Quarta-feira, 10 de dezembro de 2025
Por Redação O Sul | 10 de dezembro de 2025
Segundo a polícia, o esquema criminoso iniciou em 2015
Foto: Polícia Civil/DivulgaçãoO Dercap (Departamento Estadual de Repressão aos Crimes Contra a Administração Pública) da Polícia Civil deflagrou, na manhã desta quarta-feira (10), a Operação SOS para desarticular um esquema de propina envolvendo servidores públicos do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência).
Segundo a investigação, eles estruturaram, ao longo de vários anos, “um esquema de favorecimento ilícito, direcionamento de contratos e recebimento de propinas envolvendo empresas que tinham participação mascarada de servidores”.
Mandados de busca contra quatro investigados foram cumpridos em Porto Alegre e Gravataí. Não houve prisões.
De acordo com o delegado Cassiano Cabral, diretor do Dercap, o esquema abrangia fraudes a licitações; direcionamento de consertos de ambulâncias a uma oficina mecânica, que “devolvia os favores” com o pagamento de propina aos servidores; possível superfaturamento de serviços mecânicos; pagamento sistemático de vantagens a servidores; possível lavagem de dinheiro e uso de empresas de fachada para continuidade dos contratos públicos.
A investigação iniciou após denúncias do Ministério Público sobre suspeitas de irregularidades na contratação de motoristas do Samu, na locação de veículos para o Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgotos) e no envio de viaturas para manutenção mecânica. As apurações revelaram que determinados servidores teriam participado, de forma direta ou indireta, da administração de empresas contratadas pelo próprio órgão ao qual eram vinculados, mascarando sua condição de beneficiários das contratações públicas.
O esquema iniciou em 2015, com as primeiras contratações e pregões vencidos por empresas vinculadas aos investigados, intensificando-se a partir de 2018 com novos contratos e prorrogações que se estenderam até 2024, período em que se verificou a manutenção contínua das práticas ilícitas agora esclarecidas pela análise financeira.
Conforme o delegado Guilherme Calderipe, no núcleo do esquema foram identificadas duas empresas que, ao longo de vários anos, celebraram contratos com a administração municipal para a prestação de serviços de motoristas de ambulâncias e locação de viaturas. Embora registradas formalmente em nome de terceiros, as apurações indicam que havia participação oculta de servidores municipais nas suas gestões e operações. Esse arranjo permitia o favorecimento das empresas em processos licitatórios e a manutenção de seus contratos mesmo diante de indícios de irregularidades.
Paralelamente, a investigação identificou o papel diferenciado de uma oficina mecânica, que passou a receber o direcionamento sistemático dos consertos de ambulâncias e viaturas do Samu. Essa empresa realizava cerca de 40% dos consertos e manutenção das viaturas do Samu, sendo que diversas empresas estavam conveniadas e aptas para os serviços.
“Foi realizada uma minuciosa investigação financeira, identificando elementos técnicos que corroboram a prática de pagamentos ilícitos e propina. Foi comprovada coincidência temporal entre os pagamentos realizados pelo município à oficina e saques em espécie efetuados por servidores, muitas vezes no dia seguinte ou dentro de intervalo inferior a 48 horas, somando mais de R$ 200 mil”, explicou Calderipe.
Em diversos eventos analisados, a empresa recebeu recursos públicos oriundos de ordens de pagamento por consertos da frota e, em sequência imediata, registrou-se a saída de valores praticamente equivalentes das contas pessoais dos servidores investigados. Esse padrão é característico de mecanismos utilizados para mascarar pagamento de propina e redistribuição ilícita de vantagens indevidas. Os dados financeiros revelam ainda depósitos não identificados, operações fracionadas e movimentações claramente incompatíveis com a renda declarada dos envolvidos, elementos frequentemente observados em condutas voltadas à ocultação da origem dos recursos.
Além da atuação da oficina mecânica, o trabalho investigativo identificou que as outras duas empresas vinculadas ao esquema mantinham contratos relevantes junto à administração pública, especialmente na prestação de serviços essenciais. Registros societários, informações fiscais, dados de contratação pública e a própria rotina operacional dos órgãos contratantes evidenciaram que pessoas próximas aos servidores tinham participação direta na execução contratual, criando cenário favorável ao direcionamento de licitações, à eliminação da concorrência e à manutenção artificial das vantagens concedidas.