Quinta-feira, 01 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 11 de dezembro de 2015
Quando a atriz britânica Emma Watson fez campanha a favor da igualdade entre gêneros na ONU (Organização das Nações Unidas), ela não sabia que estava tornando a si própria um alvo. Tampouco sabia a desenvolvedora de jogos Zoe Quinn que ela seria vítima de abusos por entrar em um mundo predominantemente masculino – a campanha de ódio, chamada “Gamergate”, começou quando seu ex-namorado a acusou de ter conseguido uma boa cobertura da mídia de um de seus jogos ao oferecer favores sexuais.
O que veio depois foi um assédio misógino de outros jogadores on-line, inclusive com ameaças de estupro e morte. De forma similar, a atriz americana Jennifer Lawrence tornou-se vítima de um “crime sexual” depois que fotos em que estava nua foram vazadas e distribuídas pelo mundo digital.
Como esses, há muitos outros exemplos: em tempos de constante conectividade, a tecnologia virou uma ferramenta para “atacar mulheres e meninas”, alerta a ONU. Milhões de mulheres no mundo são alvo de violência doméstica só por serem o que são: mulheres. E a popularização de tecnologias de comunicação e redes sociais viabilizaram novas formas de violentá-las. Está na hora de o “mundo despertar” para a importância deste assunto, disse a ONU. A organização estima que 95% de todos os comportamentos agressivos e difamadores na internet tenham mulheres como alvos.
“A violência on-line subverteu a premissa original positiva da liberdade na internet e, com demasiada frequência, a tornou um espaço arrepiante que permite crueldade anônima e facilita ataques contra mulheres e meninas”, diz Phumzile Mlambo-Ngcuka, da ONU Mulher, agência da organização dedicada à igualdade de gêneros e maior poder feminino. A violência de gênero no mundo digital não é mais um “problema de primeiro mundo”, dizem especialistas em tecnologia, e vem na esteira da popularização global de smartphones e tablets e da internet. Também não é fácil combatê-lo, já que tecnologias digitais são uma faca de dois gumes, que pode ser usada tanto para perpetrar a violência de gênero quanto para fazer mulheres sentirem-se seguras e mais independentes.
Problema global.
Como uma em cada três mulheres já sofreu com isso, a OMS (Organização Mundial da Saúde) considera a violência contra a mulher “como um problema global de saúde de proporções epidêmicas”, que varia desde abusos domésticos a assédio na rua, tráfico sexual, estupro e feminicídio. A mídia social impulsionou ainda mais essa pandemia. “A internet está disponível para todos, assim como a violência. Seus perpetradores não estão mais limitados por fronteiras geográficas ou físicas”, diz a baronesa Patricia Scotland, ex-procuradora-geral do Reino Unido e fundadora da organização Aliança Corporativa Contra Violência Doméstica.
O centro de estudos Associação pela Comunicação Progressiva estabeleceu os “quatro As” que distinguem a violência de gênero relacionada à tecnologia: anonimato, acessibilidade, ação à distância (exercendo assim uma forma de violência menos aparente sem contato físico) e automação (ou seja, menos tempo e esforço são necessários para perpetrar o ataque). Esse comportamento violento on-line vai desde o assédio virtual e aviltamento público ao desejo de agressão física – e a internet pode ser a ferramenta para transformar a violência virtual em violência real.
“Intimidação, ameaças e acesso a informações da vítima não são táticas novas dentro do contexto da violência doméstica. Mas o uso da tecnologia significa que o assédio e abuso podem se tornar muito mais invasivos, intensos e traumatizantes”, diz Kaofeng Lee, da organização sem fins lucrativos NNEDV (Rede Nacional pelo Fim da Violência Doméstica, na sigla em inglês).
Um estudo da ONU pede que provedores, empresas de telefonia celular e companhias de redes sociais, videogames e todos os tipos de sites exerçam vigilância. “Empresas de tecnologia precisam reconhecer explicitamente a violência contra mulheres como um comportamento criminoso” e fornecer “apoio para vítimas/sobreviventes”, aponta o relatório.