Terça-feira, 12 de agosto de 2025
Por Redação O Sul | 5 de agosto de 2025
A atuação de Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro foi decisiva para o agravamento da situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro, que agora cumpre prisão domiciliar. Criminalistas ouvidos pelo Estadão avaliam que, ao incluir os filhos de forma expressa como parte de uma estratégia para burlar decisões judiciais, a nova decisão do ministro Alexandre de Moraes marca um ponto de inflexão no tratamento jurídico dado à família e abre caminho para que o trio passe a ser formalmente investigado e corra risco de responsabilização penal.
O estopim da nova decisão foi a participação de Bolsonaro, por telefone, na manifestação realizada no último domingo, 3, em Copacabana, contra o STF e em defesa da anistia. A ligação foi feita por seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, divulgada nas redes sociais e posteriormente apagada. Carlos Bolsonaro, por sua vez, veiculou uma imagem do pai e convocou seguidores a se mobilizarem contra o Supremo.
Mas, para Moraes, o episódio não foi isolado. Na avaliação do ministro, trata-se da continuidade de uma estratégia articulada dos três filhos do ex-presidente para influenciar o julgamento da ação penal sobre o golpe, previsto para setembro e no qual Bolsonaro é réu.
Para o criminalista e coordenador do curso de Direito da ESPM-SP, Marcelo Crespo, a medida de Moraes não se baseou em um único fato, mas foi o desfecho de uma escalada coordenada entre o ex-presidente e seus filhos. Ele destaca que, ao citar expressamente a atuação de Flávio e Carlos como parte do descumprimento das cautelares, Moraes deixa de tratá-los como coadjuvantes políticos e passa a enquadrá-los como participantes ativos de uma tentativa de obstrução da Justiça.
“Esse reposicionamento narrativo e jurídico prepara o terreno para eventual responsabilização penal dos três filhos, ocorre pela primeira vez. Isso começou lá atrás, com Eduardo Bolsonaro”, afirma.
O primeiro movimento citado por Crespo remonta à articulação de Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos. Em reuniões com autoridades americanas, o deputado defendeu sanções contra Moraes. A Corte interpretou a iniciativa como uma tentativa de interferência externa coordenada com o pai e, a partir dali, Moraes instaurou inquérito contra os dois e impôs as primeiras medidas cautelares a Jair Bolsonaro, como o uso de tornozeleira eletrônica, a proibição de uso de redes sociais e, agora, a prisão domiciliar.
Na sequência, os Estados Unidos revogaram o visto de Moraes e impuseram sanções contra o ministro com base na Lei Magnitsky.
Esse histórico é considerado essencial para entender como a atuação dos filhos de Bolsonaro passou a ter repercussão jurídica direta, avalia o criminalista Renato Vieira, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). Para ele, o comportamento do trio contribuiu de forma decisiva para o agravamento da situação do ex-presidente. “Eles agiram para embaraçar as investigações — seja por meio das redes sociais, como Flávio e Carlos, seja por meio de articulação nos EUA, como Eduardo”, afirma.
Com a nova decisão, afirma, Flávio e Carlos também passam a correr o risco de serem responsabilizados pelos mesmos crimes que já levaram Eduardo à condição de investigado, como coação no curso do processo, obstrução de Justiça e tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito.
“Essa é a novidade para mim. Com essa decisão, Moraes sinaliza que já vê elementos para enquadrar os outros dois filhos nesses mesmos crimes, dentro do inquérito que antes mirava apenas o ex-presidente”, afirma Vieira. Ele acrescenta que a situação de Eduardo também se agrava, podendo levar à decretação de sua prisão preventiva, caso o STF entenda que há tentativa de coação ao curso do processo.
Na mesma linha, Crespo avalia que o reposicionamento adotado por Moraes abre caminho para responsabilização penal dos três filhos. Ele pontua que, se for demonstrado que as ações do grupo foram articuladas e com intenção deliberada de pressionar o Judiciário e interferir no andamento do processo do golpe, os filhos deixam de ser apenas apoiadores e passam a ser tratados como coautores.
“Se houver indícios de que os atos estavam inseridos em uma estratégia conjunta, voltada a desestabilizar o Supremo e manipular o processo penal, a responsabilização pode ocorrer com base na teoria do domínio do fato ou da coautoria funcional”, explica.
O criminalista Pierpaolo Bottini concorda e diz que, a partir de agora, o foco da investigação pode se ampliar. Ele pontua que a menção expressa à atuação dos filhos no descumprimento das cautelares sinaliza que Moraes não enxerga mais o núcleo familiar apenas como entorno político de Bolsonaro, mas como possível engrenagem ativa da tentativa de obstruir a Justiça.
“Se confirmada essa linha, Flávio, Carlos e Eduardo podem deixar de ser personagens periféricos e se tornar réus em ações penais ligadas ao golpe”, completa. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.