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Por Redação O Sul | 29 de abril de 2019
As turbulências financeiras que sacudiram o mercado argentino nos últimos dias – fazendo a cotação do dólar bater o recorde de 48 pesos – confirmaram que o presidente Mauricio Macri vive seu pior momento e, pela primeira vez, instalaram dúvidas sobre a viabilidade de sua candidatura à reeleição em 27 de outubro. A deterioração econômica deu fôlego à provável candidatura da senadora e ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), que em maio enfrentará seu primeiro julgamento sob a acusação de corrupção. Segundo analistas, hoje a rejeição a Macri é superior à de Cristina, cenário que intensificou as pressões entre aliados do próprio governo para que o presidente não seja candidato.
Nesta semana, a taxa de risco da Argentina superou mil pontos básicos, indicando que o mercado perdeu a confiança no presidente. Macri – que em 2015 era visto como garantia da derrota da inflação e da atração de investimentos estrangeiros – foi obrigado em 2018 a pedir socorro ao Fundo Monetário Internacional. A tradicional União Cívica Radical (UCR) está com um pé fora da coalizão governista Mudemos, e seus dirigentes investem em outras opções eleitorais, como o ex-ministro da Economia Roberto Lavagna.
Até agora, a posição de Macri é insistir na tentativa de reeleição, apesar de as pesquisas indicarem que o presidente corre risco de não passar para o segundo turno ou de ser derrotado. A estratégia da Casa Rosada é apostar numa polarização com Cristina, o que ficou claro com declarações de Macri de que “o mercado está nervoso porque acha que os argentinos querem voltar para trás”. Mais uma vez, o presidente se apresenta como o futuro e põe Cristina como representante de um passado nefasto.
O problema, segundo o analista Hugo Haime, é que “cerca de 75% dos argentinos querem sair de Macri e acham que seu projeto não serve”. “Com os números que temos hoje, Macri não consegue se reeleger, e o principal fator que explica essa situação é a economia”, disse.
Macri prometeu pobreza zero, e hoje a taxa alcança 32%, superando a herdada de Cristina. A inflação, relacionada diretamente ao empobrecimento da população, continua alta. A projeção para este ano é de 39%, de acordo com empresas de consultoria. A economia terminará o ano com nova queda do PIB, no melhor dos casos em torno de -2,7%.
“Pessoas do círculo íntimo do presidente estão pedindo que ele ceda a candidatura. Mas Macri está numa tremenda saia-justa, porque se não for candidato enfraquecerá quem for. A pessoa representará um governo fracassado”, explicou Diego Reynoso, professor e pesquisador da Universidade de San Andrés.
Para ele, “hoje a maioria dos argentinos sente que existe um desgoverno, mas a renúncia de Macri a participar das eleições seria letal para a governabilidade”.
“Ainda temos entre 28% e 30% de indecisos, e faltam vários meses para a eleição. Acho que a economia definirá”, aposta Reynoso.
Os candidatos devem inscrever suas pré-candidaturas até 22 de junho. Em agosto serão realizadas as eleições partidárias internas, e em 28 de outubro, o primeiro turno das presidenciais. Mesmo sob julgamento, Cristina pode concorrer. Segundo recentes pesquisas, tem entre 25% e 30% das intenções de voto.
“A novidade é que muitos começamos a pensar que Macri poderia não chegar ao segundo turno. Cristina, se não for candidata, terá peso crucial na eleição. Já o presidente está numa encruzilhada e despencando muito mais nas pesquisas do que projetamos”, explica o analista Julio Burdman, da Universidade Nacional de Buenos Aires (UBA).
A seis meses do primeiro turno, o governo não tem margem para reverter o saldo econômico negativo. Ontem, Macri disse a seus ministros que o governo deverá “aprender a conviver com a volatilidade do dólar”, que em dezembro estava a 38 pesos. Essa volatilidade, somada à escalada da inflação e à paralisia da economia, poderia levar eleitores de Macri a migrarem para uma terceira candidatura – do ex-ministro Lavagna ou de outro dirigente vinculado ao peronismo não kirchnerista.
Economia x corrupção
O congelamento de preços anunciado pela Casa Rosada há duas semanas foi interpretado como um sinal de falta de rumo. Com a alta do dólar, setores empresariais já começaram a dizer que não poderão cumprir a promessa de não aumentar preços por um período de 180 dias.
“Está claro que para a sociedade argentina economia pesa mais do que corrupção, até porque não temos uma Justiça transparente e existem muitos questionamentos a todos os processos”, disse Burdman.
Se Macri perder o respaldo da UCR, Cristina mantiver o crescimento nas pesquisas e não houver alívio econômico, o projeto político do macrismo entrará no CTI. A candidatura do presidente é vista como perigosa, e o nome da governadora da província de Buenos Aires, Maria Eugenia Vidal, surge cada vez com mais força para substituí-lo. Ela, no entanto, discípula fiel do chefe de Estado, afirma que vai tentar um segundo mandato na maior província da Argentina.