Sexta-feira, 02 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 22 de dezembro de 2018
Em seus últimos dias no cargo, Michel Temer tem repetido a quem o visita no terceiro andar do Palácio do Planalto: “A cadeira de presidente da República carrega uma sina”. Ele menciona como exemplos que Getúlio Vargas se suicidou, Jânio Quadros renunciou, Tancredo Neves morreu, José Sarney tornou-se impopular e Fernando Collor sofreu impeachment, assim como Dilma Rousseff, de quem o emedebista era o vice.
Os seus amigos mais próximos contam que ele nunca achou que seria fácil assumir o cargo, mas também não imaginava que seria tão difícil. “Certa vez, ao ser questionado sobre esse assunto, Temer disse que não sentirá falta de nada quando deixar o mandato”, relata um aliado.
E não é para menos. Em dois anos e meio, ele atingiu os piores índices de popularidade de um presidente desde a redemocratização, sofreu três denúncias por irregularidades apresentadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República), enfrentou uma greve de caminhoneiros que paralisou o país e teve amigos e assessores presos por acusações de corrupção.
Acusações
Sob críticas de “traidor” e “golpista”, em 2016 o então vice-presidente substituiu a titular Dilma Rousseff (PT) em um cenário de recessão econômica e instabilidade política. Enquanto defendia uma pacificação nacional, protestos pedindo “Fora, Temer!” se espalhavam pelas ruas do País.
Com pouco respaldo popular, ele tentou compensar a fragilidade política com a formação de uma base sólida de apoio no Congresso Nacional, arena em que construiu sua carreira pública. Para isso, entregou mais da metade dos ministérios para deputados e senadores, alguns sem afinidade com a pasta e com denúncias de irregularidades.
A fim de conseguir a fidelidade do “Centrão”, que ameaçaram impor derrotas legislativas, nomeou para cargos de segundo e terceiro escalões indicados por legendas como PSD, PR, PP e PTB. O aceno não garantiu apoio duradouro, tornando-o refém de suas reivindicações durante todo o mandato.
A estratégia de distribuição de cargos gerou efeitos colaterais. Em menos de duas semanas da posse, o então ministro Romero Jucá (Planejamento) deixou o cargo após a revelação de áudio em que ele sugeria uma espécie de pacto para barrar a Operação Lava-Jato.
No mesmo ano, mais cinco ministros saíram, entre eles Geddel Vieira Lima (Governo), amigo antigo e um dos homens de confiança do presidente. Em entrevista à imprensa, o então ministro Marcelo Calero (Cultura) o acusou de tê-lo pressionado a liberar a obra de um prédio, no qual Geddel tinha um apartamento.
A crise que mais impactou o presidente foi a divulgação de áudio de conversa com ele gravada pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS/Friboi. Como o presidente não tinha certeza sobre o que havia dito, chegou a ser aconselhado a renunciar para evitar uma crise institucional.
Não foi apenas a equipe de ministros que foi atingida por acusações. Temer se tornou o primeiro presidente a ser denunciado pela PGR durante o exercício do mandato por suspeita de corrupção. Para não ser afastado do posto, distribuiu cargos e emendas à base aliada.
O esforço obteve êxito: as duas acusações foram barradas pela Câmara dos Deputados. Mas o empenho comprometeu a pauta de votações. Sem fôlego para novas negociações com os deputados governistas, não conseguiu apoio suficiente para aprovar a reforma previdenciária.
Apesar do revés com a proposta, o presidente teve força para aprovar medidas que agradaram ao mercado financeiro e ao setor empresarial, que se tornaram os principais pilares de seu mandato. Ele conseguiu, por exemplo, implementar um teto de gastos públicos e realizar uma reforma trabalhista.
Com a política econômica como carro-chefe, melhorou os índices econômicos, reduzindo a inflação, os juros e o déficit. Para o ministro da Casa Civil, o presidente “teve competência para montar um time dos sonhos na área econômica”. A melhora nos indicadores, contudo, não foi suficiente para frear a queda na popularidade. Segundo o Datafolha, em junho deste ano, 82% dos brasileiros consideraram seu governo ruim ou péssimo.
A reprovação ganhou força com uma greve nacional de caminhoneiros. Na tentativa de evitar a piora no cenário, que evoluía para o caos social, Temer reduziu o preço do diesel. Como era considerado “radioativo”, o presidente se afastou da campanha eleitoral, mas não conseguiu evitar que aliados saíssem chamuscados.
Sem conseguir fazer seu sucessor, ele se preocupou com o que chamou de um resgate moral. “Não vou sair com essa pecha de um sujeito que incorreu em falcatruas. Não vou deixar isso”, disse no início do ano. Na última quinta-feira, porém, após uma nova denúncia ter sido apresentada contra ele, reconheceu que deixa o cargo com mágoa pelos ataques de natureza moral de que foi alvo: “Isso é a única coisa que me aborrece”.