Sexta-feira, 12 de dezembro de 2025
Por Redação O Sul | 12 de dezembro de 2025
Pessoas estão compartilhando nas redes sociais um vídeo que afirma que uma enzima produzida pelo próprio corpo humano seria responsável por “comer” a cartilagem e causar dor nas articulações. Um “ritual natural de 15 segundos” seria capaz de acabar com essas dores e regenerar a cartilagem desgastada. O ritual envolve tomar diariamente, por ao menos três meses, uma fórmula contendo colágeno tipo II, magnésio e vitaminas D e K2. O produto é vendido pelo autor do vídeo.
Segundo o Estadão Verifica (serviço de checagem de informação do jornal O Estado de S. Paulo), o conteúdo é enganoso. O desgaste nas cartilagens é uma condição causada por múltiplos fatores, incluindo questões genéticas, sobrecarga mecânica, cirurgias prévias e até questões de gênero. A ação desordenada de alguns grupos de enzimas pode contribuir para esse desgaste, mas não existe uma “enzima comedora de cartilagem”.
O autor do vídeo promete reduzir e até acabar com dores nas articulações a partir do uso de um suplemento. Mas especialistas ouvidos pelo Verifica apontam que o uso de colágeno tipo II não é capaz de regenerar a cartilagem perdida, apesar de trazer benefícios.
Vale lembrar que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proíbe a circulação de anúncios com indicação terapêutica para suplementos.
Procurada, a empresa que fabrica o produto disse que ele “auxilia na saúde das articulações e ossos, mas não há evidências científicas que comprovem a regeneração da cartilagem perdida”. A fabricante disse ter registro na Anvisa, mas reconheceu que o suplemento não está registrado na agência.
O autor do vídeo não enviou um posicionamento próprio.
Saiba mais: O vídeo compartilhado no Facebook mostra o médico Dayan Siebra, que tem registro no Conselho Federal de Medicina como angiologista e cirurgião cardiovascular.
A postagem leva a um site que imita a identidade visual do YouTube. Nessa página, há mais um vídeo gravado pelo mesmo médico. Logo abaixo, são listados links para venda do suplemento alimentar. O produto é fabricado por uma empresa da qual o médico é sócio. Ele promete que o suplemento tem ação anti-inflamatória e analgésica e seria o único capaz de inibir a ação da “enzima comedora de cartilagem”.
Existe uma enzima “comedora de cartilagem” que provoca dor nas articulações? Não.
O autor do vídeo afirma que existe uma enzima descoberta em 2005 por pesquisadores da Universidade de Cambridge que atua na renovação da cartilagem. Segundo ele, a partir dos 40 anos, há uma produção desordenada dessa enzima, que faz com que ela destrua a cartilagem “nova”, e não apenas a “velha”.
Mas, na realidade, não há uma “enzima misteriosa” que coma a cartilagem das pessoas e cause dor. Isso de acordo com a médica ortopedista Camila Cohen Kaleka, presidente da Comissão de Ortobiológicos da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot).
“O que sabemos, há décadas, é que a degradação da cartilagem é um processo complexo, mediado por várias famílias de citocinas (um tipo de proteína) e por uma cascata inflamatória que desregula o equilíbrio entre formação e destruição da cartilagem saudável”, disse.
De fato, há alguns grupos de enzimas que atuam nesse processo. Em 2005, pesquisadores da Universidade de Melbourne, na Austrália, mostraram que uma enzima era a principal causadora da degradação da cartilagem em camundongos. Porém, os cientistas concluíram que eram necessários estudos adicionais para saber se isso se aplicava a humanos.
O ortopedista Phelippe Valente Maia, coordenador assistencial do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), afirma que existem enzimas que contribuem para o desgaste da cartilagem, mas não podem ser consideradas o único fator.
“Essas enzimas, inicialmente, ajudam no equilíbrio da cartilagem, mas em algum momento ocorre um excesso e elas agem de forma reversa”, disse. “Isso acontece, mas não é o único fator da osteoartite e osteoartrose, e você não consegue evitar essa condição inibindo apenas um fator”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.