Quinta-feira, 18 de setembro de 2025
Por Redação O Sul | 22 de março de 2020
Passaram-se 44 dias desde o primeiro doente até que o governo francês anunciasse uma restrição: em 9 de março, proibiu eventos com mais de mil pessoas. Naquele dia, a vizinha Itália, país mais atingido pela epidemia na Europa, entrava em quarentena total.
Os italianos ainda estavam longe de registrar o maior número de mortos do mundo (o que aconteceu dez dias depois), mas o país proibiu viagens e mandou fechar lojas, restaurantes e escolas.
Dois dias depois, Polônia e Grécia, ainda sem nenhuma morte, suspenderam aulas, e a medida se alastrou no dia 12 por Turquia, Lituânia, Moldávia, Macedônia, Malta, Irlanda, Portugal, Bélgica, Áustria e França (então a única desses dez países com mortes na casa das dezenas).
Só quatro dias depois, com cerca de 500 mortes, a Espanha, sempre entre os mais afetados, parou o ensino; o Reino Unido, com quase 200 mortos, suspendeu aulas na segunda (20), e a Suécia encerrou a semana como o único país europeu a não obrigar suas escolas a parar, embora tenha recomendado a medida. No país nórdico, as mortes eram 11 na sexta, mais que o dobro das 5 registradas na Polônia, um dos primeiros a parar.
A mesma discrepância entre evolução da doença e reação do governo acontece em relação a bares, restaurantes, fechamento de fronteiras, proibição de voos ou restrição a passeios. E há pelo menos nove motivos para isso.
1) A capacidade de atendimento
Trata-se de calcular quantas pessoas podem desenvolver casos graves da doença, para descobrir se os hospitais do país estão preparados para atendê-los. Os dois fatores (doentes em estado crítico e infraestrutura de saúde) variam de país para país.
2) O risco da população
O potencial de doentes graves depende de vários itens. A composição demográfica é fundamental, já que maiores de 70 anos são mais suscetíveis. Com 16,7% da população nessa faixa etária, a Polônia pode ter mais motivos para se preocupar que a Irlanda, com 9,8%.
3) O comportamento do vírus
Entra aqui em cena a principal lacuna para quem tenta tomar uma decisão de combate a essa epidemia: como a doença é nova, não há dados precisos sobre a porcentagem dos que revelam sintomas, a probabilidade de transmissão, o risco de um doente evoluir para um quadro grave, a possibilidade de cura nesses casos e a parcela dos que já ficaram imunes.
4) A pressão dos fatos
Para o professor de Harvard Marc Lipstich, porém, não são necessários números exatos para chegar à “deprimente conclusão de que há apenas duas opções: isolamento social prolongado ou sobrecarga do sistema de saúde”.
5) O momento certo
Ainda que com dados imperfeitos e premissas questionáveis, cientistas que calcularam a evolução da pandemia e seus riscos defendem que o momento de apertar as restrições precisa ser bem dosado.
6) A questão das escolas
Fechar ou não escolas depende também da estratégia de combate ao coronavírus, afirma Ferguson em seu estudo. Nem todos os países têm estrutura para fiscalizar e garantir a adesão a uma quarentena total e podem ter que optar por medidas de mitigação.
7) A adesão voluntária
O grau de aperto imposto pelos governos depende também da resposta da população, como mostrou o caso da França. No dia 9 de março, o governo proibiu eventos com mais de mil pessoas, mas defendeu a manutenção das aulas. Três dias depois, fechou as escolas, mas manteve abertos restaurantes e bares. Durou dois dias, e eles foram fechados, com a recomendação do governo para que os franceses evitassem sair de casa.
8) O cálculo econômico
Trancar as pessoas em casa pode ajudar a reduzir a pressão sobre os hospitais no curto prazo, mas deixa sequelas profundas no longo prazo, não só na economia como na própria saúde, também
afetada pela recessão.
9) Os limites legais
Por fim, nem sempre basta a um chefe de governo conhecer os recursos do sistema de saúde, estimar os riscos da doença, escolher uma estratégia de ação, calcular custo-benefício e decidir o melhor momento de impor restrições.