Quarta-feira, 01 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 15 de julho de 2022
Era de se esperar que a espanhola Marta Díez ficasse apreensiva ao se candidatar à vaga de presidente da Pfizer no Brasil, maior mercado da América Latina e décimo do mundo. “Que nada. Eu tinha muita confiança”, responde a executiva, sem titubear. E, como se surpreendida pela própria firmeza e espontaneidade, cai na risada.
Aos 45 anos, dois no comando da farmacêutica no Chile, a executiva se sentia pronta para novos desafios. “Foi uma experiência interessante, mas o país já estava ficando pequeno para mim”, arremata.
Primeira mulher à frente da Pfizer no Brasil, Díez já havia ocupado outros postos de liderança que a levaram a viver em diferentes países. Nas jornadas, diz, deparou-se com dois tipos de pessoas, aquelas que vivem a se queixar do que deixaram para trás e as que se abrem para o novo. “Em casa somos do segundo time, bem flexíveis.”
A nomeação de Díez saiu em fevereiro de 2021, mas por causa da pandemia ela despachou do Chile durante os primeiros meses. A vinda de mala e cuia para o Brasil só ocorreu em agosto.
Desde então, já foi com a família para lugares como a Amazônia, Foz do Iguaçu e Bonito, mas seu destino primordial continua sendo Brasília.
Dentre os assuntos tratados com o Ministério da Saúde estão as vacinas contra a covid para crianças com menos de 5 anos – hoje o grupo mais suscetível à
hospitalização pela doença, excetuando a população acima de 60 anos – e o antiviral Paxlovid. O medicamento, já em uso em 50 países, é o mais potente para combater a doença em estágio inicial, reduzindo o risco de hospitalização em 85%. Detalhes de preços permanecem confidenciais. A executiva afirma que eles variam de acordo com a renda de cada país, mesmo critério usado para as vacinas.
A vacina desenvolvida pela Pfizer com a BioNTech contra a covid foi a primeira a ser validada pela Organização Mundial da Saúde. No primeiro ano da pandemia, a farmacêutica estendeu as negociações do Chile para outros países da América Latina, como Equador, Peru e Bolívia. “Obviamente todos tinham muita pressa de conseguir a vacina, muita gente morrendo, hospitais lotados.”
Enquanto isso, o governo brasileiro dava de ombros às tentativas de tratativas.
Alguns países, contemporiza, precisaram mudar a legislação e criar normas provisórias para aprovar o uso emergencial das vacinas.
Nos Estados Unidos e na Europa não foi necessário. “Seguir a lei em compras
públicas exige uma série de critérios, acho que isso atrasou a negociação no Brasil.”
No entanto, mesmo após a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa,
autorizar o uso emergencial em 2020, o Planalto continuou de braços cruzados. Entre a primeira oferta da farmacêutica para o governo e a assinatura do contrato passaram-se sete meses.
Pfizer e BioNTech estão trabalhando agora numa versão adaptada à ômicron e suas sublinhagens. “Não sabemos ainda se vão vir outras mutações, esperamos que não, mas é sempre uma fonte de preocupação. Mas se vier, a tecnologia do RNA mensageiro é capaz de desenvolver e produzir uma nova vacina com rapidez.”
Análise mais recente conduzida por cientistas do Reino Unido estima que apenas no primeiro ano de pandemia as vacinas salvaram 20 milhões de vidas em todo o planeta, sendo 1 milhão só no Brasil. “A situação agora é bem diferente, não dá tanto medo”, diz a executiva, ainda incólume ao vírus e batendo três vezes na madeira. “Tomei as três doses para a minha idade e se eu pegar terei uma doença leve”, arremata.
Outra preocupação sua é com o impacto da pandemia nas campanhas de
prevenção e imunização de outras doenças que ficaram em segundo plano na crise. Caso nada seja feito, alerta, corremos o risco da volta de casos de meningite, sarampo e poliomielite, que podem causar sequelas irreversíveis. A vacina é vítima do próprio sucesso. Como é eficaz, as pessoas esquecem que um dia a doença existiu.
Um estudo recente da Pfizer revela que 16% dos responsáveis não pretendem
vacinar seus filhos contra covid; aqueles que tomaram doses de reforço estão mais dispostos a vacinar as crianças pelas quais são responsáveis; e a propensão a vacinar a prole cai à medida que a escolaridade e renda familiar aumentam.
“Impressionante. As pessoas têm medo de vacina e não da doença”, lamenta a
executiva.
Outro dado da pesquisa, acrescenta, foi o aumento na pandemia da propagação de fake news. Para combatê-las, diz, a multinacional tem usado todos os canais possíveis. “Nossa estratégia é comunicar, seja em entrevistas, redes sociais, especialista contratados para monitorar, chat box, WhatsApp, carro de som em comunidades carentes, tudo para contrastar as informações falsas com as corretas.”