Domingo, 26 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 7 de agosto de 2017
Um relatório enviado pela PF (Polícia Federal) ao juiz Sérgio Moro revela que a queda-de-braço entre a corporação e a PGR (Procuradoria-Geral da República) em torno do alcance e da importância das delações premiadas já se arrasta há meses. O documento, produzido em abril, também chegou à Operação Lava-Jato em Curitiba (PR), base de operações da força-tarefa. No texto, é detalhado um inquérito policial que tramitou por quase dois anos, além de apontar três delatores que ganharam benefícios mas “em nada auxiliaram os trabalhos investigativos”.
A PF se referiu especificamente ao ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa, ao doleiro Alberto Youssef e ao operador de propinas Fernando Baiano – todos eles com acordos de colaboração premiada que foram contemplados com inúmeras vantagens. O inquérito foi aberto em 8 de julho de 2015 e mirava no ex-ministro Antonio Palocci, que comandou as pastas da Fazenda e da Casa Civil nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
O petista foi preso em setembro do ano passado na Operação Omertà, desdobramento da Lava-Jato. Ele responde, ainda, a um processo relacionado a propinas da empreiteira Odebrecht, ao lado do ex-presidente Lula.
Já o inquérito aberto em 2015, afirma a PF, em nada se relaciona à empreiteira. Neste caso, Paulo Roberto Costa relatou que teria recebido pedido de Youssef para liberação de 2 milhões de reais da cota do PP no esquema de corrupção instalado na Petrobras. Conforme o ex-diretor da estatal, a solicitação teria sido feita ao doleiro pelo ex-ministro ou por “pessoa vinculada a este”. No relatório, a PF narrou que Youssef “refutou integralmente a narrativa” do ex-diretor da Petrobrás.
“Dois criminosos colaboradores, que auferiram benefícios em decorrência dos acordos firmados com a Procuradoria-Geral da República, apresentaram versões conflitantes de suposto fato ilícito. Nada obstante, continuou-se a investigar”, observou a PF. “Foi então procedida a acareação entre os criminosos colaboradores Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa, sendo que ambos mantiveram suas versões conflitantes. Ainda assim, continuou-se a investigar.”
De acordo com a PF, Fernando Baiano “ao firmar acordo de colaboração com a PGR, a partir do qual diversos benefícios lhe foram concedidos”, declarou que presenciou Palocci solicitar de Paulo Roberto Costa valores ilícitos destinados à campanha presidencial do PT de 2010. “Muito embora já existisse evidente conflitos de versões entre Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, admitiu-se, nesta investigação, novo conflito de versões entre Paulo Roberto Costa e Fernando Antonio Falcão Soares.”
O relatório indicou que “diversas acareações” foram feitas e “ainda assim mantiveram-se as diversas contradições entre os depoimentos dos criminosos colaboradores”. A PF relatou a Moro e aos procuradores que realizou também diligências junto a hotéis e companhias aéreas. “Não se vislumbra, depois de diversas diligências e colheita de declarações, medidas investigativas úteis a comprovar a hipótese investigativa que originou este inquérito. As mesmas diligências tampouco comprovaram as demais hipóteses investigativas”, destacou a PF. O delegado Filipe Pace, que assina o documento, encerrou diligências de investigação no inquérito.
“É temerário que inquérito policial tenha tramitado por quase dois anos em função de três versões de fatos diferentes apresentadas por três criminosos que celebraram acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República e que a partir disso obtiveram inegáveis benefícios. Em outras palavras, os colaboradores em nada auxiliaram os trabalhos investigativos, muito embora tenham sido beneficiados, Pelo contrário, auxiliaram apenas na manutenção de investigação com pouquíssima perspectiva de resolução”, alertou a PF.
Pace afirmou, no entanto, que se o MPF entender “oportuna e conveniente” a adoção de medidas investigativas inéditas e que propiciem resultado prático para a investigação, a Polícia Federal, em respeito aos ditames legais, procederá ao seu atendimento. “Além disso, caso surjam notícias de novas provas de corroboração dos fatos – isto é, de alguma das três versões de fatos que foram apresentadas aqui -, é possível que a investigação seja retomada, conforme autoriza o artigo 18 do Código de Processo Penal”, anotou o delegado.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, rebateu a informação. “Toda a discordância da Polícia Federal conosco gira em torno de um negócio que se chama ‘colaboração premiada’. Existe uma disputa de poder em cima da colaboração. Aquilo que a PF faz, e bem, é investigação. Eu ajuizei no Supremo uma ADI [Ação Direta de Inconstitucionalidade] segundo a qual polícia não pode fazer colaboração premiada”, frisou o titular da PGR.