Domingo, 04 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 12 de fevereiro de 2023
Para Mary Robinson, os sete próximos anos são os mais importantes de toda a História da Humanidade. O mundo precisa cortar suas emissões de gases-estufa em 45% até 2030, lembra a presidente dos The Elders, grupo fundado por Nelson Mandela que reúne ex-governantes (entre eles o emérito Fernando Henrique Cardoso) para promover paz, justiça, direitos humanos e um planeta sustentável. Ainda é uma meta distante, ela reconhece, destacando que o panorama é difícil, mas ainda há motivo para esperança.
Ex-presidente da Irlanda (1990-1997) e ex-alta comissária da ONU para os Direitos Humanos (1997-2002), ela tornou-se uma defensora da justiça climática e amplificadora das vozes de ativistas. Em entrevista feita por vídeo ao jornal O Globo, Robinson disse que a vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi bem recebida “por todos que se importam com a democracia”, elogiou os compromissos ambientais do governo e defendeu a importância de o mundo ajudar o Brasil para salvaguardar a democracia após os atos golpistas de 8 de janeiro, classificando o ex-presidente Jair Bolsonaro e o americano Donald Trump como “aberrações muito lamentáveis” da democracia. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
– A senhora participou da cerimônia que moveu o Relógio do Juízo Final para mais perto de meia-noite. O que faz com que 2023 seja mais perigoso que outros momentos da História? “Foi minha segunda vez que fizemos parte da decisão do Boletim de Cientistas Atômicos para decidir se o relógio moveria. Com frequência ele não se move, ou às vezes caminha na direção certa. Mas no início de 2020, eu e [o ex-secretário-geral da ONU] Ban Ki-moon, que era meu vice nos Elders, fomos convidados, acho que porque sabiam que seria necessário movê-lo para mais perto de meia-noite, e foi a primeira vez que saiu da casa dos minutos. Passou de dois minutos para 100 segundos para o apocalipse. Não é só isso, mas obviamente a guerra na Ucrânia é algo que exacerba tudo. A questão nuclear, as crises de alimentos, combustíveis e fertilizantes. A crise climática e de biodiversidade. E assim em diante. É muito significativo que estejamos no pior momento, nada foi tão agudo. Mas é muito importante trazer esperança, não é possível ficar apenas no pessimismo.”
– E como ser otimista? “Se você afirma apenas que tudo está ruim, as pessoas abaixam a cabeça como se não houvesse nada mais a ser feito além de seguir com a vida e fazer o melhor que podem em suas bolhas. Quando, na realidade, precisamos que as pessoas prestem atenção de formas apropriadas, que reconheçam que ‘sim, estamos em uma situação difícil, mas há muito que podemos fazer sobre isso’.”
– E sobre a guerra na Ucrânia, quais são as lições-chave que a senhora crê que devemos aprender para evitar situações similares no futuro? “A guerra na Ucrânia é um exemplo verdadeiramente terrível para o mundo porque a Rússia é um membro permanente do Conselho de Segurança da ONU invadindo um vizinho democrático. Há razões para dizer que havia mais que pudesse ter sido feito para baixar a temperatura com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), mas apesar disso houve uma invasão e depois uma guerra devastadora e sem piedade contra os civis, contra os idosos, as crianças, os hospitais. Nós dos Elders somos muito conscientes de nossa identidade, não somos um grupo ocidental (…). Somos globais, não somos parte de forma nenhuma desta retórica de Rússia versus Otan, isso não nos interessa. O que nos interessa é que os países devem ficar estupefatos com uma nação que é uma potência nuclear invadindo um vizinho que abriu mão de suas armas atômicas. É neocolonial, porque a Ucrânia foi parte da União Soviética. Então, por todas essas razões, creio que países no mundo em desenvolvimento obviamente querem continuar a ter interesses em Moscou e Pequim, e isso é totalmente apropriado, mas há uma linha vermelha quando ocorre uma guerra agressiva e uma invasão de um país menor e civis dizimados. E, claro, há um êxodo enorme de pessoas da Ucrânia, principalmente para países europeus.”
– Muitos questionam se não é alarmista chamar o que acontece de crise climática ou emergência climática, defendendo o uso apenas de mudanças climáticas. A senhora tem opinião? “Prefiro o termo crise do clima e da biodiversidade. Mudanças climáticas é demasiadamente vago, porque o clima está sempre mudando um pouco. O que acontece é que o clima muda há milhões de anos, mas os cientistas nos mostram gráficos e de repente vemos as linhas vermelhas disparando desde 1950 devido ao impacto do carvão acumulado da Revolução Industrial. E agora estão muito, muito piores. Então é uma crise, e todos os líderes deveriam estar em modo de crise como resultado. E eu também lembro de dizer que a crise climática é a pior questão de direitos humanos do mundo, isso em 2004, 2005. Agora digo algo um pouco mais intenso. Os cientistas nos disseram que precisamos reduzir as emissões de gases-estufa em 45% até 2030, e 2030 é daqui a sete anos. Então, a meu ver, os próximos sete anos são os mais importantes de toda a Humanidade. Se não mudarmos dramaticamente, comprometemos nossos filhos, seus filhos e netos a um mundo verdadeiramente impossível. E eu não aceito isso. 2023 será um ano extremamente importante. 2024, quando o Brasil terá a Presidência do G20, será um ano extremamente importante. 2025, quando eu espero que o Brasil sedie a COP30, será extremamente importante. E daí em diante.” As informações são do jornal O Globo.