Segunda-feira, 06 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 19 de junho de 2022
Macron, de 44 anos, tornou-se em abril o primeiro presidente francês em duas décadas a conseguir um segundo mandato.
Foto: DivulgaçãoO segundo turno das eleições parlamentares francesas desse domingo (19) provou-se catastrófico para o recém-reeleito presidente Emmanuel Macron, que perderá a maioria absoluta na Assembleia Nacional. A aliança de esquerda Nova União Popular Ecológica e Social (Nupes) será a segunda força política no país, mas a grande surpresa veio da extrema direita. O grupo teve não só seu melhor desempenho histórico, mas seus deputados pularam de oito para 89 cadeiras parlamentares.
A coalizão de centro-direita Juntos, de Macron, fez 246 cadeiras, bem menos que as 289 necessárias para manter a maioria absoluta com que governou pelos últimos cinco anos e forçando-o a negociar com a oposição para implementar sua agenda. Apenas a República em Marcha, partido de Macron e principal sigla da coalizão, havia conquistado 313 cadeiras em 2017.
“A situação nesta noite é inédita (…) e representa um risco para o nosso país diante dos riscos em escala nacional e internacional”, disse a recém-nomeada primeira-ministra de Macron, Elisabeth Borne, após uma reunião de três horas com o presidente. “A partir de amanhã [segunda, 20], trabalharemos para construir uma maioria de ação.”
A Nupes, liderada por Jean-Luc Melénchon, do partido França Insubmissa, elegeu 142 deputados, representando as principais forças de esquerda do país, que se uniram após a eleição presidencial de abril. O resultado, segundo o político da esquerda radical, significa uma “derrota total” de Macron:
“Minha mensagem nesta noite é de luta”, disse ele, que não se candidatou para deputado e que, portanto, não terá uma cadeira na nova Assembleia. “Nem por um momento sequer vamos desistir de governar este país (…). Seremos uma oposição firme, mas com respeito às instituições.”
Confirmando o que especialistas têm chamado de “tripolarização” da política francesa, a ultradireitista Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen, que disputou o segundo turno da eleição presidencial de abril com Macron, surge como a terceira força. Os 89 assentos darão à extrema direita a capacidade de formar uma bancada parlamentar pela primeira vez vez em 36 anos — o resultado é também mais que o dobro do recorde anterior de 35 deputados, na eleição de 1986.
“Apesar de uma votação injusta e inadequada, o povo decidiu enviar um grupo parlamentar muito poderoso à Assembleia, que se torna um pouco mais nacional”, disse Le Pen a apoiadores, referindo-se ao sistema eleitoral distrital em dois turnos no pleito legislativo, que costumava desfavorecer a direita radical.
“Conseguimos nossos três objetivos: transformar Emmanuel Macron em um presidente minoritário, continuar com a necessária reorganização política, e constituir um grupo de oposição decisivo contra os destruidores que vem de cima, os macronistas, e de baixo, a extrema esquerda.”
No modelo francês, um partido ou coalizão que tiver mais de 15 deputados pode formar um “grupo parlamentar”. Agora, a sigla reinventada por Le Pen nos últimos anos terá mais tempo de fala e mais poderes no plenário, como o de convocar um recesso e apresentar moções de censura. Terá também maior acesso a dinheiro público, ponto importante para uma legenda que acumula mais de € 20 milhões (R$ 107 milhões) em dívidas.
O “tsunami azul” foi, segundo o atual presidente da RN, Jordan Bardella, uma “conquista histórica” — ascensão que coincide com o que tem sido chamado de “colapso da direita republicana”, com maior aceitação de discursos contra os imigrantes e a União Europeia. A direita tradicional, com Os Republicanos e a União dos Democratas e Independentes (UDI), conquistou 64 assentos, 55 a menos do que têm atualmente.
O Republicanos, partido do ex-presidente Nicolas Sarkozy, perdeu o posto de maior grupo de oposição, sendo renegado à posição de quarta força política. O desempenho, ainda assim, é melhor do que as pesquisas indicavam na última semana e evita uma repetição do desastroso pleito presidencial, do qual a candidata os Republicanos, Valérie Pécresse, saiu com 4,8% dos votos.
As eleições legislativas deste domingo confirmaram também a tendência de baixa participação, em especial nas eleições legislativas: cerca de 54% dos franceses optaram por não votar.
A abstenção é menor do que a de 57,36% registrada nas legislativas de 2017, mas superior à registrada no primeiro turno deste ano, confirmando previsões. Na semana passada, 52,51% dos franceses aptos não foram às urnas, um recorde para a etapa inicial do pleito durante a V República, em vigor desde 1958.
O Parlamento fragmentado resultante do pleito, chamado informalmente de “terceiro turno” das eleições da França, fará com que Macron seja o primeiro presidente francês em 20 anos a não governar com uma maioria absoluta na Assembleia Nacional. Agora, ele não poderá mais depender exclusivamente do bloco formado pelo seu República em Marcha (que será renomeado Renascimento após o pleito legislativo) e pelos partidos de centro-direita Agir, Horizons e MoDem.
O presidente francês precisa da Assembleia Nacional para cumprir seus objetivos de política interna, aprovar gastos e fazer alterações na Constituição. Uma das pautas prioritárias de Macron é sua há muito prometida reforma de Previdência, com o aumento da idade mínima da aposentadora, de 62 para 65 anos. Para aprová-la, precisará forjar coalizões ou alianças temporárias.
A tendência é que o governo faça acenos para a sigla de Pécresse, buscando acordos com a direita tradicional. E, mesmo assim, as bancadas de ambos os blocos juntos não lhe darão uma margem folgada.
Se o resultado permite a Macron manter o controle de setores estratégicos como defesa e política externa, que no modelo semi-presidencialista francês são prerrogativas da Presidência, ele terá problemas em outras áreas. Macron já havia anunciado que integrantes de seu Gabinete que não fossem reeleitos precisariam ser substituídos.