Quinta-feira, 04 de dezembro de 2025
Por Renato Zimmermann | 4 de dezembro de 2025
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editoriais de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Comecei a trabalhar no Banco do Brasil em 1983, com menos de 14 anos. Foram 13 anos de aprendizado e observação, período em que testemunhei uma mudança estratégica da instituição: a visão de que, em três décadas, o Brasil se tornaria uma potência mundial na produção de alimentos. Essa aposta se concretizou. Vi empresas nascerem, vi o campo se transformar, e em 1986 deixei o banco para atuar em uma empresa ligada indiretamente ao setor.
Naquele tempo, o Brasil era essencialmente industrial. Em 1980, a indústria representava cerca de 32% do PIB, comércio e serviços 50% e a agropecuária menos de 10%. Hoje, em 2025, o cenário é outro: o comércio e serviços respondem por aproximadamente 70% do PIB, a indústria por 20% e a agropecuária por 10%.
Essa mudança estrutural explica muito da dinâmica econômica que presenciei em pequenas cidades como Garibaldi, na Serra Gaúcha. Ali, a prosperidade dependia da safra de uvas: quando boa, vinícolas vendiam mais, o comércio florescia e os serviços se expandiam; quando ruim, o dinheiro simplesmente não circulava.
Apaixonei-me pela indústria e, já cursando economia na Fundação Educacional da Região dos Vinhedos (hoje CARVI/UCS), assumi funções executivas em empresas ligadas a indústria. Participei da implantação de uma unidade produtiva em Nova Araçá, no norte da serra.
Em 1999, a cidade estava totalmente estagnada, sem perspectivas. Mas em 2004, com a operação instalada, Nova Araçá registrou crescimento expressivo: entre 2004 e 2011, seu PIB per capita mais que dobrou, chegando a R$ 34 mil em 2013, o maior índice da região. Por sete anos consecutivos, figurou entre os municípios gaúchos com maior expansão econômica. Isso mostra o poder transformador de uma operação empresarial.
O empreendedor por trás dessa iniciativa, Orlando Carrer, é um exemplo de resiliência. Em meio a dificuldades, sempre encontrava caminhos para manter a operação ativa. Essa é a essência do chamado “agronegócio” — termo que não se usava na época e que hoje carrega rótulos.
Prefiro interpretá-lo como um sistema complexo, com prós e contras: de um lado, geração de riqueza, empregos e capacidade de sustentar o país em crises como a pandemia; de outro, impactos ambientais, concentração de renda e dependência de insumos químicos.
Somente em 2015, aos 48 anos, despertei minha consciência para atuar em questões ambientais. Desde então, passei a conviver com todos os segmentos do setor e a valorizar a agricultura familiar, que considero mais justa e distributiva. Mas não ignoro os dilemas: prosperidade e devastação caminharam sempre juntas.
Na COP30, em Belém, visitei a Agrizone, espaço criado pela Embrapa Amazônia Norte para dar voz ao setor dentro da conferência do clima. Funcionava como uma arena de exposições e debates, patrocinada por grandes empresas, mas também aberta a agricultores e cooperativas.
Foi alvo de críticas: o MST denunciou a presença de corporações como Bayer, Nestlé, Syngenta e até a Toyota, acusando-as de dominar o espaço; organizações independentes apontaram conflito de interesses. Ainda assim, percebi que havia diálogo. O campo também está preocupado com as mudanças climáticas e busca soluções: tecnologias de baixo carbono, agricultura regenerativa, novos modelos de produção.
Claro, há hipocrisia e interesses econômicos. Mas também há genuína preocupação. O desafio é separar narrativas de realidades, combater a desinformação e cobrar políticas responsáveis. O chamado “PL da devastação”, que flexibiliza regras ambientais, é um exemplo de retrocesso que pode custar caro ao planeta.
Hoje, aos 57 anos, sigo tentando entender, aprender e contribuir. Porque, no fim, a verdadeira colheita que precisamos garantir é a de um planeta habitável — para nós e para aqueles que ainda virão chamar esta terra de lar.
* Renato Zimmermann é desenvolvedor de negócios sustentáveis e ativista da transição energética
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editoriais de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.