Domingo, 21 de dezembro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de abril de 2018
Han perdeu a mãe e dois de seus seis filhos para a fome que assolou a Coreia do Norte nos anos 90. Seu marido foi preso quando buscava comida e torturado até a morte. Depois de quatro fugas para a China seguidas de deportações, ela conseguiu deixar o país em 2008 com suas duas filhas. De seu apartamento nas imediações de Washington, ela vê as cúpulas de Kim Jong-un com o sulcoreano Moon Jae-in e o americano Donald Trump como uma perda de tempo.
“Isso só dará crédito a Kim perante o povo norte-coreano, que não ganhará nada. Ele está em um beco e quer ganhar tempo para sair dele”, disse ela, que não quis ser identificada com o nome completo. A filha mais nova de Han, Grace Jo, também é cética em relação às negociações. “A Coreia do Norte nunca vai abrir mão de suas armas nucleares. Kim acredita que essa é a única coisa que protege o regime dos EUA e do mundo. É por isso que colocaram tanto dinheiro no desenvolvimento do programa, à custa da fome da população”, afirmou Grace, que é vice-presidente da entidade NK in USA, que dá apoio a refugiados norte-coreanos.
A demonização dos Estados Unidos e a apresentação do arsenal nuclear como algo vital para a sobrevivência da Coreia do Norte estão no coração da propaganda da dinastia Kim, que permeia todos os aspectos da vida dos norte-coreanos desde a escola primária. Isso coloca um outro obstáculo para uma eventual mudança na posição e na retórica do regime: convencer os próprios cidadãos e soldados de que a retórica dos últimos 70 anos não faz mais sentido.
Kim teria de doutrinar não só a população civil, mas o 1,2 milhão de integrantes do Exército Popular da Coreia, observou o general da reserva da Coreia do Sul Chun In-bum. Para ele, o ditador que assumiu o poder em dezembro de 2011 quer usar as conversas para ganhar tempo e algum fôlego em meio ao aperto das sanções econômicas, mas não tem nenhuma intenção de abrir mão de seu arsenal nuclear.
Alex integrou o governo da Coreia do Norte durante o período de Kim Jong-il, o pai do atual ditador. Membro da elite norte-coreana, ele viajou e serviu no exterior, onde começou a duvidar da propaganda oficial. “Na primeira vez em que estive em um aeroporto internacional da Coreia do Sul eu vi que o que escutava não era verdade. A propaganda nos dizia que a Coreia do Sul era muito pobre e precisava de ajuda da Coreia do Norte”, disse Alex, que não usa seu nome verdadeiro por questões de segurança.
Em 2001, ele desertou para o Sul e, mais tarde, se mudou para os Estados Unidos. “Isolados, os norte-coreanos são como esponjas secas. Quando vão para o exterior, querem absorver toda a informação que recebem.” Como Han e Grace, ele não acredita na sinceridade das declarações de Kim de que está disposto a “desnuclearizar” a Península Coreana. Tampouco vê como provável a normalização das relações com os Estados Unidos.
“No primeiro livro que recebemos na escola primária há desenhos que retratam uma Igreja Cristã, um pastor americano e um pé de maçã. Quando uma criança norte-coreana pega uma maçã caída no chão, ela é torturada pelo pastor, que grava a fogo em sua testa a palavra ladrão. Desde o começo nós somos ensinados a odiar os EUA, a Igreja e o cristianismo.”
A doutrinação continua ao longo da vida e inclui a visita obrigatória ao Museu Sinchon sobre Atrocidades na Guerra, que retrata abusos reais e imaginários cometidos pelos soldados dos EUA nos três anos de conflito. A Coreia do Norte foi alvo de incessantes bombardeios e ataques com napalm em áreas civis, que dizimaram 20% da população, segundo estimativa de militares americanos.