Sexta-feira, 10 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 19 de abril de 2023
Depois de parte do governo ter reduzido na marra o juro do consignado para beneficiários do INSS, causando um rebuliço no setor bancário no mês passado, agora a indústria financeira tenta evitar que seja estabelecido um limite para os juros no rotativo do cartão de crédito.
Na segunda-feira (17), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve uma reunião com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e CEOs de instituições financeiras privadas. Antes do encontro, o ministro dizia que seriam discutidas alternativas. Saiu da reunião mais comedido, afirmando que um grupo de trabalho será criado. “Parece que a Fazenda entendeu a racionalidade econômica e a complexidade da indústria de cartões”, comentou uma fonte com conhecimento das discussões.
O receio do setor é que a ala política do governo ou mesmo o Congresso acabem aprovando de maneira apressada uma medida populista para reduzir os juros do rotativo do cartão, atualmente em mais de 417% ao ano. Eles admitem que a taxa é alta, mas alegam que ela é fruto de problemas estruturais e que a cadeia do cartão de crédito é extremamente complexa, com quatro partes envolvidas – bandeiras, adquirentes (maquininhas), emissores (bancos) e lojistas – e que alterações açodadas podem acabar afetando o instrumento, que é responsável por boa parte do consumo das famílias.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, tem criticado fortemente os altos níveis de juros no Brasil, e recentemente o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) protocolou projeto de lei que estabelece um teto de juros sobre as faturas de cartão de crédito de pessoas físicas e microempreendedores individuais. O projeto determina um limite de 8% de juros ao mês, equivalente a 150% ao ano.
“Hoje já vamos discutir alternativas”, afirmou Haddad antes do encontro de segunda-feira. O atual desenho do rotativo, disse o ministro, está prejudicando a população de baixa renda. “Boa parte do pessoal que está no Serasa é por conta do cartão de crédito”, disse. “Não só, mas também.” O objetivo, acrescentou, é encontrar um caminho negociado, “como fizemos com o consignado dos aposentados.” Ele se refere à saída que teve de negociar com os bancos após o Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) baixar o juro do consignado no INSS de 2,14% a 1,70%, sem combinar com a área econômica do governo. No fim, após muita negociação e depois de os bancos interromperem a concessão, a taxa passou a ser de 1,97%.
Antes da reunião, a Febraban soltou nota afirmando que levaria ao ministro um estudo sobre a indústria do cartão de crédito no Brasil. A entidade afirmou que tem como prioridade a redução do custo de crédito no país, sendo necessário compreender e atacar as causas dos altos juros, com adoção de medidas corretas, que levem em consideração a estrutura de custos do setor, as especificidades de cada produto e sigam a racionalidade econômica. “Nesse sentido, a entidade entende como oportuna a discussão técnica e aprofundada das causas que levam o cartão de crédito a ter patamares elevados de juros. A Febraban ressalva, no entanto, que esse é um tema que nos convida a um amplo debate, envolvendo BC, Fazenda e os participantes da indústria”, disse.
Depois do encontro, Haddad afirmou que será apresentado um estudo sobre o assunto e o Banco Central será envolvido na discussão. Ter a autarquia – que tem um presidente independente – nas discussões era um pleito do setor. “Estávamos com quatro ou cinco CEOs de bancos aqui, não só a Febraban, vamos envolver o Banco Central e vão entregar um cronograma de apresentação de um estudo [para juros do rotativo]. Eu pedi celeridade, pediram para envolver o BC porque tem a regulamentação do produto.”
O presidente da Febraban, Isaac Sidney, comentou que é importante compreender as causas do custo de crédito elevado. Segundo ele, um grupo de trabalho será constituído, mas não há prazo para a conclusão da análise. “Não é o momento para apontar caminhos ou discutir propostas. Os caminhos precisam ser discutidos após um diagnóstico correto.” Segundo ele, uma das razões dos juros bancários elevados é pouca efetividade da recuperação de garantias. “Se o país tiver o Marco Legal de Garantias, vamos dar passo importante para reduzir o custo de crédito.”
Enquanto isso, a indústria tenta nos bastidores construir possíveis alternativas para evitar o teto de juros no rotativo do cartão, a exemplo do que ocorreu no cheque especial. O teto para os juros do cheque especial foi implementado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 2020. Na época, a taxa do produto rondava 11% ao mês, e o limite foi definido em 8%. Segundo estudo recente do UBS BB, o efeito mais significativo da mudança foi um crescimento muito menor do empréstimo de cheque especial em relação ao rotativo do cartão. Em 2017, O CMN havia limitado em 30 dias a permanência do cliente no rotativo do cartão. Após esse prazo, os bancos precisam ofertar outras linhas. As informações são do jornal Valor Econômico.