Sábado, 15 de novembro de 2025
Por Alexandre Teixeira de Castilhos Rodrigues | 15 de novembro de 2025
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editoriais de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Há datas que não cabem apenas no calendário — ecoam como sinos na memória coletiva. O Dia da República é uma delas. Nesse 15 de novembro, parece que o Brasil abre as janelas da história, permitindo que o vento do passado atravesse o presente para nos lembrar por que escolhemos ser uma República. É como se o país, feito casa antiga, precisasse sempre sacudir a poeira dos cantos para não esquecer onde estão seus alicerces.
República vem do latim res publica: “a coisa pública”, aquilo que pertence a todos, que deve ser administrado por todos e para todos — e não para um monarca ou um grupo restrito. A República, quando funciona, é como uma praça pública: aberta, viva, iluminada, onde cada cidadão tem o direito de ocupar seu espaço. Quando não funciona, deixa de ser praça e vira curral.
A ideia republicana não nasceu aqui. Em 509 a.C., os romanos expulsaram a monarquia etrusca e construíram um sistema onde o poder não pertencia a um rei, mas ao populus romanus. Senado, magistraturas eletivas e assembleias populares eram engrenagens de um modelo que buscava o equilíbrio e a virtude cívica. Séculos depois, no Renascimento e no Iluminismo, pensadores como Maquiavel, Rousseau e Montesquieu sopraram novas luzes sobre esses princípios.
Montesquieu, em O Espírito das Leis (1748), ergueu a arquitetura que sustenta as democracias modernas: a separação entre Legislativo, Executivo e Judiciário.
O poder freia o próprio poder, como três cavalos que puxam a mesma carruagem, evitando que um único animal dispare desgovernado. A pergunta que fazemos hoje — e ela é urgente — é simples: no Brasil, esses cavalos ainda puxam juntos?
As revoluções americana (1776) e francesa (1789) consolidaram o modelo republicano que inspirou o mundo. E foi sob esses ventos que, em 15 de novembro de 1889, o maçom Marechal Deodoro da Fonseca pôs fim ao reinado de Dom Pedro II e inaugurou nossa própria República, com a Constituição de 1891.
Foi, também, o ato simbólico que encerrou séculos de exploração da Coroa Portuguesa, que sugou nossas riquezas, metais, produtos e até nossa autonomia.
Foi a ruptura necessária para que deixássemos de ser colônia — um gesto que merece ser lembrado com respeito e gratidão histórica.
Mas República e Monarquia não são inimigas. Ambas podem funcionar — ou fracassar. Basta olhar para a Espanha, cuja Constituição de 1978 instituiu uma Monarquia Parlamentar moderna, em que o rei é símbolo de unidade, mas não governa. O governo cabe ao primeiro-ministro; o legislativo às Cortes Gerais; e o Judiciário atua com independência. O rei sanciona leis, convoca eleições, representa o país e se mantém limitado pela própria Constituição. É tradição convivendo com modernidade — a prova de que o problema nunca é a “forma”, mas como o poder é exercido.
A comparação que devemos fazer não é entre coroa e república, mas entre instituições sólidas e instituições frágeis. É aqui que surge o fantasma das chamadas “repúblicas de bananas” — Honduras, Guatemala, Nicarágua, entre outras — marcadas por instabilidade política, corrupção, ingerência estrangeira e estruturas estatais que oscilam como barcos pequenos em mar revolto.
E nós? O Brasil, gigante por natureza, já se viu muitas vezes tentado por atalhos, por interesses de grupos, por poderes que esquecem o povo e por leis que ignoram a realidade social. Quando a divisão entre os Poderes perde o equilíbrio, quando a República vira palco de disputas pessoais, o risco de degradação é real.
Expulsamos a monarquia portuguesa, mas será que expulsamos a lógica colonial que desvia nossas riquezas? A pergunta é dura, mas necessária: as riquezas do nosso povo estão sendo bem empregadas em nossa República?
Celebrar o Dia da República não é apenas recordar a ruptura de 1889, mas avaliar o quanto estamos honrando — ou traindo — aquele ideal. República não se sustenta sozinha: exige virtude, cidadania, responsabilidade e instituições que funcionem com impessoalidade e respeito ao povo. Sem isso, não é República — é fachada.
O futuro do Brasil não depende de coroas ou de brasões, mas da coragem de manter viva a “coisa pública”. Republicanos seremos enquanto cuidarmos da praça comum e impedirmos que ela seja tomada por cercas, feudos ou donos.
A República é nossa. E só continuará sendo se nós a defendermos.

(Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues, advogado e escritor – castilhosadv@gmail.com – @castilhosadv)
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