Segunda-feira, 12 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 21 de fevereiro de 2016
Atraídas por bons pagamentos, jornadas flexíveis e a possibilidade de progredir na carreira, imigrantes brasileiras nos Estados Unidos vêm dedicando décadas de suas vidas a um dos serviços menos valorizados no Brasil: o trabalho doméstico. Em partes do Estado de Massachusetts, onde se estima que a comunidade brasileira some 300 mil pessoas, o setor é hoje dominado por brasileiras, que contam com um batalhão de trabalhadoras e fundaram empresas especializadas em limpeza.
Vinda na década de 1980, nas primeiras levas de imigrantes, Célia Fernandes, 56 anos, trabalha como diarista na região de Boston há mais de 20 anos. Limpando, em média, cinco casas por dia, ela recebe mensalmente cerca de 5,6 mil dólares (mais de 22 mil reais). Com o dinheiro, comprou o carro que dirige até a casa dos clientes, paga as prestações de uma casa de três andares – dois deles alugados para outras famílias – e ainda cobre os gastos da filha, que cursa farmácia em uma universidade local.
Célia se uniu a outros imigrantes para entrar nos Estados Unidos pela fronteira com o México, a pé. Ela diz que o grupo esperou 28 dias pelo momento certo de atravessar a fronteira. “A gente usava roupas rajadas para se misturar com o deserto.” Ao entrar nos Estados Unidos, logo se instalou em Massachusetts e começou a trabalhar como doméstica. Hoje, Célia é cidadã americana, condição de uma minoria dos imigrantes brasileiros no país, e alcançou o topo da hierarquia no ramo.
Ela se tornou “dona de schedule”, diarista que negocia diretamente com os empregadores e costuma contratar ajudantes para auxiliá-la na limpeza. Ela conta que uma das principais diferenças entre o trabalho doméstico no Brasil e nos Estados Unidos é a forma de calcular o pagamento. Nos EUA, o valor costuma se basear no total de horas trabalhadas, modelo que tende a encurtar as jornadas, enquanto no Brasil patrões e empregados geralmente combinam uma quantia para um determinado número de tarefas. São raros nos Estados Unidos os trabalhadores domésticos fixos, que atuam em uma só casa. Muitas domésticas se referem a seus empregadores como clientes, e não patrões.
Negócio próprio.
Algumas imigrantes brasileiras foram além e abriram empresas de limpeza para atender a clientela. Lilian Radke chegou aos Estados Unidos aos 18 anos com uma bolsa para jogar vôlei – modalidade em que era profissional – e cursar administração de empresas na Universidade de Arkansas. Hoje, Lilian preside a Unic Pro, companhia com 65 funcionários e responsável pela limpeza de 72 prédios em Massachusetts. Para ela, ser brasileira conta pontos no ramo. “Às vezes um americano não consegue ter uma empresa de limpeza porque teria de falar português ou espanhol com os funcionários”, diz, referindo-se à mão de obra majoritariamente latino-americana na região.
Lilian afirma que o setor atrai imigrantes por não exigir o domínio do inglês e pagar mais que muitas ocupações de escritório. As vantagens, diz ela, fazem com que muitos imigrantes brasileiros – inclusive vários com diplomas universitários – optem por permanecer no ramo indefinidamente.
A professora universitária e diretora executiva do Centro do Trabalhador Brasileiro em Boston, Natalícia Tracy, aponta que o trabalho doméstico tem feições distintas no Brasil e nos Estados Unidos. “Quando você trabalha como trabalhador doméstico aqui, eles [patrões] não mandam em você: eles pedem e agradecem”, diz Tracy. Já no Brasil, segundo ela, a profissão é “muito desvalorizada”.