Quarta-feira, 01 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 31 de outubro de 2020
Pesquisa do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) em parceria com o Datafolha revela que o consumo de alimentos ultraprocessados quase dobrou durante a pandemia na faixa etária de 45 a 55 anos em todo o país, justo aquela com o maior percentual de sobrepeso e obesidade.
No ano passado, o consumo desse tipo de alimento representava 9% da dieta dos entrevistados e no levantamento feito em junho de 2020 saltou para 16%. Os ultraprocessados são apontados por especialistas como os principais responsáveis pelo aumento da obesidade, fator de risco para a Covid-19.
Também houve aumento entre jovens de 18 a 24 anos, de 29,6% para 31,3% da dieta total. Nas outras faixas, intermediárias, as oscilações não foram significativas. Segundo a última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), divulgada na semana passada, 70% dos brasileiros com idade entre 40 e 59 anos estão além do peso considerado saudável, dos quais 34,4% estão obesos.
O Idec entrevistou, com o Datafolha, 1.214 pessoas com idades entre 18 e 55 anos de todas as classes econômicas e regiões do país em junho, retratando os hábitos alimentares bem no auge da pandemia.
No recorte de renda, o aumento mais expressivo foi na classe C, cujo consumo, considerando todas as faixas etárias, passou de 21,1% em 2019 para 27,7% em 2020. Entre as classes A e B, o índice foi de 19,7% para 21,6% e, nas classes D e E, se manteve estável em 21%.
Não são ‘comida de verdade’
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), os alimentos ultraprocessados são “formulações industriais elaboradas principal ou totalmente a partir de substâncias derivadas de componentes dos alimentos, além de aditivos usados para imitar e intensificar as qualidades sensoriais dos produtos”.
Os ultraprocessados não são, portanto, “comida de verdade”, como pontua a professora do Instituto de Nutrição da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP (Nupens), Daniela Canella.
A pesquisadora salienta que eles são compostos, basicamente, por substâncias como gordura, açúcar, amido, farinha e sal. Por isso, são extremamente palatáveis e deixam as pessoas acostumadas com sabores muito doces ou salgados.
A especialista aconselha olhar bem os ingredientes nos rótulos. Quanto maior o número deles e mais incomuns, maior a chance de se tratar de um ultraprocessado. Vale, também, verificar a ordem apresentada, pois os primeiros, enfatiza a acadêmica, são os que estão em maior quantidade no produto. Também deve-se desconfiar das embalagens que prometem adição de vitaminas, por exemplo.
Mesmo alimentos que parecem saudáveis, como barrinhas de cereal ou alguns iogurtes, podem ser ultraprocessados. Procurada pela reportagem, a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) não se manifestou.
Salgadinhos e biscotos salgados
Na pesquisa do Idec, salgadinhos de pacote ou biscoitos salgados foram os produtos campeões de consumo entre os ultraprocessados, subindo de 30% para 35% no período. O segundo lugar no ranking ficou para a categoria que inclui margarina, maionese, ketchup e outros molhos industrializados, cujo consumo subiu de 50% em 2019 para 54% dos entrevistados em 2020.
Durante a pandemia, os homens comeram mais salgadinhos de pacote ou biscoitos salgados, um aumento de 6%. Já as mulheres aumentaram o consumo de margarina e molhos industrializados (crescimento de 7%), de embutidos, como presunto, mortadela e linguiça (6%), e de pratos prontos e congelados, como macarrão instantâneo, sopa de pacote ou lasanha congelada (5%).
Para a nutricionista Ana Paula Bortoletto, do Idec, o aumento do consumo de ultraprocessados durante a pandemia foi provocado, principalmente, por quatro fatores: o momento sensível na vida das pessoas, que as deixou mais suscetível ao apelo de se consumir alimentos menos saudáveis; uma maior exposição à publicidade dos ultraprocessados graças ao aumento de tempo de tela em casa; a preocupação em estocar alimentos para evitar idas frequentes ao mercado devido ao temor da infecção pelo vírus; e o fato de ser uma alimentação “mais fácil”.