Sábado, 03 de maio de 2025

Porto Alegre
Porto Alegre, BR
19°
Fair

CADASTRE-SE E RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Receba gratuitamente as principais notícias do dia no seu E-mail ou WhatsApp.
cadastre-se aqui

RECEBA NOSSA NEWSLETTER
GRATUITAMENTE

cadastre-se aqui

Mundo O missionário que virou ateu após viver com índios brasileiros

Compartilhe esta notícia:

Daniel Everett com índios pirahã (Foto: Arquivo pessoal/ Daneverettbooks.com)

O linguista e acadêmico americano Daniel Everett teve sua vida completamente transformada por conviver, ainda nos anos 1970, com os índios brasileiros da tribo pirahã, na Amazônia. Everett, na época missionário cristão, uniu-se à tribo com a missão de traduzir a Bíblia ao idioma pirahã. Não saiu conforme o planejado: o americano não só ficou surpreso com a estrutura inusual do idioma dos pirahã, como pela vida cotidiana da tribo. O então missionário acabou se tornando ateu.

“A língua deles não tem passado nem presente — ‘eu vou’ pode ser ‘eu fui’ ou ‘eu irei’. Você precisa entender o contexto”, explica Everett em entrevista por telefone à BBC News Brasil, em português fluente pelas três décadas passadas estudando as línguas do Brasil.

“Aprendi sobre uma autoconfiança que eles têm de poder lidar com seu meio ambiente, e a felicidade que essa confiança traz para eles. Eles sabem que existe um passado, mas não falam sobre ele porque o passado já era, ‘o importante é cuidar dos nossos filhos, cuidar do meu ambiente agora e não se preocupar com o futuro’. (…) Eles não têm culto ou religião, não têm crença em um Deus superpoderoso que criou o mundo. Simplesmente são, na realidade, cientistas, empíricos — têm conhecimento pelas experiências na mata, e não especulações sobre o que não dá para ver”, afirma.

“É a vida sem crenças religiosas e a satisfação que isso traz para seres humanos. Por causa deles hoje sou ateu. Não estou defendendo o ateísmo, estou simplesmente dizendo que isso representa uma alternativa de vida.”

O estudo dessa estrutura linguística curiosa dos pirahã evoluiu para uma proposição que hoje desafia a mais estabelecida teoria da Linguística e que Everett volta a detalhar em um livro recém-lançado em português, Linguagem: A História da Maior Invenção da Humanidade (editora Contexto). “Sem essa invenção não haveria nenhuma outra”, argumenta. “A linguagem foi essencial para todas as civilizações, para todas as outras tecnologias, para tudo o que temos.”

Choque de teorias

Everett defende em seu livro que línguas como a pirahã “não parecem possuir qualquer gramática hierárquica” ou estruturada como os demais idiomas, nem parecem ter a chamada recursão, processo linguístico que consiste em inserir uma frase dentro da outra (o recurso de unir, por exemplo, as frases “homem caminha pela rua” e “homem veste chapéu” em “o homem que veste chapéu está caminhando pela rua”).

Essa proposição, porém, desafia a teoria predominante da linguística, encampada pelo influente intelectual Noam Chomsky, que defende a ideia de uma “gramática universal”: de que alguns aspectos estruturais, como a recursão, são comuns a todos os idiomas e de que humanos possuem uma capacidade inata e genética relacionada à aquisição da linguagem. Nesse caso, a linguagem não seria, portanto, uma invenção humana, mas inata aos humanos.

Em resposta à teoria de Everett, Chomsky já chegou a chamá-lo de “charlatão” e argumentou que as peculiaridades do idioma pirahã não colocariam em xeque a “gramática universal”, uma vez que os falantes da língua teriam, segundo ele, os mesmos componentes genéticos que o restante da humanidade.

Everett diz não descartar o valor da genética na linguagem, mas defende que é preciso considerar o papel da cultura humana no desenvolvimento dos símbolos, que por sua vez levam às línguas.

“Nosso cérebro maior se deve à genética, então não estou dizendo que a genética seja irrelevante — mas não necessariamente uma linguagem especificamente designada à linguagem. A inteligência junto com a cultura, a meu ver, é capaz de explicar a origem da linguagem”, afirma à BBC News Brasil.

“Durante muitos anos achei (a teoria de Chomsky) não somente plausível como a aceitei, mas acho que (…) a explicação é mais simples. Sabemos que todos os seres humanos têm cultura, todo o mundo tem símbolos, e simplesmente não vejo necessidade de postular algo a mais (como a ‘gramática universal’). Acho que a diferença entre o ser humano e os outros animais não é tão grande quanto pensávamos.”

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Mundo

Acidente com ônibus de torcedores do Grêmio deixou um morto e quatro feridos em estado grave
Os aliados do governador do Rio de Janeiro tentam evitar que o racha com a família Bolsonaro dê início a retaliações políticas e econômicas
https://www.osul.com.br/o-missionario-que-virou-ateu-apos-viver-com-indios-brasileiros/ O missionário que virou ateu após viver com índios brasileiros 2019-11-03
Deixe seu comentário
Pode te interessar