Sexta-feira, 09 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 11 de outubro de 2020
Durante todo o verão no Hemisfério Norte, nos meses de junho e julho, a vida parecia normal nos bairros judeus ortodoxos de Brooklyn, em Nova York. Em algumas ruas, multidões de homens com chapéus pretos e casacos se formavam ao menos três vez ao dia, em suas idas às sinagogas. Crianças foram a acampamentos, e casamentos gigantescos enchiam grandes salões de banquetes. Porém, ignorando a pandemia, quase ninguém usava máscara.
Então, chegou agosto e o programa de rastreio do contágio do coronavírus emitiu alertas sobre o aumento de casos na região. Em resposta, o comissário de saúde da cidade, o médico Dave Chokshi, fez uma teleconferência com as agências de notícias judaicas ortodoxas para alertar sobre a alta taxa de contaminação e que as medidas de segurança para conter o avanço do vírus não estavam sendo seguidas pela comunidade religiosa.
No entanto, a reunião tomou outro rumo quando Chokshi foi questionado porque o prefeito de Nova York, Bill de Blasio, não mostrava o mesmo nível de preocupação com as reuniões em massa nos protestos antirracistas que aconteciam na cidade na mesma época.
Nas semanas seguintes, a tensão entre as autoridades e as comunidades judaicas ortodoxas piorou, se tornando o maior desafio de saúde para a cidade. O que começou como um pequeno aumento de casos em alguns bairros do Brooklyn agora ameaça acelerar a chegada de uma segunda onda que pode causar novas dificuldades para milhões de nova-iorquinos e travar a recuperação da economia, enfraquecida pela pandemia.
Por décadas, comunidades hassídicas e outras ultraortodoxas judaicas prosperaram na cidade e nos subúrbios dos arredores, ao mesmo tempo em que se afastavam de muitos aspectos do mundo moderno. Agora, enfrentam um escrutínio indesejável para saber se alto contágio da Covid-19 entre seus fiéis se deu porque algumas pessoas resistem em respeitar as medidas de segurança e se tornaram mais suscetíveis a informações falsa.
Buscando conter o vírus nesses bairros, o governador do estado de Nova York, Andrew Cuomo, voltou a impor restrições, como o fechamento de escolas e negócios não essenciais em partes do Brooklyn e Queens, assim como em seções dos condados de Rockland e Orange, que também têm populações consideráveis de residentes judeus ortodoxos.
Cuomo também adotou novas regras sobre templos, deixando claro que estava especialmente preocupado com a aglomeração de fiéis judeus ortodoxos nas sinagogas. Pelo menos pelas próximas duas semanas, esses espaços, nos bairros citados, não podem receber mais do que 10 pessoas por vez.
A ordem do governador desencadeou uma forte reação nos bairros ortodoxos, com protestos e até mesmo um ataque a um jornalista judeu famoso. Entrevistas com líderes comunitários, especialistas em saúde pública e autoridades municipais e estaduais mostram que alguns líderes ortodoxos reconheceram tardiamente os perigos do coronavírus.
O deputado Simcha Eichenstein — um ex-assessor de Blasio, que representa um dos bairros ortodoxos e foi o primeiro parlamentar estadual hassídico eleito no Brooklyn — implorou às autoridades para encorajar os pais de estudantes de instituições religiosas tradicionais a levar a sério as medidas de segurança.
Poucos dias depois, o próprio de Blasio se reuniu com dezenas de líderes judeus ortodoxos para uma videoconferência, onde também pediu que promovessem o distanciamento social e outras medidas de saúde pública.
As duas reuniões alcançaram alguns resultados, mais pessoas na comunidade começaram a usar máscaras. Porém, a mudança pode ter vindo tarde demais.
Nas últimas semanas, bairros com grande número de judeus ortodoxos têm apresentado taxas altas de diagnósticos positivos, de mais de 3% e de até 8% — no resto da cidade, varia entre 1% e 2%. Várias outras áreas com populações ortodoxas tiveram taxas entre 2% e 3%. Hospitais no Brooklyn começaram a se preparar para um aumento de pacientes vindos dessas áreas.