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Colunistas A Sociedade Exausta

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Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editoriais de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Vivemos um tempo paradoxal. À medida que o mundo se globaliza, interconectando pessoas, culturas e economias num mesmo espaço digital, assistimos a um fenômeno oposto e simultâneo do recuo às tribos, aos pequenos grupos de afinidade e às identidades que prometem abrigo diante da exaustão global. O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, em A Sociedade do Cansaço, oferece uma oportunidade para compreender melhor esse movimento. Ele nos mostra que, sob a aparência de liberdade e desempenho ilimitado, o homem contemporâneo está preso a um ciclo de autoexploração e fadiga existencial.

A globalização prometeu ampliar horizontes, mas o excesso de conexões acabou por dissolver o sentido de pertencimento. Somos parte de tudo e, paradoxalmente, de nada. A mesma tecnologia que nos aproxima do planeta inteiro nos afasta do próximo. A aceleração da vida, a competição permanente e o imperativo do desempenho superior produzem uma sociedade onde todos estão cansados, não pelo excesso de trabalho manual, mas pela sobrecarga psíquica e pela exigência de ser “melhor” o tempo todo.

Nesse cenário, as pessoas buscam refúgio em novas tribos, tais como as comunidades digitais, os grupos de interesse, novos estilos de vida e bolhas ideológicas que recriam a sensação de identidade perdida. A aldeia global imaginada por McLuhan transformou-se num arquipélago de tribos emocionais. O tribalismo digital, alimentado por algoritmos e identidades fragmentadas, é o contragolpe da alma humana contra o cansaço, contra o excesso. Quando tudo está disponível, o essencial precisa ser redescoberto. Nesse imenso aquário digital, sobra informação, falta densidade, sobra frivolidade, falta senso de humanidade.

É nessa busca pelo essencial, nesse reencontro com os elementos fundacionais da natureza humana, que o estoicismo, filosofia antiga, reaparece com força surpreendente. Diante do ruído constante, das promessas de sucesso instantâneo e do culto ao desempenho, o pensamento estoico propõe o contrário: autodomínio, serenidade e foco naquilo que depende de nós. Sêneca, Epicteto e Marco Aurélio tornaram-se, curiosamente, guias para uma geração esgotada pela positividade tóxica e pela ansiedade digital. A sabedoria estoica ensina a arte de limitar o desejo, aceitar o que foge ao controle e cultivar a tranquilidade interior, algo que Han identificaria como uma forma de resistência silenciosa à sociedade do cansaço.

A globalização criou um mundo sem fronteiras físicas, mas com muros emocionais cada vez mais altos. Ao mesmo tempo, ressuscitou o desejo por vínculos autênticos e experiências com sentido. Não é coincidência que práticas antigas, tais como meditação, contemplação, minimalismo, filosofia estoica, encontrem hoje terreno fértil. O retorno ao essencial é uma tentativa de cura, terreno no qual o corpo e a mente buscam aquilo que o excesso comprometeu.

Talvez estejamos vivendo o que Byung-Chul Han chamaria de “momento pós-global”: um tempo em que o cansaço coletivo obriga a humanidade a desacelerar, ter tempo e espaço para refletir, antes de reagir. O futuro, nessa perspectiva e se houver lucidez, será menos sobre conquistas e mais sobre reconexão, com o outro, com o mundo natural e consigo mesmo. Não significa que abriremos mão do conforto moderno, mas dele não seremos reféns. É, antes de tudo, um processo que germina de uma tomada de consciência, quase um grito de alerta provocado pela desconexão entre nossa capacidade de absorção e a enxurrada de novidades e cobranças que diariamente nos assolam. Há, sem dúvida, um “gap” intransponível entre o que a moderna sociedade nos oferece e aquilo que é possível usufruir.

A verdadeira globalização que ainda não alcançamos, em resumo, é a da consciência, não a das mercadorias, dos dados ou das imagens. O próximo passo civilizatório quem sabe consista em compreender que o essencial nunca esteve lá fora, mas dentro. Num mundo saturado de possibilidades, o desafio maior é reaprender a descansar, a ouvir, a pertencer. E, porventura, voltar a ser humano.

(Instagram: @edsonbundchen)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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https://www.osul.com.br/a-sociedade-exausta/ A Sociedade Exausta 2025-12-11
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