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Por Redação O Sul | 21 de agosto de 2020
Inquéritos e mandados de busca e apreensão que se baseiam em simples declarações de delator, em fatos relativos a outros inquéritos ou em fatos baseados em elementos genéricos constituem constrangimento ilegal.
Com esse fundamento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu Habeas Corpus de ofício para suspender os efeitos de busca e apreensão contra o banqueiro André Esteves, que foram baseados na delação do ex-ministro da Casa Civil Antônio Palocci. A decisão também suspende os aprofundamentos decorrentes das buscas em dois inquéritos policiais.
A reclamação foi apresentada ao ministro pelos advogados Sepúlveda Pertence e Antonio Carlos de Almeida Castro — Kakay —, responsáveis pela defesa de André Esteves. As buscas agora anuladas tinham sido autorizadas pela 13ª Vara Federal de Curitiba.
Na decisão, o ministro Gilmar Mendes levou em consideração o fato, noticiado em primeira mão pela ConJur, de que o próprio delegado da Polícia Federal (PF) admitiu que a delação de Palocci não tinha lastro algum.
Segundo o relatório final da PF, os fatos narrados por Palocci foram desmentidos por todas as testemunhas e declarantes, inclusive por outros colaboradores da Justiça, que, segundo a própria PF, não teriam prejuízo algum em confirmar a narrativa de Palocci, caso a entendessem como verdadeira.
Gilmar destacou, ainda, que “todos os atos de colaboração têm valor probatório limitado”, ressaltando que essa é a orientação recentemente adotada pela lei “anticrime” (Lei 13.964/19), “ao proibir a decretação de medidas cautelares reais ou pessoais, o recebimento de denúncia ou queixa-crime ou a prolação de sentença condenatória com base apenas na colaboração premiada”. A previsão consta da nova redação do parágrafo 16, artigo 4º, da Lei 12.850/13, que regula a colaboração premiada.
“No caso em análise, concluo que assiste razão à defesa quando alega que houve a deflagração de medidas de busca e apreensão e a manutenção de investigações por prazo desarrazoado com base apenas nas declarações do colaborador Antônio Palocci, sem a existência de elementos externos de corroboração apresentados pelo delator”, disse o ministro na decisão.
Relatório da PF
Na semana passada, relatório da PF concluiu não existirem provas que amparem um dos trechos da delação de Palocci.
Segundo o relatório da PF, Palocci afirmou que, em fevereiro de 2011, André Esteves movimentou valores recebidos pelo ex-presidente Lula, por corrupção e caixa dois, no banco BTG, em nome de terceiros; e que o banco obteve informações privilegiadas do governo federal sobre a taxa de juros Selic, e que essas informações foram usadas para conseguir grandes lucros.
Em troca, segundo Palocci, André Esteves teria repassado uma porcentagem dos lucros para as contas bancárias em nome de terceiros que Lula mantinha no banco, além de efetuar milhões de reais em doações eleitorais para a campanha do PT em 2014.
O delegado que conduziu o inquérito, Marcelo Feres Daher, concluiu que a apuração não identificou de onde poderia ter partido eventual “vazamento” da decisão do Banco Central sobre a Selic em agosto de 2011, já que não se observou relacionamento entre as pessoas que detinham a informação e o gestor do fundo.
Ainda de acordo com o delegado, os fatos delatados por Antonio Palocci foram desmentidos por todas as testemunhas.