Quarta-feira, 14 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 30 de março de 2021
A Rússia anunciou com grande alarde a chegada de sua própria vacina, a Sputnik V, chamando-a de solução para a escassez de imunizantes em todo o mundo. Mas tem sido menos eloquente sobre também estar importando a própria vacina. O governo russo contratou a fabricação da Sputnik V junto a uma empresa sul-coreana, que já enviou doses para a Rússia, e planeja fazer o mesmo com uma empresa indiana.
Embora seja impossível avaliar a escala das importações, por causa dos acordos de sigilo, elas derrubam parte da narrativa que a Rússia apresentou sobre seu papel na pandemia como exportadora de vacinas para países necessitados.
As importações, que devem aumentar nas próximas semanas, podem ajudar a Rússia a superar uma vacinação lenta em solo nacional. E também ilustram que mesmo os países cujos cientistas criaram imunizantes bem-sucedidos dependem do comércio internacional para o fornecimento de vacinas.
No ano passado, autoridades russas disseram que a produção estrangeira poderia atender parcialmente à demanda doméstica. Mas, desde então, não se pronunciaram sobre a importação de um produto que foi considerado um triunfo dos cientistas do país. Fabricar a vacina na Rússia, no entanto, é mais complicado do que parece.
A Rússia recebeu dois aviões cargueiros carregados com a Sputnik V da fabricante sul-coreana GL Rapha, em dezembro, e a empresa planeja enviar outro carregamento nos próximos dias. Os fabricantes indianos também devem exportar a vacina russa para a Rússia, de acordo com diplomatas indianos.
A Rússia tem quatro acordos de produção na Índia. A empresa indiana Virchow Biotech, com sede em Hyderabad, assinou um acordo com Fundo de Investimento Direto da Rússia para fazer 200 milhões de doses da Sputnik V por ano. A produção de vacinas russas teve um início lento, pois houve dificuldade para obter equipamentos de biotecnologia fabricados na China, que estavam em falta.
Na semana passada, o presidente russo, Vladimir Putin, disse que, desde que os reguladores aprovaram a vacina, a Rússia distribuiu Sputnik V suficiente para inocular 8,9 milhões de pessoas. No entanto, a campanha de vacinação russa está lenta. A Rússia vacinou 4,4% de sua população, em comparação com 10%, na União Europeia, e 26%, nos EUA.
Na semana passada, o Kremlin reconheceu, pela primeira vez, que a escassez da vacina teve papel fundamental na decisão de Putin de adiar a própria inoculação, para não estimular a demanda por vacinas antes que elas estivessem disponíveis fora da capital. Em janeiro, quando chegou a vez do grupo etário de Putin, segundo as regras russas, “a produção ainda não era suficiente para atender totalmente à demanda no interior”, disse seu porta-voz, Dmitri Peskov.
Não está claro quão grande será o papel das importações no alívio da escassez, o que poderia acelerar as vacinações. Mas isso deixa a Rússia em posição inferior na hierarquia da geopolítica das vacinas, como importadora, e não apenas como exportadora. As autoridades russas, porém, optaram por dar destaque às exportações. “Uma vacina para toda a humanidade”, diz o site da Sputnik V.
Mais de 20 países começaram a vacinar com pequenas quantidades de vacinas fornecidas pela Rússia, entre eles Argentina, Hungria, Bolívia e Paraguai. Moscou diz que a maior parte da demanda será atendida pela produção no exterior. Mas o nacionalismo das vacinas está em ascensão. Esta semana, os contratos para entrega provaram ser menos importantes do que controlar os meios de produção.
A fabricante sul-coreana GL Rapha disse que não poderia falar sobre os embarques por causa do acordo de sigilo. A empresa disse que espera produzir 150 milhões de doses de Sputnik V este ano. O Fundo Russo de Investimentos Diretos não quis comentar sobre importações para a Rússia.
A Índia, uma grande fabricante, na semana passada evitou exportar quase todos os 2,4 milhões de doses fabricadas por uma empresa privada, o Serum Institute, à medida que o número de infecções disparava no país. A UE também restringiu exportações. Tanto os EUA quanto o Reino Unido importaram vacinas desenvolvidas internamente e fabricadas em outros países.