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Safra 2025/2026: o Brasil colhe mais, mas ainda sem segurança climática

Presidente da Conab, Edegar Pretto apresentando os dados da CONAB e o desafio da produção em tempos instáveis. (Foto: Catiana de Medeiros/Conab)

A nova projeção da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a safra de grãos 2025/2026 confirma o que o setor agropecuário já vinha sinalizando: o Brasil segue ampliando sua produção e consolidando sua posição como potência global em alimentos, fibras e bioenergia. Com estimativa de 353,8 milhões de toneladas, o país deve bater mais um recorde, mesmo diante de uma leve queda na produtividade média das lavouras. O crescimento de 1% em relação à safra anterior é puxado, sobretudo, pela expansão da área cultivada, que deve ultrapassar os 84 milhões de hectares.

Mas por trás dos números otimistas, há uma realidade que exige atenção: a dependência do clima segue sendo o maior fator de risco para o campo. A recuperação da soja no Rio Grande do Sul, por exemplo, é uma boa notícia — com projeção de 22,4 milhões de toneladas, um salto de 35% em relação à safra passada. No entanto, esse avanço está condicionado à regularidade das chuvas e à ausência de extremos climáticos, como os que castigaram o estado em 2024. A produtividade estimada de 3.624 quilos por hectare é promissora, mas ainda frágil diante da instabilidade climática que tem se tornado recorrente.

O mesmo vale para o arroz, cuja produção no RS deve cair 10,5%, reflexo direto dos preços pouco atrativos e da retração nos investimentos. Ainda que o estado mantenha bom nível de abastecimento hídrico e conte com políticas públicas como o Contrato de Opção de Venda (COV), a área cultivada deve encolher 3,1%. A produtividade, embora ainda alta, deve recuar 7,6%, sinalizando que o produtor está cauteloso — e com razão.

O milho, por sua vez, apresenta estabilidade na produção, com leve queda de 0,1%, mas uma redução significativa na produtividade, estimada em 12,5%. A boa notícia é a recuperação da área plantada, que deve crescer 14,2%, impulsionada pelo controle da cigarrinha e pela expansão da rotação com soja no Noroeste gaúcho. Ainda assim, o desempenho do milho dependerá, mais uma vez, do comportamento do clima na janela de plantio.

Esses dados revelam um paradoxo: o Brasil tem tecnologia, crédito e expertise para produzir mais, mas ainda não tem segurança climática para garantir estabilidade. O Plano Safra 2025/26, com juros reais negativos e volume recorde de recursos, é um avanço importante. Mas ele precisa ser acompanhado de políticas estruturantes que deem ao produtor mais previsibilidade e proteção diante dos eventos extremos.

A resiliência do agro brasileiro é admirável. Homens e mulheres do campo seguem investindo, inovando e apostando na produção mesmo diante de adversidades. Mas é preciso reconhecer que essa resiliência tem limites. Sem uma estratégia nacional de adaptação às mudanças climáticas, o setor continuará refém de fatores que estão fora do seu controle.

A Conab, ao divulgar suas projeções em parceria com o Banco do Brasil, cumpre um papel essencial ao oferecer transparência e inteligência de mercado. Mas os números, por mais positivos que sejam, não podem mascarar a urgência de uma agenda climática integrada ao planejamento agrícola. O futuro da produção não depende apenas de hectares e toneladas — depende de estabilidade, sustentabilidade e visão de longo prazo.

Se o Brasil quiser manter sua liderança no agro, precisa ir além da expansão da área cultivada. É hora de investir em infraestrutura hídrica, pesquisa em variedades resistentes, seguros agrícolas mais acessíveis e sistemas de alerta climático eficientes. A safra 2025/26 pode ser histórica, mas só será verdadeiramente transformadora se vier acompanhada de políticas que protejam quem está na linha de frente: o produtor rural.

(Gisele Flores)

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