Sexta-feira, 07 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de dezembro de 2019
Os alimentos podem ajudar no processo de luto quando há uma morte na família?
Uma boa alimentação é muito importante depois da perda de alguém próximo, mas, ao mesmo tempo, a falta de apetite é bastante comum quando alguém está passando por um momento como esse.
Perder completamente a vontade de comer é algo que a americana Lindsay Ostrom conhece bem. Com apenas cinco meses e meio de gravidez, ela teve que dar à luz seu filho Afton.
No dia seguinte, o recém-nascido morreu.
“Tudo o que eu conseguia pensar era na morte do meu filho e o que isso significava para mim. Eu não me importava com mais nada”, explicou ela, que mora no Estado de Minnesota, nos Estados Unidos.
O problema é que, para Ostrom, a comida era algo muito importante: ela tinha um blog sobre culinária chamado A Pinch of Yum (algo como uma pitada de delícia).
De fato, ela escreveu no blog que havia perdido o gosto pela comida e que só tinha espaço no estômago para sentir dor.
“A comida começou a me dar nojo. O que geralmente me gerava paixão começou a me entediar”, diz ela.
“Sempre gostei de experimentar todos os tipos de sabores, cores e texturas, mas, naquele momento, tudo que eu queria era um prato de sopa de tomate ou um pão com manteiga.”
Mesmo que ela não quisesse provar algo diferente, estava realmente agradecida pela comida e pelos pratos simples que seus amigos e familiares lhe levaram durante aqueles dias.
“Essa foi uma maneira de nos salvar. Era como ‘vamos encarar a vida, e comer esses pratos, um dia de cada vez’. Fazer isso nos trouxe algum alívio, nos colocou diante da realidade: você está vivo e você tem que continuar vivendo”, conta.
Ostrom percebeu o quão importante aqueles pratos simples, feitos com amor, poderiam ser. E, então, pediu aos amigos e familiares as receitas que experimentou naqueles dias tristes.
Ela as compartilhou usando a hashtag #feedingabrokenheart (#alimentandoumcoraçãopartido), que ficou famosa no Instagram ao acompanhar as imagens dos pratos que a ajudaram no momento de luto.
Para ajudar
Para a professora Lisa Shulman, da Universidade de Maryland, nos estágios iniciais do luto, uma resposta primária que varia entre a tristeza e a fuga muitas vezes entra em cena — e é por isso que perdemos o controle do apetite.
Shulman estudou como lidar com a dores causadas pela perda de um ente querido em razão de uma experiência pessoal: ela enfrentou muitas dificuldades após a morte de seu marido, Bill.
Por isso, ela escreveu o livro After Loss (Após a Perda, em tradução livre), que fala sobre a dor e sua relação com o cérebro. Seu principal objetivo é tentar entender os efeitos desse processo no corpo e como os alimentos podem facilitar a forma como lidamos com o luto.
“Quando perdemos alguém de maneira traumática, é como se o cérebro agisse como uma espécie de segurança. O que ele faz é bloquear memórias dolorosas e permitir apenas aquelas que são mais fáceis de processar”, explica.
“Nesse estado de tristeza, é como se houvesse um lençol entre nós e o exterior, e isso silencia nossas experiências sensoriais. É por isso que é difícil ficar com fome ou querer comer.”
Para se recuperar, precisamos abrir gradualmente essas memórias bloqueadas novamente. E a comida pode desempenhar um papel nisso.
“Com a ideia de progredir, podemos usar alimentos para nos ajudar. Me concentrei em refeições significativas e que podem nos trazer essas memórias. Mas falo por experiência própria. Dediquei-me a preparar os alimentos que meu marido gostava de comer nos restaurantes e isso me confortou de alguma forma”, diz Shulman.
Pais
Quando o pai de Amy morreu, alguns anos atrás, a comida se tornou uma maneira de estar perto dele de alguma forma.
Seu pai era um imigrante romeno no Reino Unido que, além de ser arquiteto, tinha um restaurante famoso por seu pastrami.
E ela encontrou um alimento que trazia à tona todas as suas boas lembranças com o pai: cebola crua. “Ele usava cebola para tudo”, diz Amy.
Embora não gostasse do sabor, ela começou a comê-la várias vezes por semana. “Faço isso por ele.”
Amy também começou a experimentar o scone (um bolinho de trigo ou aveia tradicional do Reino Unido), pelo qual nunca teve muito apreço, para entender por que seu pai gostava tanto dele. A refeição com scone começou a se tornar um ritual.