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Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues Consciência negra: ecos do berço da humanidade

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Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editoriais de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

A ciência, com sua lanterna precisa, ilumina o passado e confirma aquilo que os antigos já intuíram ao olhar para o horizonte africano: foi ali que a humanidade abriu os olhos pela primeira vez. Há mais de 200 mil anos, antes de haver mapas, bandeiras ou fronteiras, éramos todos viajantes da mesma origem, filhos da mesma poeira ancestral — brancos, negros, amarelos e indígenas brotaram da mesma raiz.

Séculos mais tarde, quando José Bonifácio refletia sobre o Brasil de 1822, o cenário era outro. A população dividia-se, aproximadamente, em três partes: brancos recém-chegados de um mundo europeu ainda em ebulição, negros trazidos à força das terras africanas, arrancados do seu tempo e de suas histórias, e indígenas subjugados, sobreviventes de um processo violento de conquista. Bonifácio, com sua visão muito à frente da época, falava da miscigenação como caminho possível, reconhecendo que o Brasil nascia da mistura de dores, esperanças e culturas.

Duzentos anos depois, somos um país que carrega no rosto da população a paleta completa dessa travessia. Temos pouco mais de 40% de brancos, cerca de 10% de negros autodeclarados, menos de 1% de indígenas — não por ausência originária, mas porque foram dizimados ao longo de séculos — e uma imensa maioria de brasileiros miscigenados, fruto de encontros e desencontros da história.

Somos, como dizia o próprio Bonifácio, um povo feito de muitas cores, muitas línguas e muitos caminhos.

Ainda assim, mesmo diante da violência que marcou milhares de trajetórias, o povo negro permaneceu — resistente, luminoso, fértil. Como as árvores que brotam entre pedras, cresceu onde se tentou impedir que houvesse vida.

Enquanto os povos indígenas sofreram massacres e expulsões, e ainda hoje lutam pela sua sobrevivência territorial e cultural, a população negra reergueu-se, reformou memórias, reescreveu destinos, ergueu pontes e ocupou espaços antes inimagináveis.

Não é preciso ir longe para ver essa força.

No esporte, brilham estrelas que mudaram o mundo: Pelé, que fez do futebol poesia; Michael Jordan, que reinventou o voo; Serena Williams, grandiosa como tempestade e firme como rocha; Usain Bolt, raio vivo; Muhammad Ali, cuja luta ia além do ringue; Tiger Woods, que abriu estradas no golfe; Lewis Hamilton, piloto de coragem e consciência; Marta, que fez do Brasil um país

de rainhas do futebol; Daiane dos Santos e Rebeca Andrade, ginastas que desafiaram a gravidade; João do Pulo, que fez do salto um gesto de grandeza.

Na ciência, nomes como Neil deGrasse Tyson, Katherine Johnson, Charles Drew e Luiz Gama mostram que o intelecto humano não conhece correntes.

Na política e na luta social, brilham Mandela, Obama, Martin Luther King Jr., Sankara, Zumbi, Dandara e Machado de Assis, cada qual com sua chama.

Nas artes e letras, ecoam Beyoncé, Bob Marley, Chimamanda Adichie, Elza Soares, Cartola, Pixinguinha, Grande Otelo, Gilberto Gil.

E nas trilhas da espiritualidade, caminham Desmond Tutu, Mãe Stella de Oxóssi e o antigo Papa Gelásio I, lembrando que fé e humanidade não conhecem cor.

É nesse cenário que se insere o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro. A data não nasceu de decretos imperiais, mas da mobilização de quem se recusou a deixar a história silenciar suas vozes. Foi o Movimento Negro Unificado, na década de 1970, que transformou esse dia em marco de memória e reparação.

A escolha homenageia Zumbi dos Palmares, morto há 330 anos, símbolo vivo de resistência.

Se o 13 de maio marcou a assinatura tardia da Lei Áurea, o 20 de novembro marca a luta ativa, a dignidade, a autonomia e o protagonismo de um povo que nunca desistiu de si.

O Brasil foi o país que mais tempo manteve o regime escravocrata nas Américas — e não há como olhar para isso sem estremecer.

O feriado da Consciência Negra é uma oportunidade para lembrar o que a humanidade foi capaz de fazer contra a própria humanidade, mas também o que o espírito humano é capaz de reconstruir.

E, aqui no Rio Grande do Sul, ecoa a memória dos Lanceiros Negros, traídos e sacrificados na Revolução Farroupilha.

Pergunta-se: o que fazemos hoje para honrar sua coragem?

(Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues, advogado e escritor – castilhosadv@gmail.com – @castilhosadv)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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