Sábado, 31 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 25 de dezembro de 2020
É falso que os voluntários que passaram por testes de uma vacina contra o coronavírus na Austrália tenham contraído HIV, como afirma um homem em um vídeo compartilhado em um canal no YouTube. Alguns dos voluntários que participaram da fase 1 de testes da vacina produzida em parceria entre a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland registraram falso-positivos para HIV, mas isso não significa que eles foram infectados com a doença.
Segundo os desenvolvedores, a presença de anticorpos para HIV já era esperada e os voluntários estavam cientes disso, uma vez que uma proteína presente no vírus causador da aids foi utilizada na produção da vacina contra o coronavírus. Em alguns voluntários, a quantidade de anticorpos foi maior do que a esperada, o que interferiu nos exames. Nenhum dos voluntários, no entanto, foi contaminado com o HIV.
Também não é verdade que o resultado tenha acometido todas as pessoas que tomaram a vacina no país, como afirma o homem. Após falso-positivos em alguns dos 216 voluntários que receberam a vacina australiana, os testes foram suspensos a fim de evitar que uma eventual aplicação em massa gerasse problemas de ansiedade por conta do temor por uma contaminação por HIV.
Alguns dos 216 pacientes que participaram da fase 1 de testes para a vacina desenvolvida numa parceria entre a empresa de biotecnologia CSL e a Universidade de Queensland, na Austrália, apresentaram resultados falso-positivos para HIV. Os resultados foram comunicados no dia 11 de dezembro pelos desenvolvedores do imunizante, que afirmaram que “não há possibilidade de a vacina causar infecção e os testes de acompanhamento de rotina confirmaram que não há presença do vírus HIV”.
Apesar disso, os testes com o imunizante foram, de fato, suspensos diante do temor de que uma eventual aplicação da vacina causasse problemas de ansiedade e receio de contaminação pelo HIV. O primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, informou que 51 milhões de doses seriam compradas do consórcio, mas que agora elas serão divididas entre a AstraZeneca e Novavax, que também desenvolvem vacinas contra o SARS-CoV-2.
O homem que aparece no vídeo verificado mostra imagens de reportagens sobre os falso-positivos para HIV na Austrália — na tela aparecem textos publicados pelo CanalTech e pela revista Exame— e usa o argumento de que, pelo fato de o assunto ter sido noticiado pela grande mídia, mais gente irá acreditar nele. No entanto, nenhuma das matérias utilizadas por ele como fonte fala em casos positivos para HIV — como ele afirma —, e sim em falso-positivos. As publicações também não falam que os resultados acometeram todas as pessoas que tomaram a vacina em teste, diferente do que diz o título do vídeo postado.
Proteína do vírus HIV
Na nota divulgada no dia 11 de dezembro, os desenvolvedores do imunizante australiano explicam os falso-positivos para HIV: “Os dados da fase 1 também mostraram a geração de anticorpos direcionados a fragmentos de uma proteína (gp41), componente utilizado para estabilizar a vacina. Os participantes do ensaio foram totalmente informados da possibilidade de uma resposta imunológica parcial a este componente, mas foi inesperado que os níveis induzidos interferissem com alguns testes de HIV”.
Ou seja, os cientistas já esperam que a proteína, presente no vírus HIV e utilizada no desenvolvimento do imunizante, fizesse com que o sistema imunológico criasse anticorpos para combater o vírus, mesmo ele não existindo. O que eles não esperavam eram níveis tão elevados de anticorpos que gerassem interferência em exames de HIV.
A professora Sarah Palmer, especialista em estudos do HIV/Aids do Instituto Westmead de Pesquisas Médicas, explicou para afiliada australiana da rede de TV SkyNews que o problema foi causado porque os cientistas da Universidade de Queensland usaram um segmento do vírus HIV como molécula “clamp”, ou seja, para estabilizar a proteína do coronavírus na vacina experimental e torná-la um alvo “atraente” para o sistema imunológico do ser humano.
A tecnologia é considerada inovadora pela professora Palmer, mas não deu certo: o sistema imunológico dos voluntários realmente gerou uma boa resposta ao coronavírus, que provoca a covid-19, mas também ao próprio HIV, fazendo com que os testes de HIV nos voluntários desse positivo para Aids.
Os testes, então, foram suspensos. Para os desenvolvedores, se ela fosse amplamente aplicada na população, poderia causar um problema na saúde pública do país pelo alto índice de resultados falso-positivos para HIV.
A Austrália descartou o uso desse imunizante, que já estava na fase 3 dos testes. A Universidade de Queensland deverá reiniciar a pesquisa e a vacina poderá vir a ser usada “no futuro”. O próprio Instituto Westmead está desenvolvendo uma vacina para a covid-19 a ser usada especificamente em idosos.