Segunda-feira, 23 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 6 de fevereiro de 2021
O primeiro condenado à morte no que hoje são os Estados Unidos foi executado na Virgínia. Em 1608, os colonos de Jamestown, primeiro assentamento inglês de caráter permanente na América do Norte, executaram por fuzilamento o capitão George Kendall, acusado de espionar para a Espanha.
Nos mais de quatro séculos desde então, calcula-se que 1.390 pessoas tenham sido executadas na Virgínia, mais do que em qualquer outro Estado americano, segundo dados do Death Penalty Information Center (Centro de Informações sobre a Pena de Morte, ou DPIC, na sigla em inglês).
Na chamada “era moderna” da pena de morte nos EUA, a partir de 1976, quando a prática foi restabelecida depois de ter sido proibida em 1972, o Estado executou 113 pessoas, ficando atrás apenas do Texas.
Mas agora, depois de 413 anos, a Virgínia deverá se tornar o 23º Estado do país — e o primeiro do Sul — a abolir a prática, em uma decisão considerada histórica e com potencial de influenciar outros governos da região a seguirem o mesmo caminho.
Na sexta-feira (5), a Câmara estadual aprovou por 57 votos contra 41 um projeto de lei para acabar com a pena de morte. Proposta semelhante já havia sido aprovada dois dias antes pelo Senado estadual. O governador Ralph Northam, do Partido Democrata, já anunciou que pretende sancionar a lei, o que deve ocorrer até abril.
“(A decisão) da Virgínia, o Estado com o maior número de execuções na história americana, de abolir a pena de morte envia uma mensagem clara sobre as tendências de opinião pública e apoio governamental à pena capital neste momento”, diz à BBC News Brasil a diretora sênior de pesquisas e projetos especiais do DPIC, Ngozi Ndulue.
“É muito significativo que o Estado mais prolífico em execuções tenha decidido que a pena de morte é desnecessária e que punições alternativas são preferíveis”, afirma.
A decisão marca uma mudança de postura na Virgínia, onde o Partido Democrata, que controla o governo do Estado, assumiu também o comando da Câmara e do Senado estadual no ano passado.
Até poucos anos atrás, o legislativo do Estado, então sob comando do Partido Republicano, vinha se esforçando para garantir a continuação das execuções, ameaçadas pela escassez das drogas necessárias para a injeção letal.
Entre as medidas propostas na época estavam buscar fornecedores farmacêuticos alternativos, cuja identidade seria mantida em segredo, e até adotar a cadeira elétrica como método principal de execução.
Desde que conquistaram a maioria, os democratas vêm aprovando no Estado uma série de medidas consideradas progressistas em temas como aborto e posse de armas.
Na votação no Senado estadual nesta semana, 17 dos 18 republicanos votaram contra a abolição da pena de morte, e um se absteve. Mas a proposta passou com o voto de todos os 21 democratas. Na Câmara, o projeto teve apoio de dois republicanos.
Mas a decisão também reflete uma mudança no sentimento público, tanto no Estado quanto no país, onde pesquisas de opinião indicam que o apoio à pena de morte vem caindo. Ngozi salienta que a questão gera interesse bipartidário e diz que há muitos republicanos ao redor do país que apoiam a abolição da prática.
Em 2019, uma pesquisa Gallup revelou que 60% dos americanos preferem a prisão perpétua em vez da pena capital como forma de punição para assassinatos. Foi a primeira vez desde que essa pergunta começou a ser feita nas pesquisas, em 1985, que a maioria dos entrevistados disse preferir punição alternativa à morte.
São vários os motivos para a queda no apoio à pena de morte. Alguns apontam para os custos altíssimos para manter prisioneiros no corredor da morte, muitas vezes durante várias décadas entre a condenação e a execução, em processos judiciais caros e demorados.
Há também a preocupação de que inocentes sejam injustamente executados. Desde 1973, mais de 170 condenados à morte acabaram inocentados antes de a sentença ser levada adiante, revelando problemas no processo. Suspeita-se que muitos outros possam ter sido executados antes que sua inocência tenha sido provada.
Além disso, há evidências de que a pena de morte nos Estados Unidos é aplicada desproporcionalmente contra réus de minorias raciais.
Segundo o DPIC, desde 1976 foram executados 296 negros acusados de matar vítimas brancas. No mesmo período, apenas 21 brancos foram executados pela morte de vítimas negras. As informações são da BBC News.