Quarta-feira, 21 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 9 de janeiro de 2021
Barbara Wolanin já foi curadora do Architect of the Capitol, o escritório que preserva e mantém a arte e a arquitetura do edifício. Ela sabia muito bem sobre os riscos que o espaço sofria naquele momento da invasão. E se os manifestantes rasgassem a “Declaração da Independência” de John Trumbull, uma das grandes pinturas do início do século XVIII que retratam a luta dos EUA pela liberdade? Ou quebrassem o busto de bronze de Martin Luther King Jr.?
“Toda a arte do Capitólio está à vista. Não há nada muito escondido”, diz Wolanin, que atuou como curadora do Architect of the Capitol de 1985 até sua aposentadoria, em 2015.
Por quase quatro horas, a coleção da qual ela passou 30 anos cuidando estava à mercê de uma multidão que invadiu salas no lado sul do Capitólio (incluindo o escritório da Presidente da Câmara, Nancy Pelosi), quebrou janelas e depois marchou através do National Statuary Hall, agitando bandeiras americanas, confederadas e outras com a inscrição “Trump Is My President”.
O tempo que os vândalos passaram no prédio agora é contabilizado através dos danos que deixaram para trás. Um busto de mármore do século XIX do ex-presidente Zachary Taylor estava manchado com o que parecia ser sangue. Uma moldura foi deixada no chão, e sua imagem desapareceu.
As fotos e vídeos, alguns deles tirados pelos próprios desordeiros, são surreais. Um homem enfiou uma foto emoldurada do Dalai Lama em sua mochila, enquanto outro fumava maconha em uma sala com mapas do Oregon na parede. Já um terceiro cidadão podia ser visto com uma jaqueta de couro rasgando um pergaminho com caracteres chineses. “Olhe todos esses móveis elegantes que eles têm!”, diz um quarto homem vestindo uma jaqueta de inverno e chapéu vermelho.
Quando a Polícia do Capitólio garantiu a segurança do local por volta das 18h, as janelas e portas do prédio histórico estavam quebradas, os escritórios, saqueados, e alguns móveis, danificados ou revirados.
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Avaliações detalhadas de danos do Architect of the Capitol e da Polícia do Capitólio dos EUA ainda não foram divulgadas. Mas as singulares obras de arte que os curadores consideram os tesouros do edifício não parecem ter sofrido grandes danos.
Sua maior preocupação eram as pinturas de 5 metros de altura de Trumbull e outros artistas que retratam cenas da fundação da república na Rotunda do prédio, além das dezenas de estátuas que ocupam o National Statuary Hall, ao sul.
Ela diz que esta foi a primeira vez que a coleção do Capitólio foi ameaçada nesta escala. Embora peças individuais tenham sofrido “pequenos” danos no passado, como quando um atirador invadiu o prédio em 1998, matou dois policiais e feriu uma turista antes de ser capturado, a última violação por um grande e violento grupo de pessoas aconteceu durante a Guerra Anglo-Americana de 1812, há mais de 200 anos, quando tropas invasoras britânicas incendiaram o prédio.
“Eles não respeitaram nada, nenhuma dessas peças históricas. Isso é o que mais assusta”, diz a ex-curadora sobre a multidão que saqueou o prédio. No dia seguinte, alguns restauradores estiveram no Capitólio constatando o tamanho do estrago.
Anthony Veerkamp, ex-diretor de desenvolvimento de políticas do National Trust for Historic Preservation, diz que alguns dos danos físicos devem ser preservados “como um lembrete de que nossos monumentos, instituições e valores são todos vulneráveis e devem ser constantemente cuidados”. Mas ele observa que é importante manter viva essa memória sem correr o risco de conceder status de heróis aos vândalos.