Quarta-feira, 10 de setembro de 2025
Por Rogério Pons da Silva | 3 de setembro de 2025
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Ao final da II Guerra Mundial, em 1945, teve início a obscura e silenciosa “Guerra Fria”, entre as duas grandes potências: EUA e URSS, a União Soviética.
Nos anos seguintes, o então presidente norte-americano Harry S. Truman iniciou uma ação de Estado para promover a produção cultural, com financiamento público destinado aos estúdios de cinema e às séries de TV.
Essa política tinha como principal articulador e mentor o jornalista Thomas Braden, que também era agente da CIA. Sua estratégia consistia em um objetivo bem definido: defender os valores da América. Assim, o governo dos EUA não poupou recursos para financiar produções de filmes e seriados em todos os gêneros. Os estúdios floresceram nesse período de ouro e a indústria cinematográfica norte-americana transformou-se em uma potência.
Drama, romance, policial, suspense, faroeste, ficção científica, filmes-catástrofe e até desenhos animados: todos eram produzidos em grande quantidade e variedade.
Havia apenas uma condição para a liberação do financiamento: ao final da história, o mocinho tinha que vencer o bandido, ou seja, deveria ficar claro para os telespectadores que o bem sempre triunfa sobre o mal.
As cenas do mocinho “apanhando” durante quase todo o filme eram rotina. Mas, perto do fim, ele “virava o jogo”, para o delírio do público, e vencia a disputa.
Foi com esse conceito que, durante muitos anos, o cinema e a TV norte-americanos influenciaram comportamentos em toda a América e, possivelmente, em boa parte do mundo ocidental. A mensagem era simples: o mal existe e é forte, mas no fim o bem sempre vence.
Isso marcou gerações.
O bandido representava o socialmente errado, o desonesto e o malvado. Assim foi por décadas, até o fim da União Soviética. A partir daí, o mundo foi mudando.
Hoje, o conceito de mocinho e bandido tornou-se relativo. O bandido também pode ser visto como vítima, e muitos mocinhos passaram a ser vistos como opressores.
Nesse novo cenário, especialmente no Brasil, o cidadão comum descobriu que não precisa mais recorrer a filmes, seriados ou novelas para se entreter. A realidade oferece muito mais emoções que a ficção ou a fantasia. Temos à disposição um “cardápio” completo de tragédias, dramas, suspenses, policiais e até comédias.
A política nacional transformou-se em um “novelão” de sucesso, há anos em cartaz. São vários núcleos paralelos, sob um tema central, com protagonistas em cada trama — fácil de acompanhar.
O público divide-se em dois lados, cada um torcendo para o seu mocinho, e ainda há um grupo, de tamanho incerto, que prefere que todos percam para que comece um filme novo.
Com toda essa agitação e sobressaltos diários, podemos dizer que nós, brasileiros, morremos de tudo — menos de tédio.
A cada capítulo, surge uma justiça ou uma vingança, uma fake news ou um escândalo denunciado. Tudo depende de quem é o seu mocinho.
O intrincado enredo é repleto de tramas, acordos, traições, mentiras, bravatas, ironias, choros, gargalhadas e suspense.
Quem matou Odete Roitman? É fichinha!
Vivemos um “teatro do absurdo” no dia a dia de homens e mulheres simples deste povo sofrido. Já as estrelas do “elenco”, todas bem conhecidas e populares, atuam com ótimos cachês em cenários luxuosos.
O povo tem duas participações nesse contexto: é espectador, aguardando o desfecho final, e, ao mesmo tempo, patrocinador da trágica realidade.
No sentido exato da expressão: patrocinamos a produção e ainda pagamos para assistir.
E pagamos caro.
São vidas humanas e seus destinos em jogo — ou melhor, em cena.
Rogério Pons da Silva
Jornalista e empresário
rponsdasilva@gmail.com
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.