Quarta-feira, 04 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 2 de junho de 2025
Você provavelmente já ouviu a afirmação de que franzir a testa requer mais músculos do que sorrir. Geralmente, isso é apresentado como um bom motivo para virar a cara para baixo – menos esforço, mais alegria. Mas, anatomicamente, os números não batem.
Todos nós já vimos isso – o sorriso que não chega aos olhos. De fotos de família constrangedoras a gentilezas tensas no ambiente de trabalho, nosso cérebro frequentemente detecta que algo está errado muito antes de percebermos conscientemente o porquê.
Mas o que há num sorriso que o faz parecer sincero — ou falso? A resposta está numa surpreendente mistura de anatomia facial, neurologia e autenticidade emocional.
Nem todos os sorrisos são criados iguais e, anatomicamente falando, há pelo menos dois tipos distintos: o sorriso de Duchenne, que reflete felicidade genuína, e o sorriso não-Duchenne, que tende a ser mais social ou estratégico.
Nomeado em homenagem ao neurologista francês do século XIX, Guillaume Duchenne de Boulogne, o sorriso de Duchenne ativa dois grupos musculares importantes. O primeiro grupo está associado aos cantos da boca – onde, por exemplo, o risório (do latim “sorriso”) puxa os cantos para fora e o músculo zigomático maior os levanta.
O segundo e mais revelador músculo é o orbicular do olho, que contrai os músculos ao redor dos olhos, produzindo os conhecidos “pés de galinha” e o estreitamento suave que associamos ao calor e ao prazer.
Sorrisos falsos ou educados, por outro lado, geralmente envolvem apenas os músculos da boca. Os olhos permanecem arregalados ou indiferentes, e o sorriso parece mais mecânico do que significativo – uma espécie de camuflagem emocional.
Tanto o sorriso real quanto o falso dependem do VII nervo craniano, também conhecido como nervo facial, que envia sinais do cérebro para os músculos da expressão facial. No entanto, há uma diferença neurológica fundamental: os sorrisos de Duchenne tendem a ser gerados pelo sistema límbico, o núcleo emocional do cérebro – particularmente a amígdala, um grupo de neurônios em forma de amêndoa que processa a relevância emocional.
Sorrisos não-Duchenne, por outro lado, costumam estar sob controle cortical mais consciente, originando-se no córtex motor. Essa divisão significa que sorrisos autênticos, motivados pela emoção, são involuntários.
Você não consegue facilmente forçar o seu orbicularis oculi a se contrair de forma convincente a menos que esteja genuinamente sentindo a emoção por trás da expressão. Até mesmo atores profissionais precisam recorrer a memórias reais ou técnicas metódicas para produzi-las de forma convincente.
Os humanos são notavelmente bons em detectar autenticidade emocional. Estudos mostram que até bebês de até dez meses conseguem distinguir entre sorrisos reais e falsos.
Evolutivamente, essa capacidade pode ter nos ajudado a avaliar a confiabilidade, reconhecer verdadeiros aliados e evitar enganos. O giro fusiforme, uma parte do cérebro envolvida no reconhecimento facial, trabalha em estreita colaboração com o sulco temporal superior para decodificar expressões — ajudando-nos a avaliar a intenção tanto quanto a emoção.
Na vida moderna, nossa sensibilidade às nuances faciais continua a ser importante. Políticos, profissionais de atendimento ao cliente e figuras públicas frequentemente recorrem ao sorriso social para lidar com expectativas interpessoais complexas. Mas observadores – conscientes ou não – frequentemente percebem essas microdiscrepâncias.
Sorrisos falsos não são necessariamente maliciosos. Na verdade, eles desempenham funções sociais importantes: suavizar interações constrangedoras, sinalizar polidez, neutralizar conflitos e demonstrar deferência. São uma parte vital do que os sociólogos chamam de “trabalho emocional” – gerenciar as próprias expressões para atender às expectativas sociais ou profissionais.
Mas esse tipo de sorriso, quando sustentado por longos períodos, pode ser emocionalmente exaustivo. Estudos sobre trabalho emocional sugerem que ser obrigado a sorrir sem sentimentos genuínos – especialmente em funções de serviço – está associado a aumento de estresse, esgotamento e até mesmo desgaste cardiovascular.
À medida que avançamos na era da IA, rostos sintéticos – de chatbots a assistentes virtuais – estão sendo programados para replicar expressões humanas. Mas o desafio permanece: como falsificar a autenticidade? Engenheiros conseguem programar um sorriso, mas sem as microcontrações ao redor dos olhos, muitas dessas expressões ainda parecem falsas. Nossa própria anatomia define o padrão ouro.
Então, da próxima vez que você estiver tentando decifrar a expressão de alguém, não olhe apenas para a boca. Observe os olhos. O músculo orbicular do olho raramente mente. As informações são do jornal O Globo.