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Por Redação O Sul | 28 de julho de 2019
Tomar uma injeção de um medicamento antirretroviral a cada dois meses é uma forma eficaz de impedir o contágio por HIV? Pesquisadores brasileiros investigam esta possibilidade com cientistas de outros seis países e esperam ter uma resposta em até dois anos.
O estudo realizado pela HIV Prevention Trials Network, uma organização internacional cientifica com sede nos Estados Unidos, avalia se esse tipo de PrEP (profilaxia pré-exposição) funciona tão bem quanto o outro método disponível atualmente.
Na chamada PrEP oral, a pessoa toma um comprimido com drogas antirretrovirais. Se o tratamento for feito corretamente, sua eficácia para prevenir a transmissão do vírus causador da Aids pode chegar a 99%. Então, porque seria necessária uma PrEP injetável se já existe outra versão com excelentes resultados?
“O paciente precisa ter organização para tomar um comprimido diário. Então, precisamos de alternativas para quem não consegue fazer uso crônico de uma medicação e está vulnerável ao HIV”, diz Beatriz Grinsztejn, chefe do laboratório de pesquisa clínica em DST e Aids do Fiocruz (Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas) e responsável pela direção global da pesquisa junto com o pesquisador Raphael Landovitz, da Universidade da Califórnia em Los Angeles.
Adesão ao tratamento com PrEP
A PrEP oral foi aprovada pela FDA (Food and Drugs Administration), a agência do governo americano equivalente à brasileira Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em 2012. Desde o fim de 2017, é oferecida no Brasil gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde) para grupos considerados mais vulneráveis ao HIV, como homens gays e bissexuais, mulheres transexuais, profissionais do sexo e pessoas em um relacionamento com alguém que tenha o vírus.
Este método é considerado uma revolução no combate ao HIV por oferecer uma forma inédita de prevenção com um medicamento e não só com preservativos. No entanto, pesquisas mostram que a taxa de adesão ao tratamento, ou seja, o índice de pessoas que o segue à risca, cai com o tempo, explica o infectologista Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos (NIAID, na sigla em inglês), que é o principal patrocinador do estudo da PrEP injetável.
“Isso varia bastante, mas a taxa chega a cair pela metade, porque as pessoas se cansam de tomar um comprimido diariamente ou se esquecem. E, se não é tomado todo dia, não funciona”, afirmou. Fauci. Grinsztejn diz que a baixa adesão é um problema especialmente entre os jovens, um grupo no qual o número de diagnósticos de HIV vem crescendo mais do que a média. Entre 2007 e 2018, houve um aumento de 220% entre brasileiros de 15 a 24 anos, de acordo com dados do governo federal, bem acima do aumento de 136% na população em geral.
No entanto, a cientista da Fiocruz afirma que isso não pode ser considerado preguiça ou desleixo dos jovens com uma doença que não tem cura. “Você diria isso de um diabético? Tradicionalmente, adolescentes e adultos jovens têm mais dificuldade com um tratamento contínuo para diabetes. Não é uma particularidade do HIV, é uma questão da faixa etária. E, se o vírus avança entre estas pessoas, é importante buscar novas formas de prevenção.”
Como é feito o estudo da PrEP injetável
Enquanto a PrEP oral usa uma combinação de duas drogas – fumarato de tenofovir desoproxila e emtricitabina –, a versão injetável é feita a partir de outra substância, cabotegravir. Ambos os medicamentos impedem a multiplicação do HIV ao se ligarem a enzimas essenciais ao processo de replicação do vírus, mas atuam em etapas diferentes do ciclo.
O comprimido deve ser tomado diariamente para garantir que seus princípios ativos estejam no corpo sempre em níveis adequados. Já o cabotegravir é injetado no músculo de uma das nádegas e fica depositado ali, sendo liberado gradualmente ao longo de dois meses, quando é preciso renovar a dose.
Iniciado no fim de 2016, o estudo HPTN 083 testará a PrEP injetável com 4,5 mil homens gays e bissexuais e mulheres trans, em 43 centros no Brasil, Estados Unidos, Argentina, Peru, África do Sul, Tailândia e Vietnã. Ao menos 500 brasileiros já participam – e o recrutamento de voluntários ainda está acontecendo.
Os pacientes são distribuídos por sorteio eletrônico entre dois grupos. O primeiro toma comprimidos placebo e a injeção de PrEP. O segundo toma comprimidos de PrEP e injeção placebo. Todos são aconselhados sobre sexo seguro e recebem preservativos ao longo da pesquisa. “No fim, vamos comparar o número de infecções por HIV entre os dois grupos para entender se a PrEP injetável funciona tão bem quanto a oral”, explicou Grinsztejn.