Terça-feira, 06 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 26 de junho de 2017
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso refutou que o País viva hoje um quadro de “Estado policial”, como declarou o colega ministro Gilmar Mendes, e defendeu as investigações que atingem o presidente Michel Temer (PMDB), na esteira do acordo de delação fechado pela Procuradoria-Geral da República com o empresário Joesley Batista, um dos donos do frigorífico JBS.
“Um procurador-geral da República [Rodrigo Janot] que é procurado por alguém que traz a ele informações e provas de delitos cometidos pelas mais altas autoridades da República, possivelmente nos três poderes, e decide investigar e apura que as informações eram verdadeiras, que as malas de dinheiro de fato circulavam e, portanto, instaura inquérito. Alguém acha que isso é abuso do Ministério Público ou que ele está cumprindo seu dever?”, questionou Barroso nesta segunda-feira (26), em palestra no Insper.
Para o magistrado, as reações contra as investigações e condenações de políticos e empresários acontecem porque o País não estava acostumado a responsabilizar o que chamou de “ricos delinquentes”.
“Estado que pune empresário que ganha licitação porque pagou propina não é Estado policial, é Estado de Justiça […] O que não estávamos acostumados era com um direito penal igualitário, capaz de punir pobres e ricos. O direito penal ficou mais duro”, afirmou Barroso.
O julgamento na Corte para decidir sobre delações da JBS e a relatoria do ministro Edson Fachi no caso, que começou na semana passada, foi marcado por troca de farpas entre Gilmar e Barroso. Com posições antagônicas, os dois ministros têm protagonizado debates que podem influenciar os rumos da Operação Lava-Jato.
O ministro disse, ainda, que a corrupção atingiu no Brasil “padrões espantosos” de institucionalização. Ao refutar críticas sobre abuso de poder do Judiciário, Barroso comentou que a impunidade é a primeira causa visível do quadro de corrupção institucionalizada e que um direito penal ineficaz – até pouco tempo atrás incapaz de punir crimes de colarinho branco – criou um País de “ricos delinquentes”.
“Não há um Estado policial, um Estado de abuso. Há um Estado que está começando a se democratizar”, afirmou o magistrado, acrescentando que reações contra as investigações e condenações de políticos e empresários se devem à mudança na qual o direito penal passou a ser aplicado de forma igualitária tanto a ricos quanto a pobres.
“Vivemos um momento em que há pessoas que não querem ser responsabilizadas pelo que fizeram, o que sou capaz de entender, e há as que não querem ficar honestas nem daqui para frente”, disse Barroso, ao lamentar que crimes tenham sido cometidos mesmo após três anos de operação Lava Jato.
Segundo o ministro, a corrupção se tornou uma forma de fazer negócio para muita gente e isso só foi possível porque houve um “pacto imenso” de cumplicidade entre os envolvidos em atos ilícitos. “Onde tem um centavo de dinheiro público tem alguma coisa errada. É impossível não sentir vergonha pelo o que está acontecendo no Brasil”, disse o ministro do Supremo.
Numa crítica à possibilidade de revisão da decisão do Supremo que autorizou a prisão de condenados em segunda instância, Barroso afirmou que um País onde a jurisprudência muda de acordo com o réu não é Estado de Direito, mas sim um “Estado de compadrio”.
O ministro do Supremo disse não acreditar que o direito penal vai mudar o mundo, mas frisou que, da mesma forma que não se deseja um Estado policial, ninguém quer viver num País onde processos não terminam nunca e ninguém é punido.
Barroso considerou que a legislação eleitoral atual produziu um descolamento entre a classe política e a sociedade civil. O ministro também defendeu o voto distrital e considerou que o sistema de coligações partidárias levou o sistema político a um quadro caótico.
O magistrado assinalou que não há “salvação” para o País sem mudança no sistema político atual, classificado por ele como uma “usina de corrupção”. “Se não mudarmos, vamos viver um escândalo atrás do outro”, disse Barroso, ao defender a reforma política, ao lado do combate à corrupção.
Em sua crítica, lembrou que apenas 10% dos deputados foram eleitos com votação própria e a grande maioria, os 90% restantes, assumiu o cargo por transferência do voto partidário, o que leva a uma situação na qual o eleitor não sabe quem elegeu e o parlamentar não sabe por que foi eleito. Como consequência, disse Barroso, o eleitor não sabe a quem cobrar, ao passo que o parlamentar não tem a quem prestar conta. (Eduardo Laguna/AE)