataques em Brasília, a proposição recebeu sete apensamentos para abarcar acontecimentos consecutivos.
O texto de Vitor Hugo prevê anistia a manifestantes, caminhoneiros, empresários e a todos que tenham participado de manifestações “em qualquer lugar do território nacional” – Bolsonaro estava nos EUA no momento dos atos golpistas –, mas um dos parágrafos amplia o perdão a quem tenha participado também do “financiamento, organização ou apoio de qualquer natureza”.
“A anistia de que trata o caput compreende crimes políticos ou com estes conexos e eleitorais. Consideram-se conexos os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política”, diz um parágrafo do documento, que recebeu críticas da ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT).
“Seriam perdoados como ‘crimes conexos’ os decretos do golpe, o plano de assassinato de Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes, a conspiração com os chefes militares, todos os crimes praticados por Bolsonaro e cúmplices contra a democracia, inclusive os eleitorais. (A anistia) Não é, nunca foi para as ‘senhorinhas da Bíblia’”, disse Gleisi em rede social.
Quando a proposta foi protocolada, bolsonaristas tinham migrado das rodovias para a frente dos quartéis. Em 12 de dezembro a violência recrudesceu. Naquele dia, data da diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva, radicais tentaram invadir o prédio da Polícia Federal, incendiaram carros e ônibus e bloquearam vias em Brasília.
No mesmo dia, o deputado José Medeiros (PL-MT) protocolou um projeto para anistiar “todos aqueles que, no período entre 1.º de junho de 2022 até a data de entrada em vigor desta lei, tenham se manifestado, por meio de atos individuais ou coletivos, ou tenham financiado ou participado de tais manifestações e protestos, relacionados às eleições de 2022 e temas a ela pertinentes”.
A brecha para abranger a situação de Bolsonaro foi ampliada em outros projetos de lei. Proposta de Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) e sua bancada na Câmara concede anistia aos participantes de manifestações com motivação política ou eleitoral, ou que as apoiaram com contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em redes sociais.
Adilson Barroso (PL-SP) foi o mais célere a propor um projeto mirando o perdão a Bolsonaro – foi protocolado no mesmo dia em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou o ex-presidente à inelegibilidade, em 30 de junho de 2023. O texto concede anistia “a todos aqueles que, no período das eleições de 2022, tenham praticado atos que sejam investigados ou processados sob a forma de crimes de natureza política e eleitoral”.
De maneira semelhante, o projeto do deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) propõe anistiar todos os acusados e condenados pelos crimes antidemocráticos ocorridos no 8 de Janeiro. “Não estamos propondo uma anistia ampla, mas apenas para esses crimes específicos, dada a impossibilidade de identificar objetivamente a intenção de cometê-los.”
O texto do Delegado Ramagem (PL-RJ) e cinco correligionários prevê separar os vândalos dos apoiadores, financiadores e organizadores do 8 de Janeiro. O objetivo é afastar interpretações que enquadrem como “atentado ao estado democrático de direito o que seja dano ao patrimônio público, depredação e congêneres”.
O projeto de Hélio Lopes (PL-RJ) foi o único apensado ao de Vitor Hugo que mira os condenados de menor poder aquisitivo. O texto prevê livrar de pagamento de prestação pecuniária bolsonaristas presos que estejam inscritos no Cadastro Único ou que comprovem que não têm condições de arcar com o pagamento.
O projeto de lei da anistia ainda tem um longo percurso pela frente. Ele foi retirado da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara em outubro passado pelo então presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que anunciou a criação de comissão especial. O colegiado ainda não foi instaurado pelo sucessor de Lira, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Em caso de aprovação na Câmara, o projeto seguiria para o Senado. Após tramitar nas duas Casas, precisaria da sanção de Lula. A decisão por um eventual veto presidencial poderia ser derrubada pelo Congresso. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.