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Por Redação O Sul | 30 de dezembro de 2017
No último dia do ano a Terra vai girar em torno de seu eixo, em sentido leste, completando a rotação em cerca de 24 horas. Do ponto de vista astronômico, um dia como outro qualquer. Da perspectiva humana, é a virada do ano, com todo o significado que ela recebe dos habitantes deste planeta.
Movidos por um cérebro apegado a ciclos naturais e programado para o presente, damos à passagem de 31 de dezembro para 1° de janeiro o poder de apagar erros e guiar acertos como perder peso, ler mais e gastar menos.
Nada racional, claro, mas muito natural. E especialistas garantem: já que você está nessa, pode ser a chance para uma mudança – ainda que resoluções de ano novo costumem ser uma vitória da esperança contra a experiência.
Tá na mente
Cristiano Nabuco, psicólogo da USP e autor de “Psicologia do cotidiano”, explica que, durante milênios, nosso cérebro foi programado para começar e encerrar tarefas. Se em 2016 você prometeu fazer execícios, mas em 2017 passou longe da academia, seus neurônios vão “enviar notificações” lembrando você disso.
Nabuco explica que, quando chega o final do ano, nossa mente busca se alinhar a essa contagem externa e fica inquieta para concluir ciclos – mesmo que isso signifique fazer novas promessas.
“O réveillon assume o papel mágico de nos dar forças para pôr tudo em prática. É um pensamento até infantil, o pote de ouro no final do arco-íris no final do calendário. Mas não recrimino, o que funcionar para você está ótimo”, diz Nabuco. “O importante é se planejar para mudar pequenas coisas, um pouco a cada dia. Somos muito ruins para lidar com crises: quanto menos desgaste emocional, mais chance de o plano dar certo.”
Em um estudo de 2010 que se tornou referência, os psicólogos Nira Liberman (Universidade de Tel Aviv) e Yaacov Trope (Universidade de Nova York) demonstraram que avaliamos de forma muito diferente metas próximas e distante.
Quando você planeja aprender uma língua nova, provavelmente está alinhando conceitos abstratos como conhecimento, cultura e evolução pessoal. Na hora de buscar o curso é que surgem questões mais concretas como horário, endereço e mensalidade.
Aplicando-se esse conceito à virada do ano: é esperado que agora, à distância, tudo pareça possível e, meses depois, mais complexo. Uma pesquisa do governo dos EUA mostrou, em 2007, que, enquanto 52% dos americanos fazem resoluções com certeza de cumpri-las, apenas 12% conseguem.
Marie Hennecke, socióloga da Universidade de Zurique, na Suíça, é coautora, com o médico americano Benjamin Converse, da pesquisa “Next week, next month, next year” (“Próxima semana, próximo mês, próximo ano”), que analisa como marcos temporais alteram expectativas.
Observando o comportamento de voluntários por um longo período, o estudo mostra, como era de se esperar, que a virada do ano não é a única culpada: segundas-feiras e o primeiro dia do mês também ocupam no imaginário o símbolo de “começar de novo”.
“Não há nenhuma razão lógica para traçar objetivos em datas que marcam inícios no calendário, mas é o que elas fazem”, diz Marie, acrescentando que, em virtude do próprio estudo, não tem nenhuma resolução para 2018.
Aproveite o embalo
OK, pode ser um dia, uma semana ou um mês como outro qualquer. Mas o fato é que, se você se deixou embalar pelo espírito otimista no ano novo, não deixe esse entusiasmo se perder. Essa é a dica de John Norcross, psicólogo que estudo o assunto desde os anos 1990 e é autor do best-seller “Changeology” (“Mudançalogia”, em tradução livre).
“Frequentemente me perguntam se não é melhor dispensar resoluções de ano novo, já que, na maioria das vezes, elas não funcionam. Para mim, o fato de uma minoria conseguir realizá-las já é muito positivo”, diz Norcross.
Vitor Friary, diretor do Centro de Mindfulness do Rio de Janeiro, oferece uma abordagem menos prática à questão:
“A necessidade de encerrar ciclos é natural como a nossa respiração. Mas, assim como a respiração, temos que aprender a controlá-la. O importante não é só querer mudar, mas estar aberto a mudanças.”