Quarta-feira, 14 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 6 de agosto de 2017
Se depender do Comando do Exército e da CGU (Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União), o cidadão que deseja conhecer o passado no serviço público do comandante, o general Eduardo Villas Bôas, ou do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) nas Forças Armadas vai receber apenas informações editadas e positivas. As respostas ao cidadão não deverão trazer nenhuma referência que, no entender do Exército, possam atingir a “honra e imagem” do militar.
Essa interpretação foi adotada pelo Comando da Força e referendada, em 2015, pela CGU. Na prática, o entendimento esvazia o artigo 31 da Lei de Acesso, que prevê que a restrição de acesso à informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa “não poderá ser invocada” pelo Estado brasileiro em “ações voltadas para a recuperação de fatos históricos de maior relevância”.
Bolsonaro é pré-candidato à Presidência da República e Villas Bôas comanda o Exército, que só em 2016 registrou um orçamento de 37,8 bilhões de reais, incluindo os gastos com pessoal. Ambos ingressaram na Força durante a ditadura militar (1964-1985).
Saber em detalhes o que de fato ocorreu a essas duas personalidades durante passagens pelo Exército tornou-se virtualmente impossível. Em resposta a um pedido do jornal Folha de S.Paulo, por exemplo, o Exército encaminhou duas páginas de computador sobre a vida militar de Bolsonaro. Intitulado “extrato do histórico funcional”, sem timbre, data ou assinatura, esse papel contém apenas os seguintes tópicos: identificação, cursos militares realizados, cargos ou funções exercidos, promoções, referências elogiosas recebidas e participações em empresas públicas ou privadas.
O “extrato” não explica que Bolsonaro chegou a ser preso em 1986, por 15 dias, por ato de indisciplina, nem que foi julgado por um Conselho de Justificação e depois absolvido pelo STM (Supremo Tribunal Militar). A confirmação documental da prisão só é possível porque o jornal teve acesso à “Folha de Alterações” de Bolsonaro integral, sem edição, mas em outro arquivo, o do STM. A última data desse documento, porém, é de 1988.
Censura
O professor de história da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Carlos Fico, especialista em ditadura militar, disse que seria razoável “tratar com certo cuidado” a divulgação de dados sobre militares comuns, mas não sobre figuras públicas. “Ocultar parte da história, com expurgo de fatos negativos, é um procedimento completamente condenável. É um desserviço”, criticou.
As edições do Exército autorizadas pela CGU incidem sobre as chamadas “Folhas de Alterações”. Todo militar tem uma. É o histórico dos elogios, punições, transferências e avaliações dos superiores. “Folhas de Alterações” sobre militares suspeitos de tortura, por exemplo, foram obtidas a partir de 2012 pela CNV (Comissão Nacional da Verdade).