Segunda-feira, 30 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 29 de junho de 2025
O programa nuclear do Irã está no centro das tensões geopolíticas há mais de duas décadas. Desde 2003, quando a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) revelou que Teerã desenvolvia secretamente atividades nucleares por 18 anos, a questão se tornou um dos principais desafios diplomáticos internacionais.
A descoberta envolvia usinas de grande porte e alto nível de sofisticação, em desacordo com o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, do qual o Irã é signatário. A revelação levou a uma série de sanções e condenações, com apoio de potências ocidentais, da Rússia e da China.
Embora o governo iraniano tenha alegado que o programa tinha fins pacíficos, os Estados Unidos viram nas evidências a confirmação de suspeitas antigas: que Teerã buscava desenvolver armas nucleares. O temor era de que um Irã nuclear pudesse desestabilizar o Oriente Médio e estimular uma corrida armamentista na região.
Desde então, o programa nuclear iraniano atravessou sucessivos governos americanos — de George W. Bush a Joe Biden — com abordagens distintas, mas com um objetivo comum: impedir que o Irã obtenha a bomba atômica.
Bush classificou o Irã como parte do “eixo do mal” e pressionou por sanções. Barack Obama optou por negociar e, em 2015, firmou o Acordo Nuclear (JCPOA), que limitava o programa iraniano em troca da suspensão de sanções econômicas.
Donald Trump, em seu primeiro mandato, rompeu com o acordo em 2018 e impôs novas sanções. Em resposta, o Irã passou a enriquecer urânio a níveis muito acima do permitido pelo pacto — chegando a 60%, próximo dos 90% necessários para a fabricação de uma arma nuclear.
A tentativa de Joe Biden de reativar o acordo fracassou. Em 2025, agora em seu segundo mandato, Trump adotou uma postura ainda mais agressiva. Em junho, os Estados Unidos se juntaram à ofensiva militar de Israel contra instalações nucleares iranianas, com o objetivo de torná-las inoperantes.
Mas a história desse impasse começou décadas antes — e, paradoxalmente, com o apoio dos próprios EUA.
‘Átomos para a Paz’
Em 1953, o então presidente americano Dwight Eisenhower discursou na Assembleia Geral da ONU propondo uma nova abordagem para a energia nuclear: usá-la em benefício da humanidade. A proposta deu origem ao programa “Átomos para a Paz”, que previa a transferência de tecnologia e conhecimento para países aliados, com fins civis.
Menos de um ano depois, os EUA alteraram sua legislação para permitir a exportação de tecnologia nuclear sob certas condições, e iniciaram a construção de reatores e o envio de material físsil a países do chamado “mundo livre”.
O Irã foi um dos beneficiados. Em 1957, os EUA assinaram um acordo de cooperação nuclear com o governo do Xá Mohammad Reza Pahlavi. Na década de 1960, Teerã recebeu um reator de pesquisa de 5 megawatts e urânio altamente enriquecido para operá-lo.
Em 1970, o Irã ratificou o Tratado de Não Proliferação, comprometendo-se a não desenvolver armas nucleares. Pouco depois, em 1974, o Xá anunciou um ambicioso plano para construir 23 usinas nucleares em 20 anos, além de desenvolver o ciclo completo de combustível nuclear.
A falta de especialistas era um obstáculo, e os EUA ajudaram a superá-lo. O Irã firmou um acordo com o MIT para treinar engenheiros nucleares, financiando com cerca de US$ 1,3 milhão (equivalente a cerca de US$ 8,5 milhões atuais) um programa de mestrado para estudantes iranianos.
Da cooperação à ruptura
A Revolução Islâmica de 1979 mudou tudo. O novo regime, liderado pelo aiatolá Ruhollah Khomeini, rompeu com os Estados Unidos e inicialmente abandonou os projetos nucleares do Xá. Muitos dos especialistas treinados no exterior deixaram o país.
Com o tempo, no entanto, o governo revolucionário reconheceu o valor estratégico da energia atômica e buscou recuperar o conhecimento técnico perdido. A Universidade de Tecnologia de Aryamehr, moldada nos padrões do MIT, tornou-se centro da resistência estudantil e símbolo da virada política.
“O que começou como um esforço educacional e técnico para fortalecer uma aliança virou, ironicamente, uma ferramenta nas mãos dos adversários dos EUA”, escrevem os historiadores Stuart W. Leslie e Robert Kargon.
A partir dos anos 1980, o Irã retomou o desenvolvimento de seu programa nuclear — agora sob sigilo e com foco na autossuficiência. O que nasceu como símbolo de cooperação durante a Guerra Fria tornou-se, décadas depois, uma das maiores ameaças à estabilidade global.