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Por Redação O Sul | 24 de junho de 2021
Após romper uma tradição de quase 30 anos em 2019, votando pela primeira vez contra a condenação ao embargo econômico dos Estados Unidos a Cuba na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), o governo de Jair Bolsonaro recuou parcialmente e se absteve na votação de quarta-feira (23). No total, foram 184 votos contrários às medidas adotadas pelo governo americano à ilha, enquanto dois países – os próprios EUA e Israel – foram a favor.
Com o Itamaraty sob o comando de Ernesto Araújo em 2019, o Brasil se juntou a Israel e aos EUA e pela primeira vez em 27 anos votou contra a condenação ao embargo econômico, comercial e financeiro a Cuba promovido pelo governo americano, em uma decisão que partiu do presidente Jair Bolsonaro. A medida fazia parte de uma política de alinhamento com Washington, quando Donald Trump ainda era o presidente. Anteriormente, o Brasil costumava votar contra o embargo, juntando-se à grande maioria dos países.
No entanto, agora com o Itamaraty sob a gestão do chanceler Carlos França e sem Trump na Presidência, o Brasil mudou o posicionamento. Segundo a missão brasileira na ONU, o embaixador Ronaldo Costa participou da votação no voto brasileiro de abstenção. Outros três países se abstiveram na sessão: Ucrânia, Emirados Árabes Unidos e Colômbia.
Segundo uma fonte do governo brasileiro, a abstenção do Brasil foi motivada por vários fatores, sendo os principais a recente eleição do país como membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU, a posição contrária à aplicação de uma lei interna americana contra outra nação – no caso, Cuba – e o nível atual das relações entre os governos dos presidentes Joe Biden e Bolsonaro. O Brasil assumirá um mandato no Conselho de dois anos a partir de 2022. Segundo essa fonte, é importante manter “certa equidistância” de posições em temas sensíveis para diversos países com percepções diferentes e, para o governo brasileiro, a aplicação extraterritorial de medidas restritivas unilaterais é contrária ao direito internacional.
Outra razão mencionada por interlocutores do governo consiste na própria troca de chanceler. Ao contrário de Ernesto, que tinha os olhos voltados para alianças mais específicas e pontuais, como os EUA e Israel, França, prefere resgatar o posicionamento histórico do Brasil de não aceitar sanções unilaterais.
Um sinal claro sobre essa mudança de postura está relacionado à América do Sul. França quer manter contatos com todos os países da região, para que o Brasil recupere o espaço perdido na gestão de Ernesto.
A Assembleia Geral vem aprovando anualmente desde 1992, por ampla margem, a resolução que pede o fim do embargo, imposto há 59 anos no contexto da Guerra Fria. Ele foi adotado três anos depois da revolução socialista na ilha e transformado em lei pelo Congresso americano em 1992.
Havana afirma que, desde que o presidente John Kennedy impôs o embargo a Cuba, a medida provocou prejuízos à ilha que superam US$ 138 bilhões.
A resolução da ONU argumenta que o embargo é contrário à liberdade de comércio e de navegação consagrada no direito internacional.
O Brasil, tradicionalmente, se opõe a todo tipo de sanção econômica que não tenha passado por organismos multilaterais como a própria ONU. Portanto, ao romper a sua tradição em 2019, para além caso específico do embargo a Cuba, o voto brasileiro rompeu com uma posição de décadas.
A reversão do voto em relação a Cuba abre a expectativa de que o governo brasileiro, em sua nova gestão no Itamaraty, possa também rever outros posicionamentos em fóruns internacionais. Algumas das expectativas se relacionam a votações sobre gênero no Conselho de Direitos Humanos em Genebra. O Brasil chegou a votar ao lado de ditaduras islâmicas em resoluções durante a gestão de Ernesto.
Depois de 52 anos de uma política de bloqueio que não deu o resultado esperado de levar à queda do regime socialista na ilha caribenha, em 2014 o governo de Barack Obama reatou as relações diplomáticas com Havana e relaxou as sanções dos Estados Unidos determinadas pela Casa Branca – o fim do embargo depende do Congresso.
En 2016, ainda sob Obama, pela primeira vez Washington se absteve na votação da resolução da Assembleia Geral que pediu o fim do bloqueio.
Com a chegada ao poder de Donald Trump, no entanto, sanções contra a ilha voltaram a ser apertadas a partir de 2017, prejudicando a economia cubana. A partir de 2019, as sanções americanas contra as exportações de petróleo venezuelano atingiram severamente Cuba, ao reduzir as vendas subsidiadas de combustíveis feitas por Caracas a Havana.
Cuba não é uma prioridade da política externa do governo Biden, que, por enquanto, não adotou medidas para reverter as sanções impostas por Trump. As informações são do jornal O Globo.