Segunda-feira, 22 de setembro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de agosto de 2022
O Chile convocou nesta segunda-feira (29) o embaixador brasileiro em Santiago, Paulo Roberto Soares Pacheco, para protestar contra as declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre seu par chileno, Gabriel Boric, no debate presidencial de domingo (28). As falas do mandatário brasileiro, que erroneamente acusou Boric de atear “fogo em metrôs” durante os protestos de outubro de 2019, são “falsas” e “gravíssimas”, afirmou a chanceler chilena, Antonia Urrejola.
“Como governo nos parece que essas declarações são gravíssimas, obviamente são absolutamente falsas (…). Lamentamos que tirem proveito do contexto eleitoral para polarizarem as relações bilaterais através da desinformação e das notícias falsas”, disse a chanceler.
A fala de Bolsonaro sobre Boric veio no fim do debate, quando o presidente fazia suas considerações finais. Repetindo seus ataques frequentes a líderes de esquerda latino-americanos e tentando associá-los ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente citou o argentino Alberto Fernández, o recém-empossado mandatário colombiano Gustavo Petro e Boric:
“Lula apoiou o presidente do Chile também, o mesmo que praticava atos de tacar fogo em metrôs lá no Chile. Para onde está indo nosso Chile?”, afirmou o presidente.
Bolsonaro referia-se às maiores manifestações da História chilena, em outubro de 2019, que começaram com reclamações sobre o aumento do preço do metrô, mas ganharam demandas sociais mais amplas, refletindo também a rejeição ao governo do presidente conservador Sebastián Piñera.
Na época, Boric era deputado e atuou como um dos principais mediadores entre os manifestantes e o Legislativo para que houvesse uma saída institucional para a crise, com o referendo em que os chilenos votaram pela convocação de uma Constituinte para mudar a Carta herdada da ditadura de Augusto Pinochet. Ao contrário do que diz o presidente brasileiro, o líder chileno não participou da destruição de patrimônios públicos.
O governo chileno, disse Urrejola, está “absolutamente convencido de que esta não é a maneira correta de fazer política quando se trata de dois chefes de Estado democraticamente eleitos”. Ela classificou a relação de Bolsonaro e Boric como “respeitosa, apesar da diferença ideológica”, mas disse que a desinformação “erode a democracia, e nesse caso também a relação bilateral”.
De acordo com o jornal chileno La Tercera, Boric procurou sua chanceler para elaborar uma resposta a Bolsonaro assim que soube dos comentários do presidente. A convocação de um embaixador não é algo corriqueiro na diplomacia: trata-se de um sinal político para expressar descontentamento. A China, por exemplo, convocou no início do mês o embaixador americano em Pequim para protestar contra a visita da presidente da Câmara americana, Nancy Pelosi, a Taiwan.
Além de ser chamado, Pacheco também recebeu uma nota formal de protesto. Em uma nota emitida logo em seguida à imprensa, a Chancelaria chilena ressaltou os comentários de Urrejola, afirmando que os comentários de Bolsonaro “são inaceitáveis”. O comunicado diz que Boric “já manifestou publicamente as diferenças que o separam do presidente Bolsonaro, mas ao mesmo tempo sinaliza a importância de manter a relação bilateral”.
No ano passado, o Chile foi o quinto maior comprador das exportações brasileiras, segundo dados do Ministério da Economia, ficando atrás apenas de China, Estados Unidos, Argentina e Holanda. As vendas, ao todo, somaram quase US$ 7 bilhões, em sua maior parte petróleo e carnes. O intercâmbio comercial entre os dois países teve seu melhor resultado no ano passado, quando um acordo de livre comércio firmado em 2018 entrou em vigor.
A relação entre Bolsonaro e Boric, contudo, é tensa desde antes do chileno tomar posse em março deste ano: por exemplo, o embaixador nomeado por ele para Brasília, Sebastián Depolo, ainda não recebeu o agrément – a autorização para assumir o posto – do Planalto. Os problemas começaram ainda na disputa eleitoral, com o presidente brasileiro deixando clara sua preferência pelo concorrente de Boric, o direitista José Antonio Kast.
Para o governo brasileiro, a preferência de Boric por Lula também não cai bem. O petista foi convidado para a posse em Santiago, mas não compareceu – quem viajou foi a ex-presidente Dilma Rousseff. Bolsonaro também não fez a viagem, escalando o vice-presidente Hamilton Mourão para a tarefa. As informações são do jornal O Globo e de agências internacionais de notícias.