Quinta-feira, 06 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de julho de 2018
Com o envelhecimento da população e o aumento do número de pessoas com mais de 80 anos, os pesquisadores querem entender o que faz os cérebros dos superidosos serem mais resistentes aos efeitos do avanço da idade, investigação que pode dar pistas sobre como prevenir ou adiar quadros de Alzheimer ou outras demências.
Um grupo seleto começou a ser estudado nos últimos meses por uma rede formada por três instituições de pesquisa brasileiras: as Universidades USP (de São Paulo), UFMG (Federal de Minas Gerais) e PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul).
“Estudar isso abre a perspectiva de saber se essa característica é mero acaso ou se há algo ao longo da vida que fez com que esses superidosos obtivessem um envelhecimento bem-sucedido. Queremos saber se é só genética ou se há algo mais”, destaca Ricardo Nitrini, professor de Neurologia da USP. “Em vez de se estudar só os indivíduos com demência e ver o que de ruim fizeram, a ideia é pegar um indivíduo que está bem e descobrir o que de bom ele fez.”
Ele e seu doutorando, o neurologista do Hospital das Clínicas Adalberto Studart Neto, já estão estudando dois casos identificados como superidosos e buscam mais voluntários. “O tema tem despertado cada vez mais interesse na comunidade científica, mas a dificuldade é encontrá-los. São raros, por isso juntamos esforços com outros grupos, para ter uma casuística maior”, explica Nitrini.
Segundo Studart Neto, os primeiros testes realizados pelos grupos para identificar superidosos são os neuropsicológicos, capazes de mostrar o desempenho desses pacientes em várias funções cerebrais. “O principal teste que se usa é o RAVLT (teste de aprendizagem auditivo-verbal de Rey, na sigla em inglês), que avalia a memória tardia espontânea. A pessoa é exposta a 15 palavras por cinco vezes; em seguida entra em contato com outras palavras e, após 30 minutos, tem de repetir as 15 palavras iniciais”, detalha.
Com a perda da capacidade de memorização, natural ao envelhecimento, o esperado para a faixa dos 80 anos é que os participantes recordem de sete a oito palavras, mas, entre os superidosos, a média de memorização é de mais de dez palavras – desempenho compatível com o de alguém de 50 a 60 anos.
“Fui para o Hospital das Clínicas como voluntário, na verdade, para um estudo para medir o risco de Alzheimer, mas fiz os testes de memória e fui tão bem que acabei sendo incluído nesse outro estudo”, brica Lemos, um dos participantes da pesquisa da USP.
Na PUC-RS, primeira a iniciar os estudos com superidosos, em 2015, já há dez com alto desempenho cognitivo estudados. A experiência do grupo, liderado pelo neurocientista Jaderson Costa da Costa, diretor do Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul, os levou a mudar concepções. “O conceito de super-agers (em inglês) foi criado nos Estados Unidos. Por isso, em consenso com os professores Nitrini e Paulo Caramelli (UFMG), adaptamos a definição para o cenário brasileiro, considerando superidosos os maiores de 75 anos com desempenho cognitivo de pessoas mais jovens”, diz Wyllians Vendramini Borelli, da PUC-RS.
Ele embarcou neste mês para Nova York para realizar parte de seu doutorado no Instituto de Pesquisa em Psiquiatria Nathan Kline, onde irá aprender a usar técnicas de big data para analisar imagens dos cérebros dos superidosos.
Com as investigações no País e no exterior, já há algumas pistas sobre as características dos idosos de alto desempenho. Algumas áreas do cérebro relacionadas a memória e motivação, por exemplo, são mais desenvolvidas ou ativas nos superidosos. Na parte comportamental, eles são, na maioria, ativos, otimistas e sociáveis.
“Entre os nossos voluntários, todos demonstravam boa capacidade de criar laços, gostavam de viajar, tinham uma vida mais saudável”, diz Costa.
“Nos estudos de prevenção de demência, já sabemos que há fatores genéticos imexíveis, mas que fatores ambientais como maior nível de escolaridade, atividade física e controle de doenças vasculares impedem que a doença tenha manifestação clínica ou adiam seu aparecimento, por isso que estudamos que tipos de estimulação cognitivas podem melhorar o processo de envelhecimento”, completa Caramelli, professor da UFMG que coordena o grupo de estudos na universidade.
Quem tem mais de 80 anos e acredita ter uma boa memória ou conhece alguém com esse perfil que possa ser voluntário da pesquisa, pode entrar em contato com o grupo da USP que estuda o tema pelo e-mail ceredic@uol.com.br.