Quarta-feira, 30 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 29 de abril de 2025
Lula enfrenta hoje um ambiente bem distinto do que lidava em seus dois primeiros mandatos
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência BrasilO presidente Lula da Silva se reúne bem menos com deputados e senadores do que seus antecessores Jair Bolsonaro, Michel Temer e Dilma Rousseff.
É o que informou o Estadão com base num levantamento da organização não governamental Fiquem Sabendo, que comparou a agenda pública dos primeiros 28 meses do atual mandato com os demais.
O número de compromissos do petista com o Congresso no período não chega a 20% do patamar alcançado por Temer, Bolsonaro, e fica aquém até mesmo de Dilma, que teve apenas 17 meses de segundo mandato devido ao impeachment e era reconhecida pela ausência de atributos políticos e pela rarefeita capacidade de articulação com o Legislativo.
Em outros tempos, o modesto volume de encontros do presidente com deputados e senadores poderia até ser visto como sinal de virtude, como que a escapar do antes inevitável envolvimento direto na cobrança da fidelidade parlamentar e na operação do conhecido “toma lá, dá cá” – o método histórico com o qual governos liberavam emendas de aliados e parlamentares condicionavam o apoio e o voto a essa liberação.
Hoje, porém, observados tanto a agenda do presidente quanto o desempenho político do governo lulopetista, o distanciamento de Lula da Silva é uma evidência da malaise do atual mandato: um presidente mais autocentrado do que nunca, com nenhuma paciência para as rotinas do governo e com pouca disposição para receber parlamentares e negociar com eles. Lula não só se encontrou muito menos – foram apenas 96 compromissos presenciais, contra 502 de Bolsonaro e 498 de Temer –, como quase todos os encontros tiveram a presença de deputados e senadores do próprio PT.
É preciso reconhecer que Lula enfrenta hoje um ambiente bem distinto do que lidava em seus dois primeiros mandatos: o poder do Executivo sobre a agenda legislativa não faz sombra ao que havia no passado. O costumeiro trator governista no Congresso começou a ruir em 2015, quando iniciou a escalada, em valores e impositividade, das emendas parlamentares. Hoje as emendas parlamentares superam a soma dos recursos livres para investimentos de 30 dos 39 ministérios, o que fortalece o Congresso, esvazia o poder das pastas como moeda de troca política e altera a dinâmica das relações entre os dois Poderes.
A esse problema soma-se outro: a majoritária presença dos partidos de centro-direita e direita na Câmara e no Senado. Com a esquerda sem fôlego eleitoral, Lula precisou distribuir nove ministérios a partidos como União Brasil, PSD, MDB, PP e Republicanos, mas na prática governa como uma coalizão tradicional da esquerda, com PT e seus satélites.
Além disso, as legendas centristas têm número considerável de oposicionistas, tornando a maioria governista instável e, por vezes, hostil. Disso resultou um conjunto considerável de derrotas em 2023 e 2024: a despeito de alguns feitos, como a aprovação da reforma tributária, o governo tem desempenho pior que os antecessores quando avaliadas as votações das medidas provisórias – principal ferramenta legislativa do Executivo – e dos vetos presidenciais.
Todos esses fatores, somados, deveriam provocar mais, e não menos, disposição presidencial em dialogar e ceder espaços. Como se sabe, a indisposição de Lula se soma à histórica incapacidade petista de dividir o poder com aliados: o PT domina quase metade dos ministérios, embora, por exemplo, tenha apenas 13% das cadeiras da Câmara dos Deputados, além de concentrar as pastas cujos ministros dão expediente no Palácio do Planalto, como a Casa Civil, a Secretaria de Relações Institucionais e a Secretaria-Geral da Presidência.
Tanto líderes partidários quanto o próprio governo sugerem que Lula deve fazer menos política a distância e passar a receber deputados e senadores com mais frequência, graças a um suposto “ajuste de ponteiros” entre ele e os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Resta saber a que uso se prestará tal ajuste e, sobretudo, se o governo terá, nos meses que restam deste mandato, algo que faltou até aqui: uma agenda para o País.
(Opinião jornal O Estado de S. Paulo)