Domingo, 15 de setembro de 2024
Por Redação O Sul | 8 de agosto de 2024
A frase carece de autoria conhecida, mas é válida: “Faltam protagonistas repulsivos na literatura brasileira contemporânea”. Não é o caso do escritor, editor e jornalista porto-alegrense Flávio Ilha, que acaba de publicar mais um livro, “Senhor Cão” (Editora Aboio). Aí está um romance que destoa da maioria da prosa ficcional produzida hoje no País, ao proporcionar ao leitor um personagem tão condenável quanto dúbio, com suas diferentes “camadas”.
Marcando a estreia do autor na narrativa longa, após três livros em outros gêneros, o texto se constrói em torno do imaginário Pedro Póvoa. Trata-se de um homem com ares de superioridade e que se aproveita de sua condição masculina em uma sociedade machista e patriarcal para cometer atos repudiáveis pelo senso comum, mas que dão margem a interpretações distintas conforme o julgamento do leitor.
Cada vez mais pressionado socialmente por seu comportamento, ele lança mão de sua dupla naturalidade brasileira-lusitana e migra para Portugal, na esperança de que algum sossego em relação às suas condutas. Mas o país ibérico acaba por pegar de surpresa o personagem, que até então pensava estar a salvo de julgamentos.
“O tom de sonho nas descrições do passado, operando de modo limítrofe entre realidade e delírio, aproxima a literatura de Flávio Ilha à de João Gilberto Noll e seus personagens que alucinam e vivem nas bordas da convenção, muitas vezes ultrapassando-as”, compara Paula Sperb, colega de ofício de Flávio Ilha e autora da orelha do livro.
Com a palavra, o escritor: “‘Senhor Cão’ faz parte de um conjunto de narrativas que tem por objetivo elucidar a origem e as consequências do patriarcado na sociedade brasileira, com a devida advertência de que não se trata de um tratado sociológico e muito menos uma cartilha de boas maneiras”.
Ainda segundo Flávio, “o protagonista pode ser encontrado em qualquer esquina e, muitas vezes, esconde-se sob uma roupagem humanista e cidadã, ao mesmo tempo em que, no trato cotidiano, quase sempre deixa escapar seus traços de crueldade e violência contra quem ele julga inferior”.
Sobre o autor
Flávio Ilha, 63 anos, atuou como jornalista em veículos como “Zero Hora”, “Correio do Povo”, “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Valor Econômico”, “Correio Braziliense” e revista cultural “Aplauso”, da qual foi também editor-chefe.
Já a carreira literária abrange os seguintes títulos: “Longe Daqui, Aqui Mesmo” (2018), “Ralé” (2019) e “João Aos Pedaços”, biografia do escritor gaúcho João Gilberto Noll (2021) – esses dois últimos foram finalistas do prêmio Açorianos da Secretaria da Cultura de Porto Alegre em 2020 e 2022. E, agora, “Senhor Cão”.
Em janeiro, ele (que também comanda a editora Diadorim) acrescentou à sua trajetória profissional uma experiência até então inédita para ele: a de dono de livraria, a Clareira.
A loja está localizada na rua Henrique Dias nº 111 (bairro Bom Fim), tem sido um ponto de encontro de amigos e colegas, além, é claro, dos apreciadores da literatura gaúcha, nacional e estrangeira. “Senhor Cão” pode ser adquirido no próprio estabelecimento ou no site da editora. O endereço virtual é aboio.com.br
(Marcello Campos)